A grande escolha de João Félix, se Simeone não o trair
PONTAPÉ NA CANELA - A crónica de Carlos Machado, hoje sobre os primeiros impactos de João Félix com as cores do Atlético de Madrid
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A pré-época tem um encanto fantástico. Primeiro é o mercado, os que se perdem e os que chegam para animar. Mesmo aqueles cujas contratações geram desconfiança merecem o benefício da dúvida até a bola rolar e os jogos serem vistos na perspetiva do copo meio cheio ou meio vazio.
Frente ao Real, teve liberdade, jogou com aquele ar desprendido de rapazola genial, marcou um, ofereceu dois, deixou os espanhóis de boca aberta até às orelhas
Se o adepto for do Atlético de Madrid, vai andar nas nuvens, pelo menos até à primeira derrota em jogo oficial. Marcar sete golos ao Real Madrid é um feito tão importante, mas tão importante, que ninguém quer saber se o futebol proposto por Simeone mudou muito ou pouco. Resultado é uma palavra mágica e nada pode ser mais importante, incluindo a única ressalva aceitável: não há dérbis a brincar.
O seguidor do Real Madrid vai andar uns tempos amuado com Zidane, apesar do 7-3 não contar para nada. Mas, afinal, conta tanto que treinador e capitão de equipa sentiram necessidade de dizer que aquilo não passou de um treino e estranharam o empenho posto do outro lado. Os mais exigentes terão reparado na total incapacidade do Real Madrid para ligar três passes, na mesma falta de intensidade vista na época passada, quando Zidane foi chamado para salvar o que não tinha salvação.
Essa seria a parte preocupante se não fosse pré-época. Para um colosso foi só o tal treinito mal conseguido. A vida do emblema merengue complicar-se-á a sério se os responsáveis acreditarem na narrativa vendida aos adeptos.
Também pode dar-se o caso de esta tareia - o resultado é lisonjeiro para o Real, o Atlético podia/devia ter elevado mais - servir mais uma vez para Florentino Pérez cumprir o papel que a história lhe destinou ou ele destinou à história: fazer contratações por preços exorbitantes. Em 2009, depois de uma época amarga, agarrou Cristiano Ronaldo, Kaká, Benzema e Xabi Alonso. A horas (os três primeiros começaram a pré-época e Alonso chegou a 5 de agosto).
Outro aspeto interessante do dérbi dos States foi a postura do Atlético. Um 4x4x2 com dois médios centro, um ala esquerdo puro e João Félix, a partir da direita para aparecer por trás da dupla de pontas de lança. E apesar de os jogadores do Atleti passarem pelos adversários como se fossem meninos do coro da escola básica, o futebol da rapaziada de Simeone teve momentos de sonho e até fica a ideia de que João Félix fez a escolha perfeita.
E tê-lo-á sido se o treinador não o trair. Frente ao Real, teve liberdade, jogou com aquele ar desprendido de rapazola genial, marcou um, ofereceu dois, deixou os espanhóis de boca aberta até às orelhas (não admira, alguns têm dificuldade em ver para além da ponta do nariz). Falta agora começar a competição para ver o que faz Simeone.
Temo que, a valer pontos, recorra ao sistema de sempre: dois trincos lado a lado, um terceiro numa ala para ajudar a fechar, um extremo com movimentos controlados e um segundo avançado (Félix) dado à morte por trás de Diego Costa. Oxalá esteja enganado. A bem do futebol.