A diferença das convicções
<strong><em>PLANETA DO FUTEBOL - </em></strong>O jogo com a Suíça deu elementos para pensar. A final com a Holanda pode dar certezas para gerir melhor este momento.
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1 - Não é um Mundial nem um Europeu, mas é uma final dum torneio que, dividindo a Europa em divisões e papel quadriculado, pode traduzir mais uma "afirmação de personalidade" forte do futebol português. Podemos depois do jogo com a Suíça só ter certeza de uma coisa, que Ronaldo quando aparece faz-nos ganhar mesmo sem estarmos a jogar bem, mas o crédito e o estatuto que a nossa seleção ganhou nos últimos anos (décadas) já mostrou ser capaz de readaptar-se rapidamente a diferentes circunstâncias/exigências de jogo. Assim, da mesma forma simples como Ronaldo corre a celebrar os golos que marca esperando quando salta e trava que todos (a equipa, os adeptos e o país futebolístico) o venha abraçar.
2 - É essa noção adulta do jogo que permite imaginar a equipa a mudar de sistema tático de um jogo para o outro em curtos dias sem que tal exija hoje um exercício de treino e preparação longo que esse curto tempo não bastaria sem essa base de "cultura de jogo" adquirida (algo que está muito para além das meras estruturas táticas).
Penso que a ideia do 4x4x2 de Fernando Santos para o jogo com a Suíça era conceptualmente boa e interessante. Juntava os melhores jogadores ou, pelo menos, aqueles que nos davam mais garantias (ou seriam só promessas?) de jogamos bem divertindo-nos ao mesmo tempo. Foi isso que por aqui escrevi no dia anterior. Não correu como se esperava. Não nos divertimos. Ganhámos por Ronaldo, perdemos no jogo pela equipa em muitos momentos frente a onze suíços disciplinados e perigosos quando sabiam que podiam ser (no resto do tempo, travavam o... nosso perigo).
Talvez Fernando Santos mude agora o sistema e alguns protagonistas. É possível e aconselhável até olhando o adversário
3 - Talvez Fernando Santos mude agora o sistema e alguns protagonistas. É possível e aconselhável até olhando o adversário. Um 4x3x3 mais 4x2x3x1 e controlar o jogo com uma ocupação mais racional do terreno desde a origem da estrutura algo que o 4x4x2 losango (e suas basculações defensivas tão exigentes) não permite tantas vezes. Isso, mais do que perturbar a eficácia defensiva, compromete a forma como se sai depois para a construção ofensiva e se chega aos últimos 30 metros.
É natural João Félix ter sentido o jogo na cabeça com um peso superior ao que vinha revelando no Benfica. Imaginava que isso não sucederia de forma tão visível, mas este é o tipo de situação (maturação da formação ao mais alto nível) que só se consegue avaliar na prática. O potencial está todo dentro dele e só assim se percebe como deve ser gerido o seu processo de crescimento.
A seleção tem vários planos táticos para o talento. Só um (e face de cada individualidade e suas especificidades) deve servir de referência, porém, como plano do seu crescimento mental.
Da bancada mais alta
A Holanda está a ressurgir na elite, mas nesse processo de regeneração internacional não traz consigo a mesma base do conceito de futebol circular e de posse que fez a fama do futebol holandês revolucionário no seu passado histórico. Este futebol laranja tem o pragmatismo do passe em profundidade como forma preferencial de transição, ganha largura através dos laterais e joga com um falso 9 mais por recurso do que por opção.
Olho para esta Holanda e é impossível, por isso, não ver, mesmo desde o último lugar da bancada mais alta, os jogadores que emergem como grandes figuras: a dupla de defesas-centrais, talvez das mais fortes do mundo atualmente. O "arranha-céus" de técnica e temporização posicional um para um com o avançado para evitar ser driblado: Van Dijk, na maturidade dos 27 anos. E o possante e tecnicista de corte e sair a jogar, com poder aéreo e de bola na relva controlada: De Ligt, adulto de jogo precoce de 19 anos. Vendo-os jogar, em dupla, vê-se o que deve ser a telepatia de jogo (sentido posicional, dobras e sair a jogar) duma dupla de centrais a top.