PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião de Luís Freitas Lobo.
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1 As tranças no ar quando corre (com bola ou a festejar o golo) e o sorriso aberto de rua (ou pátio de escola) fazem hoje de Roger o melhor plano de fuga à realidade que o nosso campeonato pode proporcionar.
Com 16 anos, surge, porém, na primeira equipa do Braga não só com essa irreverência moleque, mas também já com a responsabilidade de quem sabe o que tem a fazer.
Antes de abrir esse sorriso de futebol, a sua cara mostra concentração. Vejam-na por trás da baliza em grande plano num dos golos que marcou em Arouca.
No fim, eu sabia, claro, que o Vitinha (três golos e tanto futebol como nº 9 com largura de campo todo) tinha sido o melhor em campo, mas resolvi dar o prémio ao Roger pelo que me fizera sentir. Simbolizava, também, o sucesso daquela equipa do Braga que meteu sete jogadores da formação em campo (e mais no banco).
O Vitinha vai, de certeza, ganhar vários prémios de "homem do jogo". Este, ao Roger, pelo momento, idade e sentimento, só podia ser agora. Tinha visto nele o sorriso do futebol e maior do que isso não existe. Agora, só lhe peço que nunca deixe de ser assim. Enfim, que nunca cresça. Que fique por dentro o mesmo jogador de rua.
2 Esta aposta forte do Braga na sua Academia (sub-19, sub-23 e equipa B) resultou, neste jogo, da falta de muitos titulares adultos (lesões, castigos, covid), mas também duma aposta de clube que, neste cruzamento de factores, levou Carvalhal (este ano um treinador "educador de infância") a dizer que isso devia ter sido dito no inicio de época. Não foi porque a intenção era, claro, que a base natural da equipa principal rendesse mais sem necessitar de tantos talentos caídos do berço.
Ou seja, o sucesso da formação foi proporcional ao baixo rendimento das opções de mercado que debilitaram a equipa em muitas posições onde contratou muito distante da qualidade anterior (laterais, centrais e até ponta-de-lança, posição salva pela explosão de Vitinha).
3 Esta época bracarense pode ser, assim, vista como de excelente trabalho interno na relação entre Academia e equipa principal, fundamental para o mesclado investimento desportivo (presente) e financeiro (futuro), mas o poder competitivo para se meter entre os três grandes nunca poderá ter, de raiz, esta base. Essa está, como se viu no mesmo jogo, na chamada reinvenção de talento que as melhores contratações demonstram.
Penso em Iuri Medeiros que, após o seu tempo de promessa rebelde, já era uma peça solta deixada cair pelos grandes (como era também Ricardo Horta quando veio após duas épocas no Málaga) e que agora ressurge, aos 27 anos, a jogar como adulto. Em Arouca até parecia o "pai" daquela equipa.
O "bicos de pés" coletivo
Entendo como custa a um treinador ver, desde o banco, a sua equipa longe de jogar como ele quer. Bruno Pinheiro desabafou esse sentimento no fim do (fraco) jogo do seu Estoril contra o Moreirense. A forma com falou logo a seguir na "flash-interview" ultrapassou, porém, as margens do mero jogo jogado. Foi mais longe e falou da atitude dos jogadores e de algum deslumbramento que, após um bom inicio de época, competitivo e com bom futebol, apareceram agora a jogar em "bicos de pés". Na demorada roda final no meio relvado já se notara na sua face a forma desagradada como falava ao grupo.
Confesso que sempre que ouço um discurso destes (independentemente da sua eventual verdade e frontalidade) fico com a sensação que esse treinador deixou por momentos de ser o... treinador dessa equipa, como se tudo aquilo não pudesse ser previsto ou evitado.
Ou seja, a liderança passa por (mesmo optando pela reprimenda publica que eu, ao contrário do elogio, defendo dever ser feita em privado) também se meter dentro do grupo nesses momentos, como o elemento capaz de contrariar/mudar esse sentimento e não como alguém que sobretudo também é vitima disso. Sei que é difícil lidar com esta fronteira, mas respirar um pouco é sempre melhor.