Um artigo de opinião de Nuno Correia da Silva, administrador de empresas
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A janela de transferências de verão está a aproximar-se do fim, em Portugal termina a 1 de setembro. Os contratos de última hora são, muitas vezes, momentos de grandes oportunidades, seja porque os grandes clubes têm muitos jogadores na mesma posição e precisam de os ceder para jogarem, evoluírem, seja porque a pressão do fecho de mercado impõe redução do preço dos direitos desportivos (vulgo passes).
Na ânsia da oportunidade podem, frequentemente, precipitarem-se contratos menos refletidos e mais expostos a rescisões inoportunas. A grande arma para defender a estabilidade do plantel, o investimento realizado, para poder construir uma equipa a médio prazo, era a designada “cláusula de rescisão”. Ainda hoje, com demasiada ligeireza, ouvimos comentadores regulares a falarem da “segurança” da cláusula de rescisão. É uma falácia, é não considerar o impacto que a jurisprudência tem tido na decisão de situações de controvérsia.
O caso judicial conhecido como “Lassana Diarra” em que o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) declarou, em 2024, que as regras da FIFA que exigem pagamento de indemnizações por parte de jogadores que rescindem contrato "sem justa causa", violam a legislação da União Europeia, nomeadamente os princípios da livre circulação de trabalhadores e da concorrência definidos no Art.º 45º do Tratado do Funcionamento da União Europeia (TFUE). Por consequência desta decisão, em janeiro de 2025, a FIFA alterou os regulamentos, nomeadamente o Art.º 17º do Regulamento sobre o Estatuto e a Transferência de Jogadores (RSTP). Não foram alterações de pormenor, foram muito impactantes, como: definição objetiva de justa causa (Art.º 14º) — agora estabelece que justa causa ocorre sempre que “uma das partes já não pode continuar, com razoabilidade e boa-fé, a relação contratual”. Revisão do cálculo da compensação (Art.º 17.º, §1) — a compensação passa a ser calculada com base no “princípio do interesse positivo”, ou seja, visa reconstruir a posição que o clube lesionado teria se não houvesse incumprimento, a cláusula de rescisão é meramente indicativa. Fim da responsabilidade solidária automática (Art.º 17.º, §2) — agora, o novo clube só será responsabilizado se houver prova clara de indução ao incumprimento. Sanções desportivas só com provas de indução (Art.º 17.º, §4) — as sanções, como proibições de registo, só se aplicam se ficar comprovado que o novo clube incentivou o incumprimento contratual. Simplificação do processo de emissão do Certificado Internacional de Transferência (ITC), o antigo clube tem 72 horas para emitir o certificado; se tal não ocorrer, o novo clube pode registar o jogador. Tudo isto, aconselha os clubes, nos novos contratos, a encontrarem outras formas de salvaguardar o seu investimento e a estabilidade do plantel. A cláusula de rescisão transformou-se numa arma sem balas.

