Clube da Maia teve um recorde de quatro jogadores na Seleção Nacional que jogou o Europeu. Ana Cunha, treinadora que os ensinou, explica os segredos de uma grande escola
Corpo do artigo
“Nunca sabemos o verdadeiro potencial de um jogador. A nossa missão é perspetivar um desenvolvimento a longo prazo, dar-lhes competências para o alto rendimento, mas não sabemos quem lá chega”, diz Ana Cunha, treinadora dos sub-16 do Águas Santas e a técnica que lançou mais jogadores entre os 18 que representaram Portugal no Europeu da Alemanha: Miguel Martins, Luís Frade e Pedro Oliveira saíram dos seus treinos dos minis e infantis, Gonçalo Vieira só acompanhou nos iniciados, onde ia fazendo as vezes de adjunta. O quarteto transformou o Águas Santas, pela primeira vez, no clube com mais jogadores da sua formação na principal Seleção Nacional, seguido pelo Colégio dos Carvalhos, com três.
Para os maiatos, “é claro que foi um orgulho”, diz a treinadora a O JOGO. “Temos essa preocupação, a de que tenham competência para estar nas seleções. Ter gente nas seleções jovens é um ponto de partida e foi sempre um objetivo nosso”, completa.
Com mais de uma dezena de títulos nacionais na última década e meia, repartidos por todos os escalões da formação, o Águas Santas está transformado numa das maiores escolas lusas de andebol, superando atualmente, nas condições, qualidade do trabalho e êxitos, aquele que durante muitos anos foi visto como o maior viveiro nacional, o ABC.
“Aqui tentamos olhar para o que é o andebol de alto nível e dar ao jovens as competências que lhes permitam entrar nesse contexto. Ter um corpo técnico estável tem permitido trabalhar com uma perspetiva de futuro, fazer um trabalho multidisciplinar a desenvolver os atletas de forma holística”, explica Ana Cunha, com uma revelação: “Nas camadas jovens do Águas Santas temos atualmente psicólogo, nutricionista e preparador físico. Estamos a fazer um investimento para o futuro”.
Treinadora na Maia professora na faculdade
Natural do Porto, mas vivendo em Gaia, Ana Cunha jogou no Almeida Garret até 2009, mas ao mesmo tempo formou-se na Faculdade de Desporto da Universidade do Porto (FADEUP) e começou a treinar no Águas Santas, depois de um ano de estágio nas equipas das gaienses. Na Maia passou por minis, infantis e está agora nos sub-16 (iniciados), com vitórias em todos jogos pela primeira das duas equipas do clube. Dá ainda aulas na Universidade Lusófona.
Das melhorias à falta de pivôs
Paulo Jorge Pereira alertou, em entrevista a O JOGO, para a curta base de recrutamento da Seleção Nacional. O Águas Santas, com perto de 200 atletas entre todos os escalões, é dos maiores fornecedores das equipas nacionais e Ana Cunha destaca uma evolução: “Precisamos de clubes que invistam na formação e felizmente existem cada vez mais com essa preocupação. Se a Seleção Nacional vai jogar o pré-olímpico, isso significa que melhorámos e é fruto do trabalho de muitos clubes. Mas a verdade é que só temos uns três laterais acima de 1,90 metros, enquanto a França poderá escolher entre uns 300... E que ainda estamos a lutar por participações e precisamos de começar a lutar por lugares”.
Fugindo às críticas, a treinadora considera apenas “controverso” o atual regulamento, que coloca os infantis a jogarem seis contra seis e apenas os sub-16 com equipas de sete. “É um desenvolvimento mais faseado, melhor para quem começa. Mas os que jogam há mais anos têm de subir de escalão mais cedo; isso é comum no Águas Santas”, diz, com um reparo: “Como até aos infantis jogam sem pivô, falta saber se estamos a formar quem substitua os cubanos”.
Internacionais
Miguel Martins
Central
26 anos
Pick Szeged (Hun.)
“Quando comecei a treinar os minis do Águas Santas ele já tinha cá uns anos de andebol. Começou muito novo. Queria sempre aprender mais. Procurava as fintas diferentes, ou descobrir um passe mais difícil, gostava muito de desafios. Era dos que tinham características que o distinguiam.”
Luís Frade
Pivô
25 anos
Barcelona (Esp.)
“Entrou para os infantis e num ano difícil, em que tivemos de reduzir o número de atletas e fazer escolhas. Só tinha uns meses de treino, não era um excelente jogador... Mas era um trabalhador, gostava muito de treinar e adorava defender, tendo qualidades que trazia do karaté. Aprendia com facilidade e tinha uma grande força mental, capacidade de superação.”
Gonçalo Vieira
Lateral
25 anos
Toulouse (Fra.)
“Não começou no Águas e só chegou para os iniciados. Acompanhava a equipa em que ele estava, mas não era a responsável direta. Sei que saiu um jogador diferente. Era brincalhão, demorou algum tempo a perceber que o talento - e tinha-o - não era suficiente para ser bom jogador. Tendo muitas capacidades, tinha de trabalhar. Pelo que me dizem, percebeu-o.”
Pedro Oliveira
Ponta
21 anos
FC Porto
“Teve um desenvolvimento diferente, porque demorou a entender a capacidade que tinha. Começou por jogar na primeira linha, era central - eles aqui passam por várias posições, para ganharem mais competências -, mas sempre gostou de jogar na ponta-esquerda. Já aqui teve o irmão Nuno e dois primos. Saíram todos e são todos jogadores de seleções.”