Uma prata, uma moto e amor: "Tenho que fazer com que valha a pena eles terem ido"
Filipe Monteiro, central da Seleção Nacional de Sub-21 de andebol, conversou com O JOGO na companhia dos pais, Luís e Cláudia
Corpo do artigo
Os elementos da Seleção Nacional de Sub-21 de andebol, que acabavam de chegar da Polónia com a medalha de prata, ainda não tinham surgido na zona de saída do aeroporto e já a avó Luísa, carregada de orgulho, contava que o filho, Luís, tinha ido ver os jogos de Filipe Monteiro, neto e central da equipa das Quinas. Estávamos no final da manhã de 30 de junho e apenas no domingo, 13 de julho, Luís regressou ao Porto.
A dica de uma avó orgulhosa despertou-nos a curiosidade: um pai que tinha ido à Polónia de “lambreta”, ele que, tal como a ex-mulher, também foram jogadores de andebol no Vigorosa.
“Ele foi de lambreta, mas liga-me todos os dias para eu saber que está bem”, explicara-nos Luísa. Um dia após voltar, Luís, que ajudou O JOGO a tratar de toda a logística, Filipe e a mãe, Cláudia Graça, juntaram-se para uma conversa descontraída. O local só podia ser um, o Pavilhão do Estrela e Vigorosa Sport – clube centenário, de cariz familiar e com histórico no automobilismo, tendo sido o organizador das corridas de Vila do Conde –, onde Filipe, com apenas cinco anos, começou a jogar, e que os pais, antigos andebolistas, também representaram.
“Estar aqui é bonito, é bom estar de volta. De vez em quando venho ver um jogo ou outro, estar com alguns colegas que ainda cá estão, ou treinadores e outras pessoas que já passaram cá. Esta foi a minha segunda casa durante muito tempo e é um clube que ficará sempre no meu coração, de certa forma, foi o Vigorosa que me fez”, comentou Filipe Monteiro, 21 anos, que depois de nove épocas no EVS, esteve três no Águas Santas, uma no U. Maia e as duas mais recentes no ABC. A partir da próxima temporada será atleta do Sporting (ver caixa).
“Já quando os jogos são cá em Portugal eles costumam ir a quase todo o lado. Sempre que podem, vão. E o facto de terem ido fora ver pela Seleção, mostra ainda mais o amor e a dedicação que eles têm por mim e pela minha carreira desportiva”, anotou um tímido Filipe, sentado ao lado dos pais, ambos com 53 anos, ele comercial, a mãe responsável administrativa e financeira de uma empresa.
As viagens dos pais
“No ano passado não fui à Eslovénia [ndr: Seleção foi prata europeia] por questões profissionais, mas este ano combinei de maneira a que pudesse chegar no Main Round. Fiz cerca de 7 800 quilómetros, ida e volta, foram quase 30 dias, seis para chegar e depois o resto para vir embora. Para lá foi em contrarrelógio, para cá explorei localidades e países pelos quais tinha curiosidade”, explicou-nos Luís Monteiro. “Eu fui de avião, cheguei muito mais rápido, sim. Não é que goste, pelo contrário, ganhei muito medo, precisamente a jogar, porque tínhamos de fazer muitos jogos na Madeira e lá, na altura, a pista era muito pequenina. Foi por amor ao meu filho, é o que tem que ser”, contou Cláudia.
“O facto de eles terem ido lá para o Main Round e já terem reservado os hotéis e comprado os bilhetes para os respetivos pavilhões, fez com que nós tivéssemos que passar as eliminatórias, para eles continuarem lá e não terem que trocar de hotel ou de cidade”, assinalou o central. “Quando estou em campo não me lembro quem é que está na bancada, se está cheia ou vazia, se estão lá os meus pais ou se são só adeptos de outros países ou clubes. Depois, entre jogos, saber que estão lá dá-me outra obrigação e outro foco, porque tenho que fazer com que valha a pena eles terem ido”, atirou.
Como se terá portado Filipe Monteiro no Campeonato do Mundo? A visão é a dos progenitores, “inquinada” logo à partida, mas a estes, como é lógico, não se pode pedir isenção. “Portou-se bem, acho que esteve a bom nível, talvez um bocadinho mais nervoso na parte inicial da final, se calhar com a ansiedade de querer ganhar o jogo e ser campeão no mundo”, respondeu Luís, até de forma eloquente. “E depois contrariado pelos árbitros, que sempre que eles se colavam mais ao resultado, havia uma exclusão, uma coisa qualquer”, acrescentou. “Não me enervo nada em vê-lo jogar, fico muito mais irritada com os árbitros quando eles não são justos e não necessariamente quando o Filipe está a jogar”, reagiu a mãe, sendo que a Cláudia foi perguntado se sofria ao ver o filho atuar.
“A prata é um orgulho, mas soube a pouco. Senti que tínhamos equipa para sermos campeões e a prova foi que ganhámos todos os jogos, menos o último. E, mesmo nesse último, demos luta. Apesar de termos partido atrás, conseguimos ir buscar o resultado”, analisou o central nascido no Estrela e Vigorosa, que tem hoje cerca de 100 miúdos na formação. “Fico feliz pela influência que lhe demos para começar no Vigorosa, porque o Filipe soube crescer num espírito guerreiro e de luta até ao fim e com a consciência que nada seria fácil de alcançar. Agora que já joga ao mais alto nível, revejo atitudes nele que são deste berço”, finalizou o pai, numa conversa a que também assistiram a avó Luísa e o irmão Francisco, 17 anos dia 21, ponta-de-lança do Nogueirense.