"Se existisse mais dinheiro em Espanha, seria bom para o campeonato português"
Gonçalo Alves e Hélder Nunes analisam o futuro da modalidade com preocupação e dão várias sugestões para a promover até noutros países
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Portugal tem o melhor campeonato do mundo, mas essa é uma realidade com dois lados. Gonçalo Alves e Hélder Nunes analisam o panorama internacional.
Portugal ter sete equipas na Champions. É bom ou mau sinal para o hóquei em patins?
HÉLDER NUNES-Para o hóquei português é bom; para o panorama europeu é mau. Nem sei se acho justo. A Liga dos Campeões deveria ter mais países. Mas a forma como se trabalha em Portugal, com tanto profissionalismo e a vontade das equipas mais pequenas de ter algo mais, leva a esse resultado. Estive fora e agora vejo, todos os fins de semana, o porquê de o hóquei português ser tão forte. Os teoricamente mais pequenos querem muito crescer. Em Espanha eles querem, mas se não der não é problema...
Que se pode fazer para promover o hóquei em mais países?
HN-Vendo por Espanha, deve ser a 15.ª modalidade do país. Trazer bons patrocinadores, gente com dinheiro que se interesse pelo espetáculo do hóquei, é o primeiro passo. Se em Espanha existisse mais dinheiro, seria bom até para o campeonato português, pois atualmente deve estar cá 90% do investimento. Há um Barcelona e tudo à volta é muito mais fraco. Falta o dinheiro, que move o mundo. Modalidades pequenas de pavilhão precisam de quem promova o espetáculo, que se divulgue a nossa magia. Em Espanha custa ver os jogos entre os últimos, até para mim, e esse é o meu trabalho.
Preocupa-vos estar a modalidade reduzida a Portugal, Catalunha e umas cidades de Itália?
GONÇALO ALVES-Sim, pois o futuro pode não ser tão risonho como queríamos. Mas, além de nós, cabe às federações fazerem com que outros países cresçam. Como a França, que com os irmãos Di Benedetto criou uma seleção forte, Alemanha, Áustria ou Suíça. As federações deviam organizar por lá campos de treinos e levar jogadores que ajudem na evolução do hóquei. Temos de ajudar outros a crescer. E mesmo por cá é preciso pensar no futuro: o nosso campeonato é bom, mas tem muitos estrangeiros. Isto tira, potencialmente, lugares aos mais jovens. Argentinos e espanhóis chegam a ganhar o mesmo que um jovem português, tornam o campeonato mais competitivo, mas estão a tirar oportunidades.
Se aparecer um patrocinador a fazer uma grande equipa, por exemplo na Alemanha, era atraente para jogadores como vocês?
HN-Se fosse um ato isolado, para irmos ganhar o campeonato alemão jogando de costas, não era atrativo.
GA-Ou poderia sê-lo, mas daqui a uns dez anos, em final de carreira. Neste momento, não. Era preciso um investimento que criasse um campeonato competitivo.
“Fazemos muitos golos a pensar nos adeptos”
O FC Porto quer recuperar o título nacional, segue em terceiro (atrás de Oliveirense e Sporting), com três derrotas, sendo das equipas que marca muitas vezes. Gonçalo e Hélder falam, mais do que um campeonato que ainda terá play-off, sobre o entusiasmo que tentam colocar em jogo.
Esta época o FC Porto está a fazer uma média de 5,5 golos por jogo. É elevado?...
HÉLDER NUNES-Achamos que, para o que criamos, estamos a falhar um bocado na finalização. Essa média é elevada, mas para as oportunidades que temos junto à baliza adversária deveria ser maior. Mas essa é uma forma de se ver o trabalho que estamos a fazer. O hóquei está a ser direcionado para ser mais metódico, para não se falhar, mas também pensamos nos adeptos, nas famílias que temos na bancada - e nem todos gostam de ir ver -, sabendo que havendo um lance diferente, que gera comentários, todos gostam. Como somos uma família, tentamos divertir toda a gente, incluindo os adeptos, porque procuramos trazer mais alguns ao pavilhão. Isso faz parte do nosso trabalho.
É uma equipa que gosta de dar espetáculo?
GONÇALO ALVES-Podemos dizer que sim. Tentamos ao máximo que as pessoas se divirtam a ver um jogo de hóquei. Se não tiver espetáculo ou emoção, as pessoas vêm algumas vezes e depois mudam para outra modalidade. Sem isso o hóquei não cresce. Parte de nós provar que é uma modalidade com emoção, que se pode dar a volta a um jogo.
O FC Porto marca muitos golos, mas perdeu três vezes para o campeonato, duas por muitos. Porquê?
HN- Porque no desporto já todos trabalham bem fisicamente. A magia de que falámos nem sempre aparece. Do outro lado também está quem joga para ganhar. E fora de casa temos outras condicionantes, como o público contrário, uma pista que pode escorregar mais ou menos, estar calor ou frio, os árbitros; tudo influi no jogo. Nem sempre corre tudo bem. Somos muito fortes, mas não imbatíveis.
GA-Se fosse por nós, ganhávamos os jogos todos, e por muitos! Procuramos sempre a vitória. Mas há outros dez que procuram o mesmo e o campeonato português está cada vez mais competitivo. É natural que alguns já ganhem a FC Porto ou Benfica.
“Campeonato é o mais difícil”
Se vos dessem a escolher entre conquistar o campeonato ou Champions, qual era a opção?
HN -Nunca ganhei a Liga dos Campeões, mas o título mais gratificante é o campeonato. É uma corrida longa, um trabalho desde o primeiro dia de pré-época e temos de ser muito consistentes para chegar ao fim e vencer. A Liga dos Campeões é uma fase de grupos com seis jogos, normalmente iremos aos quartos de final e aí é a eliminar. Quem falha um jogo pode estar fora. No campeonato, mesmo falhando, importa ser consistente, mostrar qualidade até ao fim. Mas adorava ganhar os dois no mesmo ano.
GA-No campeonato temos a fase regular e um play-off que ainda o torna mais difícil. Se vencer a fase regular já é difícil, com o play-off torna-se ainda mais gratificante conquistá-lo. A Liga dos Campeões são dez jogos importantes, com adversários difíceis, em que com uma falha podemos estar de fora.
É mais difícil ganhar o campeonato português do que a Champions?
GA-Penso que sim.
HN-Nem que seja pelo play-off, por se jogar cinco vezes seguidas com a mesma equipa.
GA-Ter dez jogos com Benfica e Sporting, entre meias-finais e final, é mais difícil do que um fim de semana de Champions.
No campeonato já identificaram um rival mais sério, ou há muitos candidatos?
HN-Os candidatos são os mesmos cinco: Barcelos, Oliveirense, Benfica, Sporting e FC Porto. Mas o Tomar está a fazer uma grande época, o Valongo esteve quase a eliminar o Benfica na última temporada. Sendo play-off não se torna fácil para ninguém. Quem ganha a fase regular defronta o oitavo classificado, mas esse pode ser muito forte.
GA-No play-off, quem perde um jogo em casa pode ficar logo de fora. É um campeonato muito competitivo.