"Portugal tem a quarta seleção do mundo, mas só há cinco pavilhões a sério"
Ljubomir Obradovic está reformado, visitou o Porto, conversou com O JOGO e deixou elogios e recados à forma como o andebol é gerido
Corpo do artigo
Ljubomir Obradovic tem 70 anos, esteve uns dias no Porto, matou saudades dos amigos e, depois de seis temporadas no FC Porto, que treinou rumo a um inédito heptacampeonato no andebol português, viu os jogos da antiga equipa com Marítimo e Kiel.
Que tem feito?
-Estou na reforma e vim cá ver andebol.
Viu o Campeonato do Mundo?
-Claro, e gostei muito da forma como Portugal jogou. Parabéns a jogadores, técnicos e médicos. Foi espetacular, podia ter sido terceiro, teve azar, não marcou o último golo, mas é a vida. Podia ter ganho e levado uma medalha. Sei que as pessoas estiveram entusiasmadas com o andebol nas três semanas do Mundial e deixo uma pergunta: o jogo para o terceiro lugar foi num domingo, segunda-feira a Seleção regressou a Portugal e na terça-feira acabou tudo. É uma pena para o andebol. Portugal tem de aproveitar este quarto lugar. Quarto lugar do mundo não foi coisa pouca. A Seleção Nacional mostrou união, luta, garra, entrega, tudo o que é preciso . Portugal é um país de futebol, o andebol precisa de batalhar bastante para se afirmar. Não ultrapassará nunca o futebol, mas pode ser a segunda modalidade do país.
Agora irá acontecer?
-Não acredito que o futuro seja como eu gostaria.
Porquê?
-Portugal tem três equipas, FC Porto, Sporting e Benfica, que lutam pelo título e não há mais nenhum clube a esse nível. São precisas sete/oito equipas que possam ganhar uma à outra, e dando oportunidades aos mais novos. O andebol português tem grandes potencialidades, trata-se de trabalhar e haver quem apoie. Portugal é medalha de prata em mundiais e europeus nos escalões jovens, é preciso integrar esses atletas nos seniores.
Mas no Mundial havia seis atletas abaixo dos 22 anos...
-Quanto tempo jogou o Ricardo Brandão?
O Victor Iturriza foi o melhor pivô do Mundial...
-Tem razão, concordo. Mas vamos olhar ao campeonato português... Quantos jogadores teve o Benfica na Seleção? O Capdeville. Ele esteve muito bem, mas acho muito pouco para o Benfica apenas apresentar o Capdeville.
Tendo tantos jovens na Seleção, Portugal não pode crescer?
-Portugal tem de andar. É ver o que faz a Dinamarca, sabem muito bem o que querem e neste Campeonato do Mundo era só entregar-lhes as medalhas. A Espanha foi 18.ª, mas nos juniores, nos últimos dois campeonatos, foi primeira e Portugal segundo. Agora, no apuramento para o Europeu, a Espanha tem dois jogos com a Sérvia, e o Jordi [Ribera, selecionador] mudou completamente a equipa. Terá essa malta que jogou as competições jovens. Isso é o futuro.
Portugal pode chegar a uma medalha?
-Depende. Nesta geração há atletas para substituir, mas como, se não jogam no clube nem na Seleção? Às vezes têm de sair para jogar. Temos o exemplo do Gonçalo Vieira, lateral-esquerdo do Toulouse. E é polivalente, também joga a central.
Há o Miguel Martins de regresso depois da suspensão...
-Eu liguei ao Miguel Martins. O trauma que isso causou, não só a ele como à família! Ele tem de ir para tribunal, brincaram com a vida dele e não pode ficar assim. Vejamos o Sinner, o italiano do ténis, acusou duas vezes positivo e foi suspenso três meses? As pessoas já não acreditam nisto. Quanto a Portugal, só tem de pensar em chegar às medalhas e, entre juniores e seniores, devia formar mais uma equipa, chame-lhe seleção B, ou seleção olímpica, seja o que for, mas devem trabalhar com eles para os aproximarem da equipa principal.
Para esses investimentos não seria necessária a ajuda do Estado?
-O Estado tem de ajudar, tem de investir. Portugal tem a quarta seleção do mundo, mas só há cinco pavilhões a sério, de FC Porto, Sporting, Benfica, Marítimo e V. Guimarães, para se jogar andebol. Nos outros ou chove, ou há humidade...