Quando, este domingo, terminar o GP de Valência, Miguel Oliveira fecha um ciclo de três anos em Moto2, a categoria intermédia do Mundial de motociclismo. Depois de amanhã, já estará na classe rainha, com os primeiros testes de preparação da nova época. A estreia em MotoGP será na equipa satélite da KTM, a Tech3, e a primeira meta está traçada: "Vou trabalhar para o título de rookie do ano"
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Este domingo tem um significado especial na vida e carreira de Miguel Ângelo Falcão de Oliveira, o piloto da Margem Sul que, à custa de muito empenho, coragem e talento, encontrou um novo norte, aos 23 anos: no próximo ano alinhará no Mundial de MotoGP, com 19 corridas a partir de 10 de março, em Losail (Catar). "O sonho de menino tornou-se realidade", escreveu, no passado mês de maio, na sua conta do Instagram, partilhando a foto da assinatura de um contrato inédito. Ele será o primeiro português no escalão máximo do motociclismo, depois de Felisberto Teixeira ter feito duas provas (em 1998 e 2000), mas como convidado.
Sendo vice-campeão mundial de Moto2, um ano depois de ter terminado na terceira posição, Oliveira vai competir pela Tech3, equipa que trocará as Yamaha pelas KTM e funcionará como satélite da formação de fábrica.
O primeiro da "escola" Red Bull KTM a atingir o topo
Tendo feito cinco épocas na classe inferior e três na intermédia, foi a partir de 2015 que a carreira de Miguel Oliveira tomou o rumo atual, na condição de piloto Red Bull KTM. Nesse ano foi segundo em Moto3, com seis corridas ganhas, e agora chega ao escalão máximo, após cinco triunfos e outro vice-campeonato em Moto2. "Só o facto de chegar ao MotoGP já é um motivo de orgulho e de felicidade. A forma como chego dá ainda mais mérito, pois entro por ter demonstrado ser um excelente piloto por onde passei, numa evolução desde as Rookies Cup até ao Moto2. Estou muito grato pela oportunidade que a KTM me deu", disse Miguel Oliveira em exclusivo a O JOGO. Ele é o primeiro saído da formação da equipa a atingir o topo e Pit Beirer, diretor da KTM Motorsports, diz mais: "É um passo com grande peso emocional para nós, comprovando tudo o que dissemos a propósito da construção de uma estrutura no paddock e a possibilidade de vir da Red Bull Rookies Cup e acabar no MotoGP. Estou feliz por podermos dar esta oportunidade ao Miguel."
Prós e contras do maior salto de uma carreira
No primeiro ano de MotoGP, Miguel Oliveira terá menos pressão do que a maioria, precisamente por vir de uma "escola" onde é bem conhecido. A sua meta, aliás, está traçada. "Será o meu ano de rookie, por isso vou trabalhar para conquistar o título de rookie do ano. Tenho de me adaptar a muitas coisas, como eletrónica, potência do motor, pneus e forma de trabalho da equipa", diz-nos o almadense, que a seu favor terá mais dois factos:
- Os 126 lugares que recuperou em 16 corridas de Moto2 [ver quadro], prova de qualidade que lhe valeu elogios até de Rossi: "Não houve uma corrida em que não tivesse somado pontos. É rápido, tendo tudo sob controlo."
- Vai trabalhar com um dos engenheiros mais sábios: o francês Guy Coulon.
As maiores dificuldades terão a ver com a juventude das KTM de MotoGP, que nesta época deixaram a equipa num modesto nono lugar - "tenho a esperança de que eu e o Zarco possamos aportar mais informação à KTM, para a desenvolver", diz-nos Oliveira - e as dificuldades do ano de estreia. Das estrelas atuais, Márquez, Rossi Lorenzo e Pedrosa brilharam no primeiro ano, mas estrearam-se pela melhor equipa. Portanto, e tirando as exceções que foram Dovizioso e Zarco, a história [ver quadro] diz-nos que os rookies ficam... fora dos 10 primeiros.
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Guy Coulon é o virtuoso da mecânica
A estreia na Red Bull KTM Tech3 está por horas, ainda que apenas em testes, mas, confrontado com o facto de ir trabalhar com Guy Coulon, Miguel Oliveira entusiasmou-se. "Estou feliz por poder aprender com ele, não só porque já trabalhou com grandes nomes, mas também porque já o fez com vários pilotos que foram rookies. Por isso, acredito que será uma mais-valia para mim", explicou o piloto português a O JOGO. A sua expectativa, refira-se, nada tem de estranho.
O engenheiro francês, de 63 anos, é fundador e coproprietário da Tech3 - juntamente com Hervé Poncharal e Bernard Martignac -, sendo visto como uma espécie de mestre-guru. Ele será o "padrinho" de Oliveira, tendo a sua reputação está lá no alto, fruto do trabalho com Johann Zarco e a Yamaha da Tech3 nas duas últimas épocas - ambas ocupando o sexto lugar, sendo o melhor dos privados. Considerado como um virtuoso da mecânica, Coulon é um autodidata que se tornou num "chefe de orquestra, capaz de ler todas as partituras e dirigir, orientar e potenciar os diferentes instrumentistas: pilotos e técnicos ou engenheiros especializados em motores, chassis, suspensões ou pneus". Foi assim que foi descrito, num artigo do jornal "Le Monde", o homem que faz lembrar o Dr. Emmett "Doc" Brown, o cientista brilhante e extravagante do filme "Regresso ao Futuro". Instado a comentar esses elogios, Coulon esteve igual a si próprio: "A experiência é fundamental, pois a seguir a uma sessão de trabalho os pilotos dirigem-se ao chefe dos mecânicos e este tem de ter um grande poder de síntese e fazer as coisas rapidamente."
Depois de amanhã e quarta-feira, o português realizará, em Valência, os primeiros testes de MotoGP, tendo nos próximos dias 28 e 29, em Jerez, a última oportunidade deste ano, antes de três novas séries em fevereiro. "Ainda não andei na moto. O meu foco estará, nesta fase inicial, na adaptação", referiu, antecipando uma experiência que será nova para todos, pois também a Tech3 e Coulon irão conhecer as KTM.