"Lutava há muito por isto e sempre a ficar perto, desta vez chegou a recompensa"
Venezuelano da Rádio Popular-Boavista venceu isolado a primeira etapa do 4.º Grande Prémio Douro Internacional, depois de gorada uma fuga espetacular de Luís Mendonça. Entre calor e poeira, Resende recebeu uma etapa memorável, só decidida na quarta fuga.
Corpo do artigo
Francisco Peñuela é venezuelano, tem 23 anos, chegou à Rádio Popular-Boavista depois de uma época como promessa na Israel Academy e ficara perto do triunfo no Alentejo, no GP O JOGO e no Abimota. Depois da coleção de segundos lugares chegou o triunfo, festejado de forma eufórica em São Martinho de Mouros, no concelho de Resende, e com o bónus de vestir a camisola amarela do 4.º Grande Prémio Douro Internacional. Mas chegar ao momento de festa não foi simples. O axadrezado teve de levar a melhor naquela que foi a quarta fuga de 141,5 quilómetros de espetáculo.
A meteorologia extrema poupou os corredores, que mesmo assim partiram de Caldas de Aregos sob 31 graus e com o ar coberto de poeiras. A primeira escapada demorou, para depois João Macedo (Credibom-LA), Leangel Linarez (Tavfer), Francisco Campos (AP-Tavira), Tiago Ferreira (GI Group), Carlos Oyarzun (Aviludo), José Martin (CCL Matdiver) e Fabrizio Crozzolo (Technosylva) ganharem dois minutos ao pelotão, esboroados na subida de São Cristóvão, uma das subidas nacionais mais difíceis (11,2 km a 7,6%). Na escalada foram Tiago Leal (RP-Boavista) e Abner Gonzalez (Efapel), a isolar-se, para serem apanhados e ultrapassados na descida, por um ciclone chamado Luís Mendonça (Sabgal-Anicolor).
O vencedor do ano passado queria repetir a gracinha, mas aguentar mais de 50 km em solitário era impossível. Com o aproximar do final foram Mathias Bregnhoj (Sabgal), Tiago Antunes (Efapel), Nicolas Tivani (Aviludo-Louletano) e Francisco Peñuela a passar para a frente.
“Não existia muito entendimento e fomos alcançados por um corredor vindo de trás, que atacou a um quilómetro do final”, contou Peñuela, referindo-se à surpresa Miquel Valls, da Amadora CCL-Matdiver. “Eu arranquei a uns 500 metros e passei por ele”, explicou ainda o venezuelano, que conseguiu festejar com uns bons metros de vantagem para Bregnhoj, talvez o mais intimidante dos adversários. O dinamarquês é das maiores apostas da Sabgal e ainda mal se mostrou entre nós.
Talentos de um país sem tradições no ciclismo
Há 40 venezuelanos no ranking mundial, o melhor da história do país foi José Rujano, vencedor de três etapas no Giro e terceiro à geral em 2005, e entre os atuais só se destacam três, todos conhecidos: Orluis Aular, sprinter da Caja Rural e bi-vencedor no Alentejo, Leangel Linarez (foto), da Tavfer-Ovos Matinados e campeão Panamericano em título, e Peñuela. Este é o mais novo, e o mais promissor.
“Chegou a recompensa”
“Estou muito contente. Ganhar uma etapa e vestir a amarela é um sonho. Lutava há muito por isto e sempre a ficar perto, desta vez chegou a recompensa”, sintetizou Francisco Peñuela, já de camisola amarela vestida, acreditando que o diretor-desportivo José Santos “está satisfeito” com os seus desempenhos e prometendo “continuar a trabalhar, para agradar à Rádio Popular e restantes patrocinadores”.
O jovem venezuelano, arrojado na estrada, revela ainda sentido de marketing, mas não sabe bem o que o espera a partir de hoje. “Não sei como defender a amarela. Não conheço as etapas, vou descobrir dia a dia. Sei que será difícil, mas tentarei. Vou ter adversários muito fortes e darei tudo até segunda-feira”, prometeu.
Garantido é já o balanço positivo desta época. “Tenho trabalhado muito, depois de um ano complicado, com lesões e uma fratura de clavícula”, contou, explicando a sua saída da Israel Academy, naquele que pensava ser um passo para o topo. “No final da época anterior não sabia qual era o meu futuro. Ligou-me o Juan Campos a dizer que tinha o Boavista para mim. Vim com tudo”, diz, agradecendo ao empresário e esperando ainda “chegar ao World Tour”.
Desistentes e atrasos enormes
Apesar da média muito baixa (35,42 km/h), o calor e a dureza da etapa fizeram mais mossa do que o habitual. Alinharam 105 corredores - Mauricio Moreira, doente, foi trocado à última hora - e 11 ficaram pelo caminho, nove das equipas sub-23. O pelotão terminou em pequenos grupos, o último a 38 minutos do vencedor, mas a meta só fechou com Hugo Ortega, da Zamora, 55m20s depois e eliminado.
Dor de barriga antes do ataque
“Gosto de dar espetáculo!”, atirou Luís Mendonça a O JOGO, depois de protagonizar uma etapa que ficará na sua memória, pela “loucura de sensações”, como o próprio corredor da Sabgal-Anicolor caracterizou.
O vencedor do ano passado, que pretendia ganhar isolado logo na primeira etapa - “O plano era esse, pois sei que Armamar será duríssimo e aí não resisto aos trepadores”, explicou -, sentiu-se mal de início. “Tinha uma dor de barriga horrível, sentia-me estranho, pensei que era o fim da minha corrida. Tive de parar”, confessou. Depois, surpreendeu-se. “Curiosamente, saí bem dessa indisposição. Mal encostei ao pelotão, na descida, passei direto para a frente”, narrou. Pelo caminho, teve dissabores de que preferiu não falar, mas que se traduziram numa multa de 100 euros e 20 segundos de penalização, por “impulso repetido na viatura da equipa”, escreveram os comissários.
A verdade é que Mendonça, rei das descidas, brilhou daí em diante. “Alcancei a fuga”, lembrou, sobre o momento em que se juntou a Tiago Leal e Abner Gonzalez, para depressa os deixar e se isolar. “Como gosto muito de descer, passei a representar uma dificuldade para os adversários, que tiveram de me perseguir. Num terreno rompe pernas, e pedalando sozinho, foi um sofrimento enorme, só Deus sabe”, completou.
“Foi pena ser alcançado, mas é bom ser protagonista numa corrida que está mais dura do que o ano passado. Sabe bem estar em forma e em destaque”, terminou o paredense, alcançado a 10 km da meta e agora destinado a ajudar Mathias Breghnoj, o melhor da Sabgal. “Foi uma etapa espetacular, que acabou com o pelotão esfrangalhado. Vou ver se melhoro, para tentar vencer uma etapa”, prometeu.
Primeiro dos finais em montanha
Carrazeda de Ansiães, após 147,2 km desde Santa Marta de Penaguião, vai ter o primeiro dos três testes à liderança de Francisco Peñuela e da Rádio Popular-Boavista. A etapa tem três contagens de montanha, no total contempla 50 km a subir e o mais desafiante será precisamente o final. A escalada até à meta começa na Foz do Tua, tendo 17,7 km com uma inclinação média de 3,5%. Parece uma subida suave, mas, na realidade, conta com várias zonas rápidas - incluindo os últimos 3 km, planos - e outras com pendentes acima dos 10%, na fase inicial. “A ambição é a geral e já tenho um ponto de partida”, avisou Mathias Bregnhoj, segundo da geral.