Iúri Leitão: "Tudo se resume a dinheiro, aquilo que nos falta é porque não temos..."
ENTREVISTA, PARTE VI - Portugal “fabricou” campeões olímpicos em dez anos graças ao amor à camisola e, destaca Iúri Leitão, ao profissionalismo do selecionador Gabriel Mendes.
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A evolução da equipa de pista portuguesa é um caso único no mundo, com campeões olímpicos em dez anos, enquanto os outros estão lá há décadas...
-Não sei se é único. Que é excecional, sem dúvida. E devemos quase tudo ao nosso selecionador. Nós temos feito omeletas sem ovos, com esforço redobrado, com três pessoas a fazer o trabalho de sete ou oito. Por conta desse profissionalismo, dessa alma, dessa paixão pelo desporto - porque não é o que lhes pagam que justifica trabalho redobrado -, e amor à camisola é que temos evoluído tanto com tão pouco.
Os triunfos são dos ciclistas...
-Claro, também temos trabalhado para isso. Somos nós que carregamos nos pedais. Mas é juntando tudo, com determinação, trabalho e paixão, que temos os resultados. Fala-se do milagre do ciclismo de pista. Não há milagres, existe trabalho e dedicação.
Vocês reclamaram apoio. O que vos falta?
-Tudo se resume a dinheiro, não é? O dinheiro compra material, condições, tempo. Aquilo que nos falta é porque não temos dinheiro. Os nossos fatos - fora dos Jogos Olímpicos, que lá não há publicidade - estão muito vazios. Agora podem dizer: vocês já conseguiram. Mas podemos não conseguir na próxima. E há mais, quando eu e o Rui perdermos capacidade, quem vem a seguir? Temos de criar ciclistas, ter condições para formar jovens, para fazer festivais de pista, para os chamar, ensiná-los e levá-los a correr ao estrangeiro. Vou dar um exemplo que até parece ridículo: este ano fomos à Austrália e não pudemos levar bicicletas de estrada, porque não havia dinheiro suficiente para embarcar tudo. A prova até foi espetacular, mas não devíamos ter de abdicar de bicicletas.
Portugal precisa de uma equipa de perseguição?
-Precisa e temos atletas para fazer grandes resultados. Não estou a falar em medalhas, mas podíamos estar nos Jogos Olímpicos com uma equipa de perseguição, importante por uma questão de hierarquia. A prova de perseguição por equipas é a mais importante e garante quatro atletas nos Jogos, também qualificando automaticamente dois para o madison e um para o omnium. Portanto, se formos uma das dez melhores nações do mundo, não temos dores de cabeça para apurar o madison e o omnium. Podíamos fazer como outros, levar a equipa de perseguição às provas com os melhores e os jovens às outras corridas.
Portugal poderia ter outro velódromo? Por exemplo, no Minho?
-Claro que gostava. Temos o Centro de Alto Rendimento em Anadia, Sangalhos, que temos usado da melhor forma. Mas podia haver mais. É uma obra complicada e cara, mas os outros países têm mais do que um. Seria a forma de atrair mais jovens e também mais adeptos; e estes significam audiência, logo mediatismo e a seguir dinheiro.
Quer deixar uma mensagem aos nossos leitores?
-Agradeço todo o apoio e carinho que demonstram, todo o tempo que têm investido em ver-nos competir. Tem sido uma longa caminhada para chegar até aqui, mas sem o vosso apoio seria muito mais complicado. O meu muito obrigado.