Fernanda Ribeiro: "Se não tivesse arriscado, não saberia o que é ser campeã olímpica"
Fernanda Ribeiro esteve na Torre do Lidador, na Maia, para recordar a corrida pelo ouro nos Jogos Olímpicos de Atlanta, em 1996. Habituada a vencer campeonatos e medalhas desde criança, a antiga atleta de Penafiel refletiu ainda sobre os títulos, as desistências e o bronze que soube a ouro nos Jogos Olímpicos de Sydney
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Fernanda Ribeiro foi na terça-feira a convidada de mais uma das conversas que assinalam o 40.º aniversário do jornal O JOGO, na Maia, pretexto para recordar o percurso da nortenha no atletismo, em especial a medalha de ouro que venceu nos Jogos Olímpicos de Atlanta, em 1996, quando ultrapassou a chinesa Wang Junxia, então recordista mundial dos 10 mil metros, no final da última volta, com um sprint surpreendente por dentro - algo que, salientou, não se deve fazer... -, e que só terminou quando cruzou a meta. “Lembro-me de pensar que ela estava muito rápida e que o segundo lugar também era bom, até porque não tinha nenhuma medalha olímpica. Mas, na altura, pensei que não tinha nada a perder. Costumava controlar as corridas pelo ecrã e vi a cara de sacrifício dela. Era o tudo ou nada. O público estava a vibrar muito e acho que a chinesa deve ter pensado que era para ela”, recordou, sobre esse sprint mágico. “Se não tivesse arriscado, não saberia o que é ser campeã olímpica”, destacou.
A corrida passou em Portugal já de madrugada e a primeira página de O JOGO, com o “orgulho português” em destaque, foi igualmente feita numa verdadeira corrida contra o tempo para chegar às bancas. Obstáculos, ainda assim, incomparáveis aos que se atravessaram no percurso da antiga atleta de Novelas, Penafiel. As lesões num tendão de Aquiles foram dor de cabeça persistente, e quase precipitaram o fim da carreira poucos meses antes da glória olímpica. Aliás, no final do estágio para Atlanta que fez em Manaus, no Brasil, uma opinião médica chegou a ditar que não voltaria a correr. Mas, os treinos diários com o treinador João Campos, o massagista russo Rachid Boukurov e o acompanhamento de Rodolfo Moura, então fisioterapeuta do FC Porto, ajudaram-na a dar a volta. “De tanto ouvir o Rodolfo dizer que ia ser campeã olímpica, fui acreditando...”
Menos otimista estava nos Jogos Olímpicos de Sydney, em 2000. O ano anterior tinha sido terrível, com uma desistência pelo meio nos Mundiais de Sevilha, e chegou mesmo a pensar não competir na Austrália. Mudou de ideias numa reflexão que fez já na aldeia olímpica. Mesmo assim, ironizou, a confiança era tanta que nem o fato de treino de gala levou no saco para o caso de ter de subir ao pódio. Mas, afinal, subiu. “Ganhei a medalha e a Ana Dias e a Manuela Machado (ex-maratonistas) foram buscá-lo”. Esse bronze soube-lhe a ouro.
E se o ladrão for a companhia?
Embalada pelas recordações vitoriosas da carreira, Fernanda Ribeiro recuou ainda mais para lembrar a primeira corrida a que assitiu com o pai e a decisão de fazer deste desporto carreira quando, aos nove anos, começou a praticar a modalidade. “A minha mãe não queria, porque eu era muito magra e ela achava que não tinha condições para me dar a alimentação que devia ter no atletismo”, revelou, acrescentando que esta acabou por se tornar na sua maior fã. As preocupações de nada serviram e a menina de Novelas passou a fazer quilómetros, ora de comboio, ora de autocarro de Penafiel até ao Porto. “Apanhava comboio em Contumil, à noite, e diziam que havia assaltos. Por isso, ficava à espera que aparecesse alguém para me sentir acompanhada. Mas, uma vez pensei: e se o ladrão for a companhia?”, recordou, bem-humorada.
À espera que FC Porto volte ao atletismo
Terminada a carreira, a antiga atleta, que fez grande parte do percurso no FC Porto, lamentou a extinção da modalidade no clube, embora confie na promessa de André Villas-Boas de a fazer voltar. “Não ter atletismo é triste. Compreendo que agora não haja dinheiro, mas podemos começar com uma equipa fraquinha”, sugeriu a campeã olímpica, que continua ligada às corridas através da Academia Fernanda Ribeiro. Incentivar novos talentos é uma missão que a preenche, entre muitas viagens a Lisboa, “onde se concentra tudo, Federação, Comité Olímpico, IPDJ...”
A mais medalhada
Em 1996, Fernanda Ribeiro tornou-se na terceira atleta nacional a conseguir a medalha de ouro numa edição dos Jogos Olímpicos, depois de Carlos Lopes (vencedor dos Jogos de Los Angeles, em 1984), e Rosa Mota, que repetia a conquista quatro anos depois (Seul, 1988). As 12 medalhas que a ex-atleta conquistou em competições internacionais - cinco de ouro, quatro de prata e três de bronze - são um recorde no atletismo nacional, servindo de base à conversa conduzida por João Araújo, Chefe de Redação de O JOGO.
Dois heróis do andebol português são os próximos convidados
Rui Silva e Victor Iturriza, dois dos jogadores que asseguraram o quarto lugar da Seleção Nacional de andebol no Mundial, são os convidados do próximo ciclo de “Conversas com Campeões”, agendada para o próximo dia 18, na Torre do Lidador. Além de Fernanda Ribeiro, passaram também pelo emblemático edifício da Maia os treinadores Carlos Queiroz e Jaime Pacheco, ex-técnico do Boavista, Silvestre Varela e Rolando, antigos futebolistas do FC Porto, a dupla de canoístas do Benfica Fernando Pimenta e Teresa Portela e o medalhado olímpico Iúri Leitão. Todas as conversas estão disponíveis no YouTube de O JOGO. A exposição “40 anos, 40 histórias” está no átrio da Torre maiata até ao próximo dia 21 e tem entrada livre.