Jogos Olímpicos >> Uma das propostas para render o hipismo no pentatlo moderno gerou irritação. Mas não é descabida de todo
Corpo do artigo
A imagem da treinadora alemã, Kim Raisner, a dar um soco numa coxa de Saint Boy, o cavalo que se recusava a saltar os obstáculos, comprometendo a corrida de Annika Schleu pelo ouro nos Jogos de Tóquio, pode ter sido fatal para o pentatlo moderno. O desporto criado pelo fundador dos Jogos da era moderna, Pierre de Coubertin, estava na corda bamba devido às suas fracas audiências, e a polémica ajudou a uma decisão difícil: na passada quinta-feira, o Comité Olímpico Internacional retirou a modalidade do programa dos Jogos de Los Angeles"2028, dando um ano à Federação Internacional de Pentatlo Moderno (UIPM) para apresentar um modelo de competição mais entusiasmante, com esgrima, tiro, natação e corrida, mas sem hipismo. É aqui que entra a luta de almofadas...
A ideia de Coubertin, que estreou o pentatlo moderno nos Jogos de Estocolmo"1912, era criar a epopeia de um soldado que tinha de entregar uma mensagem: começava por andar num cavalo que não conhecia - como o Saint Boy, que se recusou a saltar com a russa Gulnaz Gubaydullina e depois com a alemã -, travava uma luta de espadas, era encurralado e defendia-se a tiro de pistola, atravessava um rio a nadar e finalmente corria pela floresta. Há um século, sem televisão, a ideia era cativante. Com o passar dos anos tornou-se anacrónica e a modalidade, mesmo reduzindo-se de cinco a dois dias e passando a ter pistolas laser, 200 metros de natação e 3200 de corrida em corta-mato, foi perdendo audiências e, também importante, é das menos conhecidas do público jovem.
Coubertin criou o pentatlo moderno como a história de um soldado, que anda a cavalo, luta de espada, dá tiros, nada e corre
A UIPM tem 105 mil seguidores no Facebook, mas apenas 12 mil no Instagram. A modalidade era indicada, antes dos Jogos de Tóquio, como a terceira menos interessante para os americanos (que têm peso acrescido, pois a NBC paga os direitos televisivos), só superando râguebi e polo aquático. "Tem de demonstrar uma significativa redução nos custos e complexidade, melhorar na segurança, acessibilidade, universalidade, apelo aos jovens e público em geral", tinha avisado Thomas Bach, presidente do Comité Olímpico Internacional.
Tendo de retirar o hipismo das suas cinco modalidades e obrigado a um formato que garanta audiências para entrar nos Jogos de LA"2028, o pentatlo moderno estuda opções como luta de almofadas
Para Paris"2024 o formato original vai-se manter, com hipismo incluído, mas as provas serão num só dia, em eliminatórias, e terão a duração de 90 minutos. Para 2028, um grupo de trabalho de 21 elementos elencou 13 critérios a seguir. Não anunciou modalidades, mas a comissão de atletas revelou estarem oito em equação, incluindo: ciclismo (BTT ou bicicletas elétricas), corridas de obstáculos em terra e água, corridas de barreiras, corridas de patins, corridas de drones e luta de almofadas. É simples adivinhar qual das propostas gerou imediato muitas respostas, incluindo a pergunta: "Estão a brincar?". Mas a luta de almofadas, se foge a uma das exigências (estar de acordo com a narrativa de Coubertin), está de longe de ser uma brincadeira. O Pillow Fight Championship (PFC) é uma competição profissional, que se realiza em ringues de boxe ou octógonos de MMA, tendo já entrado no sistema de televisão pair-per-view. "Não é nada que dê vontade de rir. É sério, é duro e luta-se com almofadas especiais", diz Steve Williams, diretor-executivo do PFC. Provavelmente, e porque a UIPM vai ouvir propostas de federações e a portuguesa nem ouviu falar da sugestão, a batalha das almofadas nunca chegará a olímpica. Mas, e sendo o objetivo ganhar audiências, o que o levaria a ver o pentatlo olímpico: esgrima, tiro, natação, corrida ou luta de almofadas?
"Será inovador e de espírito jovem"
"O pentatlo moderno vai continuar. Se fosse intenção do COI retirá-lo, não daria a possibilidade de substituir o hipismo e acabava", acredita João Paulo de Almeida, presidente da FPPM, que não ouviu falar de hipóteses e diz que a escolha "não a sabemos". As federações vão dar sugestões e Portugal está "a discutir internamente". "Será com certeza algo inovador e dentro do espírito jovem", refere.
Não há olímpicos no pentatlo moderno desde 1996
João Paulo de Almeida, que foi médico da Missão de Portugal em sete Jogos Olímpicos, e também da FPF e do Benfica, é desde novembro passado o presidente da Federação Portuguesa de Pentatlo Moderno (FPPM), que tem 25 clubes em atividade e cerca de 1200 federados. Criada em 1949 e durante muitos anos restringida a militares, a modalidade só cresceu a partir dos anos 1980, tendo em Manuel Barroso, ex-presidente, o mais importante dos seus oito atletas olímpicos. Com muitos e bons resultados nos escalões de formação - Maria Miguéis Teixeira ganhou um ouro nos Jogos da Juventude Nanjing"2014 -, Portugal tenta há vários anos o regresso olímpico, mas sem êxito. "Temos atletas com essa possibilidade, desde que seja esse o seu desejo. Temos vários atletas bons, alguns muito bons. Como somos um desporto amador, depende da vontade deles. A federação dará todo o apoio, se manifestarem esse desejo", diz João Paulo Almeida, garantindo que praticar o pentatlo moderno tem "um investimento inicial bastante reduzido, porque damos apoio aos clubes". A modalide tem, atualmente, cinco atletas integrados no alto rendimento.