Hugo Figueira, a cumprir a primeira temporada no Handball Esch, do Luxemburgo, deu uma entrevista de vida a O JOGO, onde fala de tudo
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Hugo Figueira, natural do Montijo, já tinha jogado em Espanha (Algeciras, em 2005/06, e Aranda del Duero, em 2006/07), estando agora, aos 40 anos, com a mulher e as filhas no Luxemburgo. Diz que se tinha informado, com dois colegas e amigos, tendo recebido boas indicações, mas, mesmo assim, ficou surpreendido com a qualidade do campeonato no Luxemburgo.
Como está a correr mais uma experiência fora, tantos anos depois das primeiras?
A experiência está a ser bastante boa. Quando aceitei vir para o Luxemburgo, embora tivesse alguma informação prévia de alguns amigos que vivem aqui - um dos quais o Bruno Dias, mais conhecido por Giga, e outro o Hugo Pinto, que jogou comigo no Sporting -, não esperava encontrar uma liga tão competitiva. De facto, esta liga é-o. Há uma rivalidade muito grande entre todas as equipas, o jogo é uma autêntica batalha, no bom sentido, claro, mas no final há confraternização entre todos: árbitros, diretores, jogadores e público de ambas as equipas. No início achei estranho, pois, em Portugal, não estamos habituados a esta realidade, mas é algo espetacular. Esta visão sociocultural do desporto no norte da Europa é muito diferente da nossa. Imagine-se só o Benfica ir jogar com o FC Porto ao Dragão Arena, ou vice-versa, e no final estarem todos os envolvidos a confraternizar. Impensável...
Desta vez foi com a família, ao contrário das primeiras, não?
Quando joguei em Espanha, a Márcia [esposa] esteve comigo, mas não tínhamos filhotas ainda. Portanto, foi tudo mais fácil, porque éramos só nós os dois. Aliás, esses foram dois anos excelentes. Quando surgiu a oportunidade de vir para aqui, tivemos de pensar bem, porque, quando se tem filhos, pensa-se sempre neles em primeiro lugar. Não sabíamos se elas se iam adaptar ao país, se se iam adaptar à escola, até por a língua ser muito diferente -aqui são três línguas oficiais, luxemburguês, alemão e francês -, entre outras coisas. Mas pesados os prós e os contras, achamos que só fazia sentido eu vir se viéssemos os quatro. E tem sido excelente, as miúdas adaptaram-se muitíssimo bem à escola, o "feedback" que temos é excelente e adoram estar aqui.
Como é o andebol no Luxemburgo? Quais as principais diferenças para o andebol em Portugal?
O andebol aqui é semiprofissional, ou seja, as equipas são constituídas por cinco/seis jogadores profissionais e os restantes estudam ou trabalham, só treinando ao final do dia. Se compararmos com a atualidade do andebol português, está uns níveis abaixo dos três grandes, FC Porto, Benfica e Sporting, mas enquadra-se logo a seguir, ou seja, está ao nível de Águas Santas, Belenenses, Madeira SAD...
Como é o seu dia a dia? As suas filhas também já jogam...
O dia aqui começa bem cedo. Vou levar as minhas filhas à escola, algo que não conseguia em Portugal, treino de manhã duas vezes por semana e regresso a casa para almoçar com a família. Às 16h00 vou buscar as miúdas à escola e ao fim do dia volto a treinar. As minhas filhas, a Maria, que tem cinco anos, e a Mafalda, de dez, ambas jogam andebol aqui no clube, o Handball Esch, e adoram. Aqui, as equipas são mistas. A Maria faz parte dos sub-8 e a Mafalda dos sub-13, sendo a única menina da equipa. Adoram jogar andebol e conviver com os amigos. A Mafalda, por exemplo, gosta de ir sempre comigo para os jogos com antecedência, brincar com os outros miúdos da formação, é uma alegria. Tem sido muito bom, a vinda proporcionou-me ter muito mais tempo de qualidade com a minha família.
É uma família de andebolistas...
A Mafalda já jogava no Colégio de Gaia. Ela estudava lá e começou a jogar lá, tal como a mãe. Mas a Maria não gostava de andebol, só queria futebol. Mas, quando chegou cá, foi experimentar e adorou. Talvez porque, aqui nos sub-8, funciona um pouco diferente, eles não jogam mesmo andebol; fazem atividades lúdicas e pedagógicas, exercícios de coordenação de base orientados para o andebol, havendo um encontro por mês.
"Nunca direi não ao meu país"
Ainda conta voltar à Seleção Nacional?
Estarei sempre disponível para representar a Seleção Nacional. Se as pessoas responsáveis acharem que precisam da minha ajuda, nunca direi "não" ao meu país. Mas as redes da nossa Seleção estão bem entregues, como se viu no último Europeu.
Como viveu de fora a campanha no Europeu?
Vivi mesmo de forma muito intensa. Quando estamos fora, ainda valorizamos mais as "nossas" conquistas. Houve jogos que coincidiram com os meus treinos e só vi parte. Mas foi espetacular! Acho que ninguém acreditava que Portugal chegasse tão longe depois de ter estado tantos anos ausente de uma grande competição. O melhor resultado até então, o 7.º lugar, tinha sido há 20 anos, no campeonato da Europa de 2000, na Croácia, onde eu também estive. Depois de tantos anos ficar logo em 6.º lugar foi absolutamente espetacular. E ainda termos a possibilidade de disputar o torneio pré-olímpico é, sem dúvida, sensacional. Mas quem conhece bem esta equipa sabe que a capacidade de superação e de acreditar é gigante e, na verdade, temos jogadores incríveis.
Quando se deu esta viragem?
Acho que o clique se deu quando o FC Porto começou a ganhar a grandes equipas internacionais, e a eliminação do Magdeburgo na Taça EHF no ano passado foi o mote. Os jogadores portugueses perceberam que têm capacidade de vencer qualquer um. E depois, na Seleção, ganhamos à gigante França em Guimarães e realmente percebemos que o céu é o limite. Portugal está de parabéns!
E das equipas portuguesas nas competições europeias?
As equipas portuguesas têm feito um percurso brilhante, e isso também foi fundamental nos resultados que Seleção fez. Foram demasiados anos longe dos grandes palcos e, agora que lá chegamos, não podemos voltar a sair. Para melhorarmos, temos sempre de estar entre os melhores, e é importante que se continue a trabalhar para que nos próximos anos possamos estar nas competições internacionais, tanto a nível de clubes como de seleções. Parabéns aos clubes por todo o trabalho desenvolvido. Acredito que ainda virão muito bons resultados este ano nas competições europeias; o Benfica e o FC Porto estão ainda em prova e a dar cartas contra equipas de orçamentos