Romeno quebra o silêncio num exclusivo O JOGO, abordando pela primeira vez o regresso frustrado a Alvalade em janeiro. Os regulamentos da FIFA foram um empecilho e, pese a "imensa vontade" de "saldar dívida antiga", tomou a iniciativa e engrenou marcha-atrás: "Nunca aceitaria pôr o clube em risco."
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Oregresso a Alvalade esteve em vias de acontecer em janeiro deste ano, mas os regulamentos da FIFA impediram Marius Niculae de voltar a vestir a camisola do Sporting, de onde saíra em 2005, em fim de contrato, após quatro temporadas em que, apesar de fustigado por lesões, ganhou a simpatia dos adeptos e se tornou num dos seus preferidos. Cego pela possibilidade de retornar "a casa", na altura para ser alternativa a Van Wolfswinkel, o avançado deixou-se levar pela emoção e aceitou imediatamente contrato de ano e meio sem ligar a números. Foi quando já estava em Lisboa, e com o vínculo assinado, que recebeu uma das piores notícias da carreira: como já tinha sido utilizado por duas equipas na temporada - Dínamo de Bucareste e Vaslui -, Niculae deixaria o Sporting em risco de perder pontos se este o inscrevesse e o fizesse alinhar. Passados nove meses, o romeno abre o livro e conta tudo o que se passou por detrás do pano.
Regressar ao Sporting, confessou-o a amigos na altura, era "tudo o que mais queria". Mas o negócio falhou. Já consegue falar sobre esse episódio de janeiro sem ficar nervoso?
Estava tudo certo, eu ia assinar pelo Sporting e sentia-me feliz. Mas de repente fui informado de que havia um problema e de que a minha inscrição pelo clube poderia violar os regulamentos da FIFA. Não era absolutamente claro, havia diferentes entendimentos, mas a situação era melindrosa, comportava riscos para o clube. O que se passou foi que eu não tinha a certeza se a Supertaça que joguei pelo Dínamo de Bucareste - foi antes do início do campeonato e relacionada com a época anterior - contava para uma época ou outra; podia ser ou podia não ser. Era um risco para o Sporting e também para mim. No momento da inscrição é que a liga portuguesa disse que não podia ser inscrito por causa daquele jogo. A federação romena enviou um e-mail a dizer que eu poderia ser inscrito. Depois, o Sporting consultou a FIFA, que respondeu que não tinha a certeza. Se, mais tarde, algum clube protestasse, o Sporting podia perder todos os jogos em que eu participasse... Falei com o presidente e com a direção desportiva e combinámos que era melhor não arriscar; não era bom para o Sporting. Foi uma decisão conjunta. Nunca aceitaria pôr o Sporting em risco.
O clube alegou que tinha sido informado pelo seu advogado...
Sim, o Sporting soube da inscrição, mas eu também não sabia que era impeditivo. Se soubesse, nunca teríamos avançado tanto, nem sequer me teria deslocado a Lisboa.
Permaneceu incontactável desde então. Porquê?
Naquela altura, o Sporting pediu-me para não falar com ninguém. E eu cumpri. Para mim era como voltar a casa, à minha segunda casa. Fiquei muito em baixo. Era uma grande oportunidade, um sonho. O Sporting é um clube grande, que conheço bem e onde podia e gostava de renascer - acho que podíamos renascer em conjunto. Ganhei lá o campeonato, joguei pela última equipa que se sagrou campeã, em 2002. É uma dor que tenho. Tive muito azar no clube e queria mudar a sorte. As lesões deram cabo do meu percurso, até porque as recuperações foram demoradas. E no verão de 2005 saí. Já não podia ficar mais, estava sempre com lesões, com cirurgias... Foi duro, foi muito mau para mim.
Em abril de 2008, também numa entrevista a O JOGO, disse que tinha uma dívida por saldar com o Sporting e os seus adeptos. Com 32 anos, acha que ainda vai ser possível?
Por causa das lesões, não pude mostrar tudo o que valia. Mesmo assim, os adeptos foram espetaculares. Por isso nem negociei o contrato que me apresentaram em janeiro. Era o Sporting! Fizeram-me uma proposta e eu aceitei logo - era um contrato de ano e meio. Acho que nesta altura da minha vida já fica um pouco tarde para voltar e saldar a dívida, mas nunca se sabe. Já será muito difícil. O Sporting gosta de contratar jogadores jovens, com potencial, para depois vender. Só alguns saem dessa estratégia. Sempre disse que não dei o máximo por causa das lesões. E queria mostrar aos adeptos que sempre torceram por mim que eu podia voltar em grande e mostrar o meu verdadeiro valor. Mas agora, sinceramente, acho que são mínimas as possibilidades de um dia voltar a vestir aquela camisola.
Entretanto houve algum outro clube português a abordá-lo?
Tive uma possibilidade de voltar no verão. Falei com presidente e treinador de um clube, mas não era um dos grandes. Não se concretizou. Por respeito, não digo o nome do clube. Mas em 2006/07 estive para ir para o V. Setúbal: eu queria jogar e era uma possibilidade. Era muito importante para mim jogar, porque queria ir ao Euro'2008. Às vezes temos de dar um passo atrás para poder dar dois em frente. Acabei por ir para o Mainz e pude jogar na Bundesliga. Importante para mim é jogar, não sou daqueles que só pensam em dinheiro.
Quando foi notícia o seu possível regresso ao Sporting, Liedson, seu ex-colega em Alvalade, assinou pelo FC Porto. Via-se a jogar num rival?
Cheguei muito novo - em 2001, tinha 20 anos - e o meu coração ficou no clube. Foi uma parte importante da minha vida, ajudou-me na formação. Fiquei muito ligado ao Sporting. Vestir a camisola de um rival seria muito difícil. Vou torcer sempre pelo clube.
Na distante Ucrânia, tem acompanhado o Sporting? Sabe o que a equipa tem feito neste início de época?
Aqui é difícil ver os jogos do Sporting. Só pela internet é que vejo alguns resumos, não posso mentir. Mas é o suficiente para perceber que está muito melhor do que na época passada. Agora sim, está no bom caminho. Perderam com o FC Porto, mas julgo que vão conseguir ficar nos três primeiros e lutar mesmo pelo título.
No Sporting, recusam falar de candidatura ao título. Tem de ser este o discurso?
É uma boa política. Tiram pressão não assumindo que querem o título, mas dentro do balneário acho que pensam nisso. É natural que queriam e lutem por ser campeões. Mas fazem bem em não o assumir. Seja como for, acredito que vão ficar nos três primeiros e que poderão voltar à Champions.
Já viu o novo matador, Fredy Montero?
Pouco. Está a ser fácil fazer esquecer Van Wolfswinkel, que já era bom, marcava muitos golos e era peça importante. Montero faz golos, logo é importante. Jardel também não fazia coisas incríveis como Messi ou Ronaldo, mas de cabeça era o melhor do mundo e marcava imensos golos. Importante é ter alguém que marque golos, e os avançados são avaliados pela relação jogos/golos.