O antigo futebolista faleceu às 4h30 da madrugada de ontem, em casa, vítima de paragem cardiorrespiratória. E mal o dia rompeu, com sol tímido entre nuvens negras, milhares de pessoas acorreram ao Estádio da Luz para homenagear "o Mandela do futebol", "a alma dos benfiquistas", o "herói imortal" ou simplesmente "Portugal"
Corpo do artigo
Pai. Porque é que ele morreu esta noite?" A menina não teria mais de seis anos e, de cachecol encarnado ao pescoço, no meio de todo aquele rebuliço junto à estátua de Eusébio, no Estádio da Luz, tentava perceber esse grande mistério que é deixar, de repente, de existir. "Ele tinha mulher? E filhos?", continuava a criança, preocupada. Foi às 4h30 da madrugada de domingo, que Eusébio da Silva Ferreira, de 71 anos, faleceu, vítima de paragem cardiorrespiratória.
O antigo internacional português estava em casa, sentiu-se mal pelas 3h30 da manhã, ainda foi chamado o INEM, mas já nada foi possível fazer para mantê-lo vivo, tendo João Malheiro, antigo diretor de comunicação do Benfica e grande amigo de Eusébio, sido o primeiro, de fora da família, a ser informado, pelas 06h00, e a passar a notícia. Luís Filipe Vieira recebeu a notícia cerca das 7h00.
A última aparição pública do Pantera Negra - alcunha que lhe foi atribuída por um jornalista inglês, em alusão ao seu estilo felino a jogar - ocorrera a 18 de dezembro de 2013 no lançamento do livro do antigo companheiro António Simões e, apesar do ar cansado que aparentava, a sua morte acabou por apanhar o mundo de surpresa.
"Devia ter sido operado para meter um bypass, mas não quis", lamentava, em jeito de justificação, o Sr. Luís da Tia Matilde, empregado há 40 anos do restaurante onde Eusébio ia almoçar quase todos os dias. Ainda no dia anterior, King - outra das suas alcunhas - lá estivera, com a esposa Flora, na mesa do costume, até às 17h00, distribuindo autógrafos, posando para as fotografias e pegando nos miúdos ao colo.
"Parecia que estava a adivinhar", comentou o empregado, já amigo, da famosa adega junto ao apeadeiro do Rego, no centro de Lisboa, enquanto olhava um adepto que acabara de atar um cachecol do Sporting ao braço esquerdo do antigo jogador.
"Eusébio é de todos. Como o pai", comentara o rival do outro lado da Segunda Circular numa homenagem que, desde manhã cedo, começou a ser feita em redor da estátua que, não nem há um mês, ficou sem bola para trabalhos de restauro. Curiosamente, este monumento - que foi ontem transformado num santuário - foi mandado fazer entre 1987 e 1989 por Vítor Baptista, um benfiquista açoriano radicado nos EUA, de que Eusébio e o então presidente João Santos desconfiaram quando lhes apareceu com a ideia de uma estátua de bronze para colocar na Luz.
Os joelhos do campeão europeu pelo Benfica, em 1962, davam problemas desde os tempos de goleador e isso já não era novidade, Nos últimos anos, inclusive, começou a aparecer publicamente a andar com uma canadiana ou mesmo de cadeira de rodas. Em 2007 soou o primeiro grande alarme sobre outros problemas de saúde. Eusébio sofria de aterosclerose e tinha tendência para níveis elevados de colesterol, apresentando ainda sintomas de hipertensão. Em 2007 foi operado à artéria carótida esquerda, para prevenir um eventual AVC, mas voltou a estar hospitalizado mais quatro vezes em 2011 e 2012.
No próximo dia 25 de janeiro, o antigo goleador, nascido em Moçambique, faria 72 anos de idade, coincidentemente no mesmo dia em que, há precisamente dez anos, o Benfica viveu o grande drama da morte súbita de Miklos Fehér. A estátua do avançado húngaro, logo que se passa a porta 18, "viu" ontem a grande homenagem feita ao Rei.