Carlos Eduardo sublime. Exibição portista teve sempre um cérebro, mas marcou território com duas cabeças. Com mais um jogo superlativo do brasileiro, multiplicaram-se as soluções e até o mito de que Paulo Fonseca não tem banco foi desfeito. Ressalva importante: foi contra o Olhanense
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O epíteto assusta. Pode até soar a exagero, mas o que Carlos Eduardo fez em três jogos não pode deixar de ser sublinhado. Há um antes e um depois do brasileiro, que tem ainda uma maratona a percorrer até entrar na história do FC Porto, mas que fez o suficiente para alterar por completo a psique coletiva, cotando-se desde já como a aparição mais retumbante que os dragões viram esta época. Do nada, Carlos Eduardo desvendou uma equipa e isso é digno de um mágico. Ponto.
O FC Porto tem, agora, um cérebro. Mas ontem também teve duas cabeças, porque Mangala e Jackson confirmaram a recente apetência pelas bolas paradas (outra magia, pois claro) e marcaram um território que, em rigor, o Olhanense nunca pareceu capaz de ameaçar. Há equipas do Sindicato mais organizadas e mais entrosadas do que esta pequena Sociedade das Nações que equipa à Milan, mas que não tem a mínima categoria para um campeonato que se quer competitivo e com qualidade. Os dois golos marcados ao Benfica (recorde da época) são a exceção que não pode distorcer a obscenidade do projeto Olhanense e que o FC Porto soube castigar, assinando a sua vitória mais folgada da temporada.
E ainda que a expressão desse domínio se tenha materializado através de cantos, a verdade é que os caminhos para o golo foram múltiplos e só não saíram validados mais cedo porque Belec se revelou uma muralha. Com Carlos Eduardo a sublinhar a lei da atração que lhe entrega todo o futebol da equipa, os dragões encontraram dois métodos para criar problemas: a inteligência do brasileiro a procurar o espaço entre linhas nas costas de Pelé e Celestino; e a dinâmica dentro-fora conseguida na parceria com os laterais e os extremos, capaz de multiplicar desequilíbrios a que só o desacerto na finalização retirou expressão.
O FC Porto acabou com as experiências e saiu do laboratório. Paulo Fonseca encontrou a fórmula tão debatida com uma nuance que escapava às lucubrações de todos os ideólogos, restringindo novamente o futebol à sua essência: o jogador. Carlos Eduardo é o nome que anula as discussões sobre o sistema, o triângulo isósceles ou escaleno e a duração das palestras. O brasileiro é o interruptor que liga todas as luzes. É a referência dos ataques, o centro das decisões, o elemento surpresa, o responsável de todas as bolas paradas. À sua volta gravita agora uma equipa, que ontem só não encheu o cabaz do Olhanense devido a uma conjugação rara entre o cosmos e a inspiração de Belec.
O futebol fluiu e teve momentos de requinte, como a acrobacia de Jackson (servido por Carlos Eduardo, claro) ou o golo do brasileiro, num lance que há dez anos tinha assinatura frequente de um tal de Deco, que jogava e fazia jogar, marcava golos e conseguia assistências, inventava espaços e até de canto direto ameaçava. À escala, é basicamente isso que o ex-Estoril tem feito, faltando apenas perceber se é capaz de o prolongar no tempo (épocas a fio) e no espaço (no Dragão, contra o Olhanense, como em Alvalade e na Luz).
Para já, pegou num plantel e obrigou-o a crescer, derrubando até o mito de que Paulo Fonseca não tem banco. É que ontem viu-se Kelvin a justificar mais do que meia dúzia de minutos e Herrera a carburar, aproximando-se dos terrenos (logo, da qualidade) onde se espera que faça a diferença. Soluções que o FC Porto recolhe a reboque da excelente aparição de Carlos Eduardo, o mágico que fez aparecer uma equipa antes do algodão dos clássicos.