
Leão assustou >> As 60 mil almas no Estádio da Luz ainda duvidaram do filme, mas o Sporting não resistiu ao erro. Primeiro golo apareceu quando o Benfica já estava no limiar do ataque de nervos. Depois, foi como se nada tivesse acontecido
Corpo do artigo
Nem um Sporting assustado, nem um Benfica assustador. Por mais de meia hora, até houve um Benfica atarantado e um Sporting atarantador - com deixas para se carpir a arbitragem de João Capela por algumas semanas -, mas a equipa de Jesualdo ainda não é propriamente um neurocirurgião da tática e o erro teria de suceder. Para sorte do Benfica, apareceu aos 36 minutos, quando o nervoso miudinho pelo 0-0 e pela praga dos miúdos irrequietos ainda não produzira efeitos. O jogo morreu aí. O Sporting só tinha verdadeiras hipóteses se conseguisse fazer o Benfica duvidar de si próprio. E não esteve assim tão longe.
Quando se chegou ao intervalo, o golo de Salvio era um truque de cosmética, uma ironia cruel para trinta e cinco minutos do melhor Sporting dos últimos dois anos, pelo menos. De Benfica, nada. Jesualdo montou a equipa com cimento elástico, muito comprimida a defender, muito vertical a disparar para o ataque e muito atenta a gerar constantes linhas de passe para contornar a pressão do Benfica. Houvesse ou não ordens para preferir a direita, por estar lá o menos hostil Melgarejo, foi por ali que se jogou quase sempre e que se geraram três ferozes ataques, um deles neutralizado em falta, dentro da área, por Maxi Pereira.
Forçado Matic a correr entre o socorro a Melgarejo e as provocações de André Martins - outra peça-chave do tal jogo vertical do Sporting -, o futebol do Benfica perdia no corpo a corpo e também na lucidez. O Sporting sustentava-se na dupla Rinaudo/Dier e reposicionava-se bem, conseguindo defender com muitos (só Wolfswinkel à frente da linha da bola) e atacar, ainda assim, com bastantes. Cardozo e Lima foram, nesse período, muito bem isolados dos colegas e as alas assassinas iam sendo bem controladas com as ajudas de Capel e Bruma aos laterais. E depois veio o golo.
Autorizado a tocar na bola pela primeira vez, Cardozo desmontou num lance apenas a defesa do Sporting (36') e mostrou como, de facto, o jogo era: mau grado o aparato (e Melgarejo ou as faltas constantes de Maxi Pereira), o Benfica continuava a ter a defesa mais rigorosa e avançados superiores em quantidade, qualidade e, sobretudo, eficácia. Um remate dentro da área, um golo, obtido com alguma facilidade por Salvio à conta do latifúndio que Joãozinho providenciou na área. É que não havia Melgarejos só no Benfica.
A vantagem cancela os privilégios do Sporting, que por momentos até ameaça ruir como um castelo de cartas. Já não havia nervos a fermentar no Benfica, nem um estádio estupefacto e temeroso - e é bem melhor ter 60 mil cidadãos calados do que a puxar pelo adversário. Para Jesus, o jogo passava à etapa administrativa; para Jesualdo, era uma questão de ir tentando os possíveis num meio-termo entre o ataque declarado e a vigilância até ser hora de investir tudo. Entretanto, claro, a equipa dos miúdos teria de continuar focada nas corridas do Benfica, embora durante a primeira meia hora da segunda parte o futebol quase se ficasse pelos pontapés de canto, repartidos mas mais mecanizados e intencionais os da casa.
Na hora de mexer, Jesualdo perdeu com a lesão de Miguel Lopes uma substituição que, eventualmente, lhe poderia ter valido um avançado adicional em campo. Em qualquer caso, haveria o senão da resposta de Jesus, que poderia ter duas formas: ou defendia (trocando, por exemplo, Melgarejo por André Almeida) ou fazia o Sporting pagar pelos riscos. Escolheu a segunda via, como faria qualquer treinador acordado que dispusesse da possibilidade de conjugar, em simultâneo, Ola John, Lima, Gaitán e Salvio num contexto propício a contra-ataques.
Nem foi preciso contra-atacar, aliás: seis minutos depois, Gaitán - deslocado para o centro, de onde Jesualdo tirara Dier e deixara apenas Rinaudo - punha no assunto a mais bela pedra da noite. O Sporting, por sua vez, retirou das alterações (Schaars para o lado de André Martins no meio-campo ofensivo e Viola em vez de Capel) mais um penálti que servirá para colorir os próximos dias e a pôr à prova a lua de mel entre Bruno de Carvalho e Luís Filipe Vieira.
