Muitos dos componentes da Seleção ainda não têm pernas para 90' e os remendos usados no amigável com a Holanda apenas confirmaram utilidade razoável. Afinar o registo ofensivo é uma das ilações: perdoar como Micael, não!
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Em vez de brincar aos futebóis e entreter ou enganar o público com exibições e resultados pouco ou nada fidedignos, Portugal modificou as coordenadas de gestão e planeamento para esta fase da temporada, testando-se diante de um adversário competente e exigente, que lhe permitiu perceber o que tem de melhorar e emendar para, então com tudo afinado e sem desculpas, ir à Irlanda do Norte bater-se pela qualificação para o Mundial'2014 - e até, muito possivelmente, reentrar na discussão com a Rússia pela liderança do grupo, depois da derrota de ontem do selecionado de Fabio Capello em... Belfast. Os remendos que Paulo Bento teve de coser no principal tecido nacional, ditados por insólita maré de lesões que arrastou dos planos dois pilares do meio-campo (Moutinho e Meireles) e duas lanças afiadas na exploração dos flancos (Nani e Varela), foram também oportunidades que caíram do céu para ensaiar diferentes intérpretes. Mas o que se pode dizer, em jeito de conclusão de exame, é que não houve um dos menos habituais que se tenha destacado sobremaneira. O que se viu, em princípio de estação, foi um conjunto ainda enferrujado pelas férias, perro pela falta de pulmão, da melhor condição física, subindo de rendimento à medida que o selecionador injetou frescura (e velocistas) e o adversário foi acumulando desgaste.
Sendo adepto de plantel curto, controlado, com limites bem definidos para melhor supervisionar, gerir e regular a casa, Paulo Bento mostrou também a sua face de técnico conservador e pragmático, preferindo o seguro ao incerto. Ordenando a equipa das Quinas no "clássico" 4x3x3, avaliou Neto como parceiro de Pepe no eixo da defesa, incluiu, como se previa, os Rúbens - Amorim e Micael -, lado a lado, no desenho do meio-campo e estendeu a passadeira a Danny para romper pela direita. A prioridade foi dada àqueles que, não sendo titulares, já têm rotinas nas veias. Ousar e arriscar soluções ou alternativas menos experimentadas - como Paulo Machado e André Martins - ficava para depois, conforme o andamento ou a inclinação do duelo que fez escaldar o Algarve. Foi o que sucedeu no segundo tempo, período para o qual a formação lusitana se apresentou em desvantagem no marcador, em consequência da única ocasião em que a mecanização ofensiva da Holanda se superiorizou claramente à organização portuguesa. No lance em causa, ocorrido aos 17', houve algum demérito dos homens de Paulo Bento, que na etapa inicial estiveram meio estremunhados e, pela falta de fôlego, deram primazia à expectativa, poupando-se assim nas ações de pressão sobre o opositor de turno. Quando se despertou para a jogada, já Lens tinha endossado a bola a Strootman e já este tinha definido mentalmente que aquela investida seria fechada com um remate de pé esquerdo, forte e colocado, surpreendendo toda a gente.
As maldades e as provocações que Robben - sobretudo ele - foi semeando nas incursões pelos corredores laterais, espremendo, no 4x2x3x1 da Laranja Mecânica, a imensa capacidade técnica que o distingue na elite do futebol, tiveram um efeito perverso para a Holanda, na medida em que contribuíram para espicaçar as unidades mais temperamentais da Seleção Nacional, com João Pereira e Fábio Coentrão à cabeça. Mas houve mais: Danny e mesmo Cristiano Ronaldo sobressaíram na causa, levando Portugal a construir uma oportunidade de golo que... na Irlanda não se poderá perdoar. Rúben Micael, de tanto querer puxar a bola para junto do poste, rematou para fora a melhor chance que a equipa das Quinas forjou no primeiro tempo para pôr as redes a dançar (28').
Elevando a agressividade no miolo, Portugal criou mais problemas nas transições rápidas, mas foi aqui que se notou sobretudo a ausência de Moutinho, que é aquele jogador que, quase sem darmos por isso, aparece em todas as zonas do campo e é forte no último passe.
Outra questão que se levantava de antemão tinha o capitão da Seleção na frase: que Cristiano Ronaldo se veria no Estádio Algarve? Pelos bruás, ficou claro que milhares dos que ontem ali se deslocaram foi com o objetivo de o apreciar de perto. E O CR7 não desiludiu: esteve sempre ligado, sem amuos; e foi, a espaços no segundo tempo, utilizado a 9 - após as entradas de Pizzi e Nélson Oliveira -, assinando o golo do empate no desenvolvimento de um canto (87'). Depois de uma pré-época fértil no Real Madrid, mostrou que, a ele, as férias não fizeram mossa.