Paulo Bento surpreendeu ao alterar a ordem dos planos ensaiados, ams, fosse pela verdura dos intérpretes no 4X4X2 ou pelo conforto que a Seleção mostrou no esquema tradicional, houve pelo menos uma resposta segura.E houve também o costume: Ronaldo...
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É só certezas: Ronaldo está imparável, Fábio Coentrão voa à esquerda, João Moutinho manda no meio e Portugal só funciona em 4x3x3. Nada mau sair com estas garantias todas num teste e melhor ainda quando se consegue fazê-lo, como foi o caso, com uma barrigada de golos, colocando em segundo plano o drama dos pontas de lança. Continua a ser dramático, porque vai ser mesmo preciso encontrar um para não abalar os alicerces, mas a goleada não fez disso questão urgente. Postiga, Éder e Hugo Almeida estão lesionados - e mesmo de boa saúde geram dúvidas; Edinho deu um ar de graça ao marcar, mas acrescentou outro de desgraça, em jeito de maldição de posto, saindo a mancar. Ironia das ironias: Ronaldo acabou desviado para o meio, onde muitos o gostariam de ver, incluindo adversários, que dispensavam tê-lo a incomodar noutras áreas do terreno. Para azar de Portugal, Ronaldo há só um. Vale por dois, porque assiste e finaliza com a mesma eficácia, mas só há mesmo um.
Dizer que este ensaio teve duas partes é mais do que aquela certeza óbvia de haver o intervalo da praxe a separá-las. Na verdade, podíamos muito bem trocar a ideia de intervalo por fosso. Quatro golos ajudam a reforçar a convicção de que houve um fosso enorme a separar a primeira da segunda. Mais do que atitude, foi esquema. Paulo Bento fez o que se esperava (ensaiou o 4x3x3 e o 4x4x2), mas surpreendeu na forma como ordenou as experiências: saltou primeiro da cartola a alternativa, com Rafa a maestro e Ivan Cavaleiro a fazer dupla com Ronaldo. E correu mal, apesar da vantagem no marcador.
Está visto que há estratégias que não resultam e depois há também resultados que não dependem assim tanto de estratégias: o primeiro golo de Portugal serve de prova. Encolhida, a Seleção mostrava evidentes sinais de desentendimento e desconforto com o desenho novo quando, do nada, saiu um quase tudo perfeito. Ivan Cavaleiro, Ronaldo, Moutinho e João Pereira, com toques rápidos, fizeram a bola viajar da esquerda para a direita; a defesa dos camarões parecia um conjunto de peças de dominó a tombar à medida que a jogada avançava, até ao toque final de Ronaldo.
Um toque de classe, mas também um aviso. É muito bom poder contar com aquele talento que faz a diferença, desde que dos holofotes que lhe são apontados não resulte uma cegueira generalizada. O que Portugal fizera até esse golo e que fez depois até ao intervalo, com o o empate camaronês pelo meio, foi pouco.
Muito pouco. Paulo Bento passou ao Plano B, que na prática é o Plano A. Tirou Rafa, lançou Edinho e devolveu à equipa o conforto das coordenadas conhecidas - o 4x3x3. Não tem nada que saber: Ronaldo encostado à linha, mas com liberdade para andar onde lhe apetecer; Ivan Cavaleiro desviado para a direita; Moutinho e Meireles a armar jogo e a armar também confusão nos adversários. Meireles aproveitou uma dessas confusões, após disparate de Chedjou, e deu fôlego à estratégia com um roubo de bola seguido de remate certeiro. De tão natural, face ao domínio, foi um golo atrás do outro. Coentrão no minuto seguinte, com toque brilhante de Cavaleiro pelo meio; Edinho dez minutos depois, e já ao pé-coxinho. O resultado engordava na medida certa e Portugal dava, enfim, sinais de serenidade, permitindo, por exemplo, a William Carvalho, estreante no onze, libertar-se das amarras que o condicionaram na primeira parte, assumindo uma postura mais confiante.
Conclusão: a verdura dos intérpretes pode ajudar a explicar o fracasso do 4x4x2, mas não abala a certeza de que é em 4x3x3 que Portugal mostra identidade. E dessa certeza sobra uma dúvida para os próximos testes: terá Bento de concentrar atenções nas alternativas para as alas? Com sombras sobre a disponibilidade de Nani, a pergunta é muito simples: haverá espaço para Quaresma?
Mas, uma coisa de cada vez. Estes cinco golos permitem, pelo menos trabalhar, o próximo teste, com a Grécia, já em maio, sem a pressão das questões urgentes. Afinal de contas, com os Camarões houve boas respostas...