Antijogo castigado >> Um golo já inesperado de Kelvin, assistido por Liedson, pôs o tricampeonato no colo do FC Porto quando já parecia impossível e deixou uma só equipa invicta nas ligas europeias. O Benfica só quis, ou só pôde, defender e o risco não compensou
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Só uma expressão ocorre depois deste FC Porto-Benfica: bem feito. Jorge Jesus pensou apenas em defender os dois pontos que trazia de vantagem, planeou uma trama de antijogo que envergonharia os advogados de Isaltino Morais e a barragem furou quando já tinha completado o desarmamento da sua própria equipa. O FC Porto fica a dever a possibilidade de chegar a outro tricampeonato a um instante de raiva de João Moutinho e aos dois figurantes Kelvin e Liedson, depois de 91 minutos maioritariamente perdidos na desinspiração de James e na falta de outras soluções para desequilibrar jogos como o de ontem.
A noite precisa de ser contada começando por Jesus. Na encruzilhada em que se viu, com a Liga Europa a quatro dias de distância e alguns jogadores nas últimas, escolheu a opção de pôr a equipa a fazer descanso ativo no jogo do título. Usou Gaitán e Salvio para bloquear o meio-campo do FC Porto, quase abdicou das alas para poder empurrar para lá Moutinho e Lucho e mesmo Lima tinha o encargo de recuar para dar uma mão nesse objetivo prioritário. As bolas longas, muitas vezes diretas de Artur ou dos centrais, resolviam a maçada do ataque. As criações do Benfica, incluindo o golo fortuito que marcou, saíram quase todas de lançamentos laterais, sugerindo que o aproveitamento das migalhas fazia mesmo parte do projeto.
De costas tantas vezes voltadas para o golo, o FC Porto viu-se com uma espécie de Olhanense topo de gama para desembrulhar e sem o traquejo indispensável para lidar com as perdas de tempo e artimanhas que o Benfica (legitimamente) ia utilizando. Mesmo Vítor Pereira chegou a contribuir com dois ou três minutos para a causa quando, no final da primeira parte, se pôs a discutir com Enzo Pérez e com o árbitro. Lá dentro, James passava ao lado do jogo, Lucho perdia-se na multidão quando procurava jogar entre linhas e o Benfica não oferecia muitas abébias. Nas duas descompensações registadas antes do intervalo, uma ia dando golo (5') de Jackson e a outra, com a ajuda de Maxi Pereira, valeu o empate. A segunda parte começou aos 85'. Até aí, apenas um deserto de dificuldades para os ataques do FC Porto e os balões do Benfica em resposta, mas James - talvez em posição irregular - lá se viu na cara de Artur. Naturalmente, fez o pior, porque era noite para isso: nem esperou por Jackson para lhe estender a baliza, nem acertou na rede; só no poste. Nos seis minutos seguintes, pensou-se que o campeonato tinha acabado aí para o FC Porto.
Já tão aferrolhado quanto lhe era possível, com o central Roderick em vez de Gaitán, e Aimar no lugar de Ola John, o Benfica fez um uso quase milagroso de um par de cantos e lançamentos, que se estenderam até ao fim dos noventa minutos, para inquietação e impotência do adversário, que, apesar da necessidade absoluta, simplesmente não chegava à bola. Em fúria, Moutinho foi à direita reivindicá-la e num segundo virou o jogo. Vítor Pereira já trocara o médio Lucho pelo extremo Kelvin e o lateral Danilo dera a vaga ao desaparecido Liedson e foi neles que a recuperação de Moutinho acabou. Sem pernas para o miúdo nem para o velhote, o Benfica cedeu o flanco esquerdo e teve de chegar: já com Jackson controlado pelos centrais, Kelvin tabelou com o colega e, na área, escolheu rematar, apesar da posição difícil. Num instante, o Frankenstein de Jesus tornava-se inútil, a recuperação era impossível e o campeonato caía no colo do FC Porto. Acontece. A Jesus, acontece muito
