Ricardo Pereira e o que é um bom guarda-redes: "Perguntem ao Mourinho, Guardiola ou ao Spalletti..."
ENTREVISTA >> Figura carismática por onde tem passado, Ricardo Pereira é um treinador de guarda-redes que não deixa ninguém indiferente, marcando uma empatia fácil com quem o rodeia.
Figura carismática por onde tem passado, Ricardo Pereira é um treinador de guarda-redes que não deixa ninguém indiferente, marcando uma empatia fácil com quem o rodeia. Aos 49 anos, exerce feliz, descaradamente apaixonado, a sua tarefa no Equador, oferecendo a sua competência no crescimento do Independiente del Valle, por quem já conquistou a Taça Sul-Americana, diante do São Paulo e a Recopa frente ao Flamengo. Acabou de ser fortemente pretendido pelo Mengão mas não se deixou inebriar pela potência popular do emblema carioca.
"Os guarda-redes devem ser contratados em função de determinada forma de jogar"
- Qual é a marca de trabalho do Ricardo Pereira, se tivesse de fazer a descrição do seu guarda-redes, da conceção de guarda-redes moderno?
Em primeiro lugar é uma marca de muita dedicação, trabalho e profissionalismo nos mais pequenos detalhes. Fui guarda-redes durante quase 25 anos, mas não atingi patamares profissionais e sabia que teria dificuldade em abrir certas portas. Tive de trabalhar muito e ir abrindo janelas pequeninas para poder atingir os meus sonhos! Como treinador aprendi a ver o futebol como um jogo, que se caracteriza por alguma aleatoriedade, mas que o nosso papel é reduzi-la ao máximo. Treinando para dotar os jogadores de ferramentas táticas que permitam interpretar e moverem-se como equipa em função do que está a fazer o adversário. E isto é aplicável aos 11 jogadores! O objetivo é que todos saibam resolver os problemas que o jogo oferece de uma forma autónoma. Mesmo respeitando todas as metodologias, sou da opinião que isto não se consegue a saltar barreiras e a ziguezaguear varas ou cones, mas a treinar o nosso jogo sabendo onde nos posicionamos, em que espaços vamos depois aparecer ou que espaços vamos defender. O guarda-redes tem na minha opinião três funções principais: ser "o homem livre" e disponível (posicionamento) quando a equipa está em posse de bola, mantendo-a e eliminando linhas de pressão sempre que possível (decisão), ser um especialista no controle dos espaços existentes entre ele e a linha defensiva, isto significa interpretar e ajudar a equipa em situações de controle de profundidade, duelos de 1 contra 1 e cruzamentos, e defender a baliza em situações de remate.
- O Del Valle tem atualmente guarda-redes candidato a carreira europeia?
Não e sim. Se procuram 1,95 metros, uma personalidade rígida capaz de executar sem questionar os fundamentos táticos do exercício, que não corra riscos e como tal não cometa erros, devem procurar noutro lugar e outro tipo de perfil! Se procuram um guarda-redes "altruísta" para jogar o jogo da equipa, que permanentemente se ofereça como uma opção de passe para ajudar companheiros em dificuldades ou para assumir a construção, convidando os adversários a pressioná-lo a ele para gerar depois um homem livre, talvez possam visitar Quito e encontrar aqui algum candidato a satisfazer essas necessidades! Se vos interessa jogar com uma linha defensiva alta e que o vosso guarda-redes jogue no limite do risco, se reposicione e bascule em função da bola e do adversário que ataca as costas da linha, ou quiserem defender cruzamentos com a linha muito subida, ou queiram um guarda-redes posicionalmente agressivo no momento do passe de rotura para 1x1, talvez algum destes rapazes vos encha as medidas. E se procuram guarda-redes rápidos e com capacidade de interpretar os momentos de reduzir ou dar profundidade antes de um remate, talvez aqui também existam. Sou da opinião que à semelhança da contratação de um treinador, os guarda-redes devem ser contratados em função de uma determinada forma de jogar! Perguntem ao Mourinho, ao Guardiola, ou ao Spalletti, se preferem ter o melhor do mundo a nível defensivo, mas que seja um zero em termos ofensivos, ou vice-versa, ou se os querem equilibrados em todas as dimensões do jogo. Diariamente trabalhamos muito para que o Equador possa a curto prazo oferecer à Europa dois ou três guarda-redes de qualidade e equilibrados ofensiva e defensivamente!
Portugal deveria estar mais atento ao jogador equatoriano, à sua potência e velocidade e capacidade técnica e tática?
É difícil para mim dar essa resposta porque Portugal sempre importou com qualidade. Depois são opções em função do que viram, do que necessitam e do valor de mercado. Posso confessar que me tenho cruzado com Scouts portugueses em quase todos os nossos jogos Internacionais, nomeadamente a final da Sul Americana do ano passado e a Recopa deste ano. Inglaterra, Espanha, Bélgica, Alemanha e Turquia, entre outros, têm estado muito atentos e com excelentes resultados. A minha sugestão é....que se lhes reconhecerem qualidade e potencial suficiente arrisquem na contratação e confiem depois no vosso processo de ensino e de desenvolvimento num contexto europeu e com exigências diferentes... Asseguro que muitos deles transportam consigo uma genética impressionante...um enorme desejo de melhorar a sua vida e a da sua família... têm uma capacidade técnica assinalável e, pelo menos os que saem do Independiente, têm uma base tática que não fica atrás daquela que vão receber a posteriori.