O perfil de Gallardo, treinador do River Plate que coleciona elogios até de Guardiola
Conheça melhor o treinador que tentará derrubar o Flamengo de Jorge Jesus este sábado, na final da Taça Libertadores (20h00).
Corpo do artigo
"O que alcançou e fez Gallardo é incrível. A nível de resultados , de consistência e um ano após o outro. Vão-se embora os jogadores, mas o River mantém o seu nível. Há coisas difíceis de explicar, estão nomeados três treinadores para o melhor do ano e ele nunca está nos finalistas. Parece que só existe a Europa no mundo. Não percebo como é que Gallardo não está nomeado como um dos melhores do mundo não só este ano, mas há mais tempo." Estas palavras de Pep Guardiola dão dimensão ao que alcançou o treinador do River Plate desde que assumiu o comando da equipa há cinco anos e meio.
Este sábado vai disputar a 14.ª final, nesse lapso temporal, das quais ganhou dez e perdeu três. Está já qualificado para uma 15.ª: a Taça da Argentina que se disputa em dezembro. El Muñeco (o Boneco, como é conhecido desde os seus tempos de jogadores) vai procurar evitar que Jorge Jesus lhe roube a coroa de campeão sul-americano e levantar deste modo a Taça Libertadores pela terceira vez em cinco anos.
Qual é o segredo deste treinador que já foi referido em mais do que uma ocasião como provável sucessor de Ernesto Valverde à frente do Barcelona? Obviamente, não há uma só razão, mas um acumular de virtudes que o colocam como o técnico mais destacado da América do Sul.
11543661
Poucos imaginariam que tal fosse possível quando com o número dez nas costas comandava as equipas do River, Mónaco e PSG, porque todas as virtudes que tinha dentro de campo não se notavam no balneário. Era maís líder com a bola do que com a palavra. Mas quando passou para o outro lado da linha lateral mudou e encaixou na perfeição no seu novo papel.
A sua primeira etapa foi no Nacional de Montevideo, onde lhe ofereceram o cargo de treinador mal deixou o futebol. Aceitou o desafio e foi campeão uruguaio. Pouco depois, estava prestes a vincular-se pelo Newell"s Old Boys, de Rosario, mas nesse mesmo dia em que ia assinar o contrato recebeu um chamada que travou tudo: surpreendentemente Ramón Díaz renunciou ao cargo que ocupava no River Plate e o seu antigo colega Enzo Francescoli (diretor desportivo do clube) ligou-lhe para lhe oferecer o cargo.
Gallardo não hesitou. Pediu desculpas ao Newell"s e assinou pelo River. Estávamos em junho de 2014 e marcou diferenças desde a primeira hora apresentando-se com uma equipa técnica numerosa (incomum na Argentina): dois ajudantes de campo, dois preparadores físicos, analistas de vídeo e uma doutora em neurociências integram a equipa que o acompanha desde o primeiro dia. E o que parecia impossível de acontecer - suceder a Ramón Díaz, o treinador mais vencedor na história do River até então - para Gallardo tornou-se a grande motivação.
11545354
Hoje é o próprio Díaz quem admite: "Marcelo é o treinador mais importante na história do River." De facto, os mais fanáticos adeptos millonarios juntaram-se, fizeram uma coleta, e estão a construir-lhe uma estátua em bronze que será colocada junto à porta do estádio Monumental.
Um dos seus segredos passa pela exigência extrema. "Nos treinos joga-se com a mesma intensidade que nos jogos", repetem os jogadores do clube que terminam exaustos depois das sessões de trabalho. El Muñeco não lhes permite que relaxem e se vê que não estão a dar o máximo, as suas reprimendas escutam-se de longe. A luta interna é igualmente intensa porque se há algo que caracteriza o River de Gallardo é contar com uma formação memorável. É um treinador que aproveita os melhores momentos de cada jogador e ninguém joga pelo apelido que tem. São vários os casos de jogadores que passaram de titulares a suplentes de um dia para o outro. Enzo Pérez é um dos melhores exemplos: depois de um grande momento, regressou do Mundial da Rússia, em 2018, e foi para o banco porque tinha aparecido um miúdo da formação, Exequiel Palacios, num grande nível e que relegou o ex-Benfica para o banco, apesar da pouca experiência na I Liga.
Estas premissas respondem à voracidade competitiva que o próprio Gallardo transmite aos jogadores. Não lhes dá margem para relaxar. A demonstração está nos títulos que tem conquistado. No seu primeiro semestre ganhou a Copa Sul-Americana 2014, em 2015 conquistou a Recopa, a Copa Libertadores e a Suruga Bank. Em 2016 voltou a vencer a Recopa e a Taça da Argentina que também ganhou em 2017. Já em 2018 ganhou duas finais ao Boca Juniors: Supertaça da Argentina e Libertadores. Este ano arrancou com uma terceira Recopa e vai disputar mais duas finais.
11545275
Feitos que se valorizam ainda mais pela fuga de várias figuras, algo de que sofrem todas as equipas argentinas que não podem competir com propostas económicas que os futebolistas recebem do estrangeiro. Só um jogador, Leonardo Ponzio, hoje um suplente, se mantém no plantel desde o primeiro dia que Gallardo arrancou com o seu ciclo. Outro dos segredos do sucesso tem sido a renovação da equipa. Nunca apostou por contratações em massa, procurou sempre reforços pontuais. Se precisa de um avançado, não apresenta três nomes aos dirigentes para negociarem. Só pede um e se não chega esse prefere não contratar.
Foi assim que, por exemplo, o presidente D"Onofrio acedeu a fazer a compra mais elevada da história, pagando 13 milhões de euros para contratar Lucas Pratto, o qual, depois de um arranque frouxo, foi o goleador das históricas finais contra o Bocana última Libertadores. Na prospeção, Gallardo teve linhas bem delimitadas: adquirir jogadores experientes (Enzo Pérez, Pinola, Scocco e o próprio Pratto) ou jovens com potencial de crescimento (Gonzalo Martínez, De la Cruz, Borré são disso testemunho).
Marcelo Bielsa e Alejandro Sabella foram os dois técnicos que mais marcaram a sua carreira de futebolista na hora de formar as próprias ideias como treinador. Mesmo que, segundo Gallardo, a sua forma de jogar foi a que mais o influenciou. "A minha maior influência é forma de como senti o jogo. Passe, controlo, apoio, opções e ajudar os jogadores a pensar, que vejam as coisas antes e que resolvam da melhor forma possível com antecipação, num futebol tão rápido e com fricção. O mais difícil é pensar rápido, por isso procuramos simular situações reais de jogo", explicou no seu livro "Gallardo Monumental".
11539706
Há outras influências em el Muñeco: a posse de bola do Barcelona de Guardiola e a pressão do Milan de Arrigo Sacchi. Segurar a bola, pressão no ataque e superioridade numérica são as três bases da proposta de este treinador que faz história na Argentina.
Apesar de ter contrato com o River até 2021, na Argentina pede-se que dirija a seleção alviceleste. De França já recebeu várias propostas que tem vindo a recusar, mas já disse aos membros da sua equipa técnica para aprenderem francês. Em Barcelona é cada vez mais falado o seu nome.
"Querem saber de futebol? Abram a cabeça de Gallardo e vão encontrar uma enciclopédia de futebol", sentenciou Sabella, o treinador que levou a Argentina à final do Mundial em 2014 no Brasil. Será assim que Gallardo irá tentar derrubar o Flamengo de Jorge Jesus nesta final da Libertadores.