A Argentina fervilha com a aproximação da final da Taça dos Libertadores. Na semana que antecede a primeira mão (dia 10), os presidentes do Boca Juniores e do River Plate dão exemplos de como deve ser uma rivalidade histórica no futebol. Estão em sintonia e ambos querem manter os jogos sem adeptos visitantes, ao contrário do Chefe de Estado argentino. E as máquinas de comunicação dos dois emblemas apelam em conjunto ao civismo e contra a violência.
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O próximo superclássico argentino Boca Juniores-River Plate, que se disputará a duas mãos, na final da Taça Libertadores, competição que dita o campeão sul-americano (próximos dias 10 e 24) é o tema forte naquele continente.
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Com a exceção dos brasileiros - que viram Grémio e Palmeiras afastados do título nas meias-finais -, o "jogo do século" é assunto de primeira página abaixo do Equador. Claro que o século só tem 18 anos, mas o "marketerismo" permite associar o conceito aos últimos 100 anos e não propriamente ao século em curso.
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Para já, e a seis dias do confronto, temos dois momentos de sintonia entre os presidentes dos dois emblemas. O que, por si só, já é um enorme exemplo para o resto do mundo: o relançamento da campanha #RivalesNoEnemigos e o discurso em uníssono contra a possibilidade de haver adeptos visitantes em cada um dos dois jogos, no Bombonera e no Monumental.
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Ambos os casos se enquadram em políticas de segurança, infelizmente necessárias na Argentina, e entre dois emblemas cujos adeptos aproveitam a rivalidade para "destilar" alguma pobreza de espírito, característica indissociável da violência no futebol.
Aliás, na sexta-feira passada foi noticiado um homicídio relacionado com a rivalidade mortal entre ambos. Segundo relatos da imprensa local, a vítima vestia as cores do Boca e terá sido espancado por essa razão. Especulação ou não, o caso aconteceu no dia em que o Boca eliminou o Palmeiras. E até motivou uma aparição do presidente do River Plate, Rodolfo D'Onofrio, a fazer um discurso de paz, agarrado a um adepto do Boca, conforme pode ver na imagem seguinte.
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Por essa e por muitas outras razões, #RivalesNoEnemigos é uma campanha nas redes sociais implementada pelas duas direções, que teve um primeiro momento em março deste ano, antecedendo a disputa da supertaça argentina, disputada entre as duas equipas.
As máquinas de comunicação de ambos os clubes voltaram, por estes dias, a insistir na hashtag e basta inscrevê-la nos motores de busca para se encherem os ecrãs com apelos diversificados. Um exemplo, sublinhe-se, que nem encontra muito paralelo em paragens mais próximas...
Curiosamente, essa busca na internet levou-nos a uma publicação bem mais antiga, no Facebook de Carles Puyol, glória do Barcelona, que usou a mesma expressão e uma fotografia de si próprio com Raúl, do Real Madrid, em antecipação ao clássico espanhol.
https://www.facebook.com/puyol5carles/photos/a.173250829420264/952742594804413/?type=3
Talvez inspirados pela mesma foto, os argentinos Paredes (ex-Boca) e Driussi (ex-River), hoje companheiros nos russos do Zenit, fizeram o mesmo apelo nas redes sociais, com uma foto que se está a tornar viral.
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A parte mais polémica da grande final está a manter, por incrível que pareça, os dois presidentes, Daniel Angelici (Boca Juniores) e Rodolfo D'Onofrio (River Plate), do mesmo lado da barricada, desta vez contra o presidente da Argentina, Mauricio Macri.
O Chefe de Estado está, há dias, a tentar agilizar a possibilidade de haver adeptos visitantes nos dois jogos, mas a medida de "torcida única", vigente em muitos dos principais palcos sul-americanos, é algo que os líderes dos dois emblemas pretendem manter nos próximos dois fins de semana.
Recordamos que Macri, na sexta-feira, fez um tweet, onde afirmava: "O que nós argentinos vamos viver é uma final histórica. É também uma oportunidade de demonstrar maturidade e que estamos a mudar, que se pode jogar em paz. Pedi à ministra da Segurança que trabalhe com as autoridades da Cidade [Buenos Aires] para que o público visitante possa ir aos jogos".
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Ora bem, os presidentes do River e do Boca não estão muito convencidos com essa possibilidade e contrariaram hoje a vontade de Mauricio Macri. Por eles, na Bombonera só estarão adeptos do Boca e no Monumental apenas os do River. E, pasme-se!, deram uma entrevista conjunta (ver excerto abaixo).
Rodolfo D'Onofrio deixou no ar, no programa "Debo Decir", do canal America, tratar-se de uma mensagem com intenção popularista, ao questionar: "Porquê isto?". E referiu não ter sido contactado por ninguém da presidência argentina para ponderar o assunto.
Já Daniel Angelici referiu que, "se ele é apaixonado por futebol, sabe que a decisão é dos clubes", recordando que Macri foi o "melhor presidente do Boca durante 12 anos". A este propósito, é importante dizer ao leitor que há eleições presidenciais na Argentina em 2019.
As autoridades da cidade estão menos permissivas e já anunciaram que nem sequer estão dispostas a que os festejos dos vencedores se faça no Obelisco, na praça maior de Buenos Aires, monumento que celebra o quarto centenário da fundação da cidade.
Uma derradeira nota: River e Boca também anunciaram solicitar à CONMEBOL a possibilidade de ambas as partidas se jogaram em dois domingos e não em dois sábado, de modo a contarem com os seus adeptos das comunidades judias no país.