"Vínhamos todos com o sonho do FC Porto, ele também... Era o mais ambicioso"
Kevin Serna, o estilo Messi e o sonho dos dragões na chegada a Portugal
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Farid Romero, defesa-central de 25 anos, é um dos jovens da Benpor que teve Malta como destino após o Serzedo. Hoje ainda lá joga no Gzira. A chegada de Kevin Serna ao Rio de Janeiro para vestir uma camisola tão histórica como a do Fluminense é enaltecida pelo amigo feito ainda em território colombiano.
“Tínhamos 19 anos e estávamos na academia de Yober Candelo. Daí viemos para Portugal. Era uma escola onde Serna já era chamado de Messi pela qualidade de driblar com muita facilidade. Em Portugal adaptou-se a um futebol mais direto e também se acomodou a este estilo porque tirava muito partido da sua velocidade”, atesta Farid, nada pasmado com os feitos do velho companheiro.
“Não me surpreende nada o que conseguiu. Ele era muito completo, por alguma razão todos o chamavam de Messi. Sabia perfeitamente que ele devia chegar longe, porque além do talento puro era muito focado e disciplinado”, garante o central de 25 anos, perentório quanto à estrela que cintilava no Perafita e Serzedo.
“De todos os que viajaram para Portugal nesse projeto, ele era o mais ambicioso, apontava sempre a jogar a Primeira Liga. Vínhamos todos com o sonho do FC Porto, ele também... Em cada treino dizia que o momento ia chegar. Nos jogos zangava-se sempre que não lhe dávamos a bola, pois sentia que podia resolver”, recorda.
"Diziam que estava a jogar no Distrital"
Edgar Ramos treinou Kevin Serna em 2018/19 na Divisão de Honra da AF Porto. O talento de 20 anos impressionava facilmente. Já havia começado a época no Perafita com bons apontamentos, golos de belo efeito e livres irrepreensíveis. “Era muito forte no um para um, muito rápido com e sem bola, tinha muita qualidade na finalização e a bater as bolas paradas”, resume, certificando a otimização de recursos que foi acontecendo no colombiano de 20 anos. “Notava-se que estava a jogar num nível muito abaixo para as capacidades que tinha, a qualidade distanciava-o. Quando chegou ao Serzedo os jogadores que faziam parte do plantel diziam que ele parecia um extraterrestre”, lembra, ainda com imagem precisa da essência que Serna revelava.
Edgar Ramos treinou Serna no Serzedo e lembra que os colegas até o achavam um extraterrestre. Já clubes de patamares superiores desconfiavam, por regra, das muitas recomendações feitas.
“Chegou como menino de 20 anos, muito introvertido fora do campo, mas completamente desinibido dentro dele. Ele sabia o que queria, que era ser jogador profissional de futebol. E para isso era muito focado nos treinos e jogos”, documenta Edgar, maravilhado com o presente e futuro que tocou subitamente Serna, chamado a vestir a camisola do atual detentor da Copa América. “Foi um privilégio e orgulho tê-lo treinado e fazer parte do seu processo de crescimento. Treinar um jogador com esta qualidade e que chega, agora, ao campeão da América do Sul. Merece esta oportunidade, por todos os sacrifícios que fez para chegar a este patamar”, opina, recuperando a luta travada por dar um espaço de afirmação diferente ao jogador, em Portugal.
Antigo treinador ficou estupefacto pela indiferença em Portugal, ciente que o talento atingiu destino à sua imagem
“Poucos são os clubes que olham e se interessam pelos jogadores que estão no distrital. Existem imensos jogadores pelos diversos campeonatos distritais em Portugal, que têm muita qualidade. Faltam as oportunidades que deveriam ter. Temos o exemplo do Jota. Tenho pena do Serna não ter tido essa oportunidade, falei com alguns treinadores de campeonatos profissionais, mas diziam ‘oh está no distrital...’”, desabafa Edgar, desejando “toda a sorte do mundo a quem nunca perdeu humildade e profissionalismo”.
"Chorou ao não ir para Malta"
Perafita e Serzedo fizeram parte do caminho do novo homem forte do ataque do Fluminense, juntando-se a um elenco onde pontificam Thiago Silva, Marcelo ou Ganso, mas percebeu-se que Portugal não o iria estimular a outro nível. Bousquet começou a namorar outros destinos para dar saída e visibilidade ao talento que trouxera sem grande escola da pátria cafetera.
Bousquet sugeriu que Serna não desse o passo dado por colegas da academia. Hoje pode sorrir
“Assumimos a iniciativa de sondar, porque o jogador já revelava estar bem preparado pelas sessões profissionais que fazia, mais os amigáveis, estava no ponto! Surgiu uma possibilidade por Malta, mas fomos atrás de outro tipo de clube parceiro. Foi assim que se fez a rota do Sportivo Luqueño, que vivia período de fragilidade económica. Os primeiros passos de verdade são dados por Serna no Paraguai, acabando por partir pouco depois para o Perú”, evidencia, confidenciando outras particularidades que poderiam impactar hoje num trajeto menos luminoso.
Sportivo Luqueño veio a revelar-se melhor opção do que futebol maltês
“Mandei cinco jogadores para Malta, ele chorou por não ir e ficou uma semana chateado”
“Eu mandei cinco jogadores da nossa academia em Portugal para Malta, para o Santa Lúcia. Serna estava entre eles, comuniquei-lhe essa possibilidade mas que achava um nível muito baixo para ele. Garanti-lhe que teria outras possibilidades. Ele mal compreendeu, chorou, ficou zangado uma semana. Se eu tivesse aprovado essa ida, hoje não teria a oportunidade de fazer parte da história do Fluminense”, atira, expressando o seu reconhecimento ao instinto de superação do atleta:
“É um jogador muito profissional. Olho para o que jogava no Serzedo e é exatamente o mesmo espírito com que jogava no Alianza. Será assim no Fluminense. Não se importa das condições, dos horários que enfrenta. Ele fazia comida antes de ir dormir depois de chegar muito tarde a casa. Nunca se desculpou para faltar. Tem talento, qualidade e uma vontade de superar todos os obstáculos. E nem todos estão dispostos a isso!”