"Um jogador como eu, que deu tanto, saiu sem receber. Deviam fazer a tal estátua"
Mostovoi, que também passou pelo Benfica, lembra tempos áureos em Vigo, estatuto de rei mas saída apressada. Não se encolhe no que significou e brinca ao recordar as vezes que não o deixavam pagar
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Omnipresente, foi em Vigo um Deus anterior a Aspas, desfilou uma classe rebelde e indomável, firme como estrela e líder de uma equipa que não se cansava de sonhar
Em Vigo o Zar ainda é lenda. Foram impagáveis os tempos do “Euro” Celta?
—O primeiro ano foi bastante complicado, muitas coisas aconteceram que não compreendi. Era um Celta que estava bastante mal. Depois com El Zar começou a subir e os melhores anos do Celta chegaram. Estava rodeado de grandes jogadores como Mazinho, Makelelé, Karpin, Revivo, Cáceres, Michel Salgado, Juan Sanchez e também Jorge Cadete...
Um Celta de prestígio e gabarito...
—Naquele tempo, em futebol jogado, estava entre as quatro ou cinco melhores equipas da Europa. Fazíamos imensos jogos contra o Real e Barcelona e ganhávamos várias vezes. E não era só ganhar, era como ganhávamos, por vezes, de goleada. Havia espetáculo.
E todos se entendiam às mil maravilhas, espanhóis com brasileiros ou russos com argentinos?
—Era uma grande família, eu era o capitão. Mas faltou-nos ganhar um título que fosse. Estivemos sempre perto, com uma final da Taça, umas meias-finais na Europa, presenças na Champions. Eu estava bem com argentinos e brasileiros, gostava de todos, tinha uma mente aberta. Se jogas bem, se a equipa joga bem, gostas de tudo. Só no último ano do Celta começaram os problemas, deixei a equipa e a cidade.
Mas, é, sobretudo, glorificado de forma superlativa. Como lembra esse culto, é verdade que adeptos lhe pagavam a gasolina?
—Saí de Vigo como não devia ter sido. Um jogador como eu, que deu tanto, saiu sem receber. Deviam fazer a tal estátua e pagar o que ficou por pagar, mas hoje são outras pessoas, nada a ver. Antes disso um trato incrível com toda a gente, os adeptos estavam comigo a toda a hora. Dois ou três restaurantes não me cobravam e não me deixavam pagar, por esse papel de ídolo na cidade.
E era um craque com aura dominante, que sentia que não devia nada a ninguém?
—Antes de estar em Vigo tinha 10 anos de futebol. Sempre me senti craque onde joguei. A vida de um futebolista é assim, deves andar tranquilo e bem contigo próprio. Sempre fui um dos melhores onde jogasse, o melhor em Estrasburgo, o melhor em Vigo. Tinha que me assumir importante dentro do clube e da cidade. Mas, para isso funcionar, tinha de jogar bem e fazia-o. Não era só pelas vitórias fáceis, era quando pegavas na bola e decidias um jogo.