Rúben Neves deixou o conforto de quem vivia num apartamento de luxo na primeira linha das praias de Vila Nova de Gaia por uma cidade industrial como Wolverhampton; trocou ainda o FC Porto, o clube do coração, para jogar na II liga inglesa. A grande época que realizou, coroada com a subida à Premier League e o título de campeão, prova que ganhou a aposta.
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A época que fez no Wolverhampton superou as suas expectativas?
-Quando assinei pelo Wolverhampton, tinha boas expectativas, porque gostei do projeto do clube, mas nunca pensei que iríamos conquistar o campeonato no primeiro ano. Claro que o nosso objetivo desde o início era a subida, mas fizemos um campeonato excelente e fomos campeões a faltar duas jornadas para o final da prova. Isto num campeonato que normalmente é muito competitivo.
O que sabia do clube e da própria cidade?
-Já tinha uma ideia, porque tinha alguns amigos a jogar lá, entre os quais o Hélder Costa e o Ivan Cavaleiro. Mas muito sinceramente fui para lá para ter minutos de jogo e fui à procura de evoluir como jogador. Apareceu a oportunidade de jogar num campeonato como o Championship e nem pensei duas vezes, porque sabia que, tendo minutos num campeonato desta dimensão, iria evoluir muito como jogador. Agora, sinto que já sou um jogador diferente.
Estava no FC Porto e às portas da Seleção. Não foi um choque quando soube que ia para a II divisão?
-Sinceramente não, porque só tinha de pensar no meu futuro e em mostrar o meu futebol. Entendi que era uma oportunidade de crescer.
Sentia que era difícil jogar no FC Porto?
-Depois de um ano difícil, em que tive poucos minutos no FC Porto, o meu objetivo era jogar mais. Vi no Wolverhampton uma excelente oportunidade para jogar e para ganhar mais experiência no futebol, porque, quer queiramos quer não, uma II divisão inglesa não tem muito a ver com a I Liga portuguesa por muitos fatores, um dos quais o dinheiro. Além disso, iria jogar sempre perante milhares de espectadores. O nosso estádio leva 31 mil pessoas e, esta época, no campeonato nunca tivemos menos de 26 mil espectadores. Jogávamos ao sábado e à terça-feira e mesmo nestes jogos durante a semana estavam sempre 28 ou 29 mil pessoas.
Como foi trabalhar com Nuno Espírito Santo?
-Foi excelente. Ajudou-me imenso, porque já me conhecia, além de que facilitou muito o facto de ser português. Fez um excelente trabalho. Construiu uma equipa sólida, que joga futebol e que mudou um pouco a estratégia do futebol inglês, porque somos uma equipa que procura jogar. O míster impôs as suas ideias logo no primeiro ano, o que é excelente, porque não jogámos o futebol tradicional inglês que é mais de segundas bolas e um jogo físico. Mas muitas das equipas ainda têm o estilo inglês, o que é normal, porque faz parte da tradição e os adeptos gostam disso. Para mudar esse estilo, também é preciso que os adeptos apoiem e acreditem que é a melhor maneira de chegar às vitórias. Nesse aspeto tivemos sorte, porque os nossos adeptos sempre acreditaram e sempre nos apoiaram. Acreditaram no nosso estilo de jogo, mesmo quando passávamos muito tempo com a bola atrás e eles não estão muito habituados a isso. Se fizermos quatro passes na defesa, os adeptos querem é a bola na frente. Nesse aspeto acreditaram em nós e isso ajudou-nos bastante.
A nível de adaptação à cidade e ao país, foi um choque muito grande?
-As tradições deles são muito diferentes e trata-se de um país muito diferente do nosso. É tudo ao contrário, a começar pela condução, mas até nesse aspeto adaptei-me bem, porque levei o meu carro português. Tal como acontecia em Portugal, vivemos numa zona calma. Não tem muito para fazer e quando queremos passear temos cidades próximas. É um bom sítio para viver.
Em Inglaterra teve a companhia da esposa e da filha. Isso contribuiu para essa adaptação?
-Claro que sim. Sem elas teria sido tudo diferente. Ter lá a Débora [esposa] e a Margarida [a filha] foi fundamental. Acredito até que seja mais difícil para elas do que para mim, porque passam mais tempo sozinhas em casa, devido aos treinos e aos estágios. Sem elas não teria este sucesso.