"Por que precisamos de um treinador estrangeiro quando os portugueses são dos mais cotados?"

Roberto Martínez
Getty Images via AFP
Roberto Martínez, selecionador de Portugal, deu uma entrevista ao jornal espanhol Marca, que foi publicada esta terça-feira
Quando chegou à Seleção de Portugal disse que compreendia que um treinador estrangeiro pudesse ser mal visto pelas pessoas. Como se sente em relação a isso? "É curioso. Só houve dois treinadores estrangeiros e ambos eram de língua portuguesa, brasileiros, mas sempre me senti muito bem recebido, com muito carinho. Não só como treinador. No dia a dia, com a minha família, sentimo-nos em casa. Compreendia que pudessem existir dúvidas: por que precisamos de um treinador estrangeiro quando os portugueses são dos mais cotados? Por isso, a minha proposta foi aprender a língua o mais rapidamente possível. Se eu fosse adepto, gostaria que o treinador falasse português."
Balanço dos três anos na Seleção portuguesa: "É uma boa reflexão. Gosto de trabalhar sempre com a ideia de tomar decisões válidas para os próximos 20 anos. É uma responsabilidade que temos. Jogámos 36 jogos e conseguimos um equilíbrio muito bom e uma grande consistência. Ao nível das seleções, tens três dias para preparar um jogo. Não faz sentido mudar os 23 jogadores em cada lista porque se perdem os conceitos. Mantivemos o compromisso de jogadores com muita experiência que adoram estar na seleção: Bruno Fernandes, Bernardo Silva, Rúben Neves, Rúben Dias, Cristiano Ronaldo... Além disso, conseguimos abrir caminho para novos talentos que chegaram para ganhar jogos: Vitinha, João Neves, Chico Conceição, Pedro Neto, Renato Veiga... O futebol de formação em Portugal é incrível e constitui um exemplo para outros países. Eu gosto sempre de destacar isso. Com 11 milhões de habitantes, consegue todos os anos ter 3/4 jogadores de altíssimo nível."
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Sobre o sorteio do Mundial'2026: "Aprendi que os sorteios devem deixar-nos com respeito pelo adversário... mas sem emoção. As equipas que chegam ao Mundial não são as que realmente disputam o torneio, elas vão-se formando. O que nos deixou muito satisfeitos é o que nos permite em termos de preparação. Ao jogar o primeiro jogo a 17 de junho, podemos ajustar muito bem os tempos desde a final da Liga dos Campeões (30 de maio) para trabalhar o jogador de uma forma mais individual."
Sobre o Mundial com 48 seleções? "Eu adoro. O Mundial é para todos e os adeptos e jogadores devem ter a opção de chegar ao Mundial mais facilmente. O que não gosto é do formato. Há muitos jogos e todos eles devem ter importância. Por isso, gostaria que os líderes dos grupos, como acontece na Champions, avançassem automaticamente uma ronda. Assim, evitaríamos situações em que o terceiro jogo da fase de grupos se torna uma oportunidade para ver onde o caminho é mais apetecível em termos de logística ou adversários. Acho que isso não condiz com o espírito do futebol, que seria ganhar todos os jogos."
É o momento de Portugal ganhar um Mundial? "É aqui que se vê a diferença entre ser favorito e candidato. Acho que só aqueles que já ganharam um Mundial podem ser favoritos. A nível psicológico, saber que uma geração anterior ganhou esse torneio dá uma força especial, mas, mesmo assim, tenho uma confiança incrível neste grupo de jogadores pela forma como vivem a seleção. A referência de Eusébio, que terminou em terceiro lugar no Mundial de 1966, é a coisa mais bonita que eles podem ter. É um estímulo e o grupo está preparado para um desafio como esse, embora saibamos da dificuldade que isso implica."
Quem são os favoritos? "Aqueles que já sabem o que é ganhar um Mundial e chegam num bom momento. Agora, posso dizer que vejo seleções que chegam muito bem, como a Espanha. A Alemanha também chega preparada pelo que aconteceu em casa na Liga das Nações... Além disso, é a única seleção europeia que ganhou um Mundial na América (Brasil'2014). A França, na minha opinião, é feita para grandes torneios e também, por proximidade, o Brasil e a Argentina."
Assinaria uma final do Mundial contra a Espanha? "Jogar oito partidas seria um sucesso. Todas as seleções europeias têm uma desvantagem maior e não se fala muito sobre isso: três países, adaptar-nos à logística, à altitude, ao clima... Viemos de um Mundial (Catar'2022) que foi o oposto: mesmo local de concentração, jogado no meio da temporada... Adoraria jogar uma final. A nível emocional, temos de respeitar muito as nossas origens, mas a nível profissional, o trabalho está sempre centrado no que podemos alcançar. Se pudermos disputar outra final, como fizemos nas Nações, seria fantástico. Sabemos que a Espanha vai chegar longe e jogar uma final seria uma prova de um trabalho muito bem feito."

