Depois de surpreender internamente, o Brest espanta a Europa, já com duas vitórias na Champions. Este conjunto de uma cidade portuária da Bretanha alcançou um inédito terceiro lugar na Ligue 1 com um investimento de... 3,5 milhões de euros. É o quinto clube com menor massa salarial.
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Espantou França em 2023/24 e está a espantar toda a Europa na temporada em curso. Na sua estreia nas competições europeias, depois do inédito terceiro lugar na Ligue 1 (nunca havia ido além do oitavo), o Brest é um dos líderes da renovada Liga dos Campeões, com seis pontos “roubados” em duas jornadas, fazendo jus à alcunha (Piratas) e deixando água na boca para a ronda três, na qual recebe o Bayer Leverkusen - outra das equipas só com vitórias até ao momento.
A façanha deste emblema de uma cidade portuária da Bretanha, com 140 mil habitantes e que se autointitula diferente (e até algo ostracizada) do resto de França, ganha ainda mais relevo quando analisada em função de valores - salariais e de gastos no mercado de transferências. O Brest é o quinto clube com média salarial mais baixa na Ligue 1 e um dos que menos gastou nas duas últimas temporadas: apenas 3,5 milhões de euros na época passada e 12,2 milhões na atual.
A ascensão do emblema da Bretanha, que no fim dos anos 90 teve de recomeçar da quarta divisão após derrocada a nível financeiro, deve-se em grande parte a Denis Le Saint, empresário do ramo da alimentação que assumiu a presidência do clube em 2016. A gestão, todavia, é feita de forma muito familiar e sem o apoio de consórcios estrangeiros, em claro contraste com a esmagadora maioria dos opositores, tanto em França como na Europa - onde, ainda assim, vai dando cartas contra todas as previsões.
Ganhar milhões a gastar tostões
O segredo do sucesso assenta principalmente em dois fatores: a estabilidade e a familiaridade, preservada pelo diretor-desportivo Grégory Lorenzi, que acabou a carreira no Brest em 2015/16, com apenas 32 anos, para abraçar o desafio lançado pelo presidente, e que no segundo terço de 2022/23 teve a coragem de apostar num treinador que não desempenhava a função há dez anos. Éric Roy, com currículo acima de tudo como diretor desportivo e comentador, bebeu a cultura do clube e da cidade e levou a água ao seu moinho, conseguindo terminar a temporada no 14.º lugar, que é como quem diz, a salvo da descida.
Para 2023/24, o Brest só gastou dinheiro em dois jogadores… que já tinham feito parte do plantel na época anterior, por empréstimo, valendo-se de cedências ou de contratações a custo zero para compor uma equipa que já dominava as rotinas e os hábitos do clube. Terminou em terceiro, com a terceira melhor defesa (34 golos sofridos) e registando uma série inédita de 11 jogos sem perder. Nesta época, a grande contratação foi a de Mama Baldé (antigo avançado de Sporting e Aves), comprado ao Olympique de Lyon por 4,5 milhões de euros e que até tem sido suplente.
Heriberto abriu a porta lusa
As conexões do Brest com Portugal não são profundas, mas existem. Tudo começou com Heriberto Tavares: o extremo luso, hoje em Israel (Maccabi Netanya), transferiu-se no verão de 2020 para o conjunto bretão, que pagou 1,1 milhões de euros ao Benfica. Acabaria por fazer apenas quatro jogos até janeiro, quando foi emprestado ao Famalicão… para não mais voltar. Em 2022/23, Mathias Pereira-Lage foi contratado após terminar a ligação ao Angers, com Slimani a chegar no mesmo mercado, finda nova passagem pelo Sporting.
Viveiro cheio de história
Nos anos 80 e 90, vários jogadores que mais tarde se tornariam nomes grandes do futebol francês passaram pelo Brest. Paul Le Guen acabou a formação no clube e ali se lançou como profissional, tal como Guivarc’h, campeão do mundo em 1998, enquanto Ginola e Lama saíram dali para o PSG. Já Ribéry saltou para o Metz após ajudar na subida do Brest à Ligue 2 em 2003/04.
Estádio não passou no crivo
A primeira vitória de sempre do Brest na Liga dos Campeões foi alcançada em casa... mas não na sua. O estádio do emblema bretão, o Francis-Le Blé, com capacidade para 15 mil espetadores, não possui as condições exigidas pela UEFA, pelo que o clube joga no Estádio de Roudourou, em Guingamp, estando em curso a construção de um novo recinto, com inauguração prevista para 2027.