"Perguntaram se queria dar este passo com 16 anos. Respondi a Wenger: vamos a isso"
ENTREVISTA, PARTE II >> Rui Fonte: do técnico francês aos treinos com Henry, a vida londrina desbravada a partir dos 16 anos, ainda sozinho, antes de jogar com 19 ao lado do irmão José Fonte no Crystal Palace
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Rui Fonte discorre sobre etapas marcantes, treinadores inspiradores e um irmão pilar em quase tudo, não esquecendo uma avó inexcedível nas aventuras lá fora.
Desde a saída com 16 anos para um Arsenal de topo, Rui Fonte foi um homem de golos e descobertas. Puxa a fita da harmonia com o irmão no Crystal Palace e Lille, e as diferenças de cada momento.
Como resume o que viveu fora do país, o que mais capitalizou?
— A primeira saída levou-me muito novo para um clube enorme, o Arsenal. Fui sozinho, numa decisão difícil para os meus pais. Mas sentiram a minha firmeza e convicção. Tive que me adaptar e passei por uma família de acolhimento. Vivi muitas coisas, olhando para Wenger e os craques que lá estavam. Treinei três ou quatro vezes com Henry e consegui concretizar o sonho de jogar pela primeira equipa na Taça diante do Wigan. Os 15 minutos foram um luxo, até rematei à baliza! Já júnior fui emprestado ao Crystal Palace e passei a lidar com futebol muito físico. Estava com jogadores duros, formei-me como homem e dei conta, mais tarde, do privilégio que foi representar o Arsenal. Em Espanha foi muito bom, assumi o risco de jogar na equipa B, não podia esperar que as coisas acontecessem. Tive a sorte do treinador da equipa A, o Pochettino, ter acreditado muito em mim. França surgiu numa fase mais madura e voltei a estar com o meu irmão. Éramos os dois homens, foi algo do 8 para 80, conseguimos desfrutar de jogar juntos, em Inglaterra havia uma preocupação mútua que nos desfocava. Foi uma experiência espetacular que culminou no segundo lugar e apuramento para a Champions. Foi quase equivalente a ser campeão.
Assinar pelo Arsenal com 16 anos não provocou calafrios?
— O Bergkamp tinha saído, era um ídolo da juventude, que marcara todos pela sua classe. Dois anos antes tinham conquistado o campeonato com o rótulo dos 'Invencíveis'. Nem sabia quanto ia ganhar para o Arsenal, até porque só passei a ganhar quando completei 17 anos e assinei contrato profissional. Quis jogar pelo Arsenal, foi uma resposta determinada que dei, após conhecer as instalações, a cidade, as pessoas. Perguntaram se queria dar este passo com 16 anos. Respondi a Wenger: vamos a isso. Foi indescritível essa sensação pelo passado, então recente, do clube.
A experiência de jogar ao lado de um irmão mais velho também ajudou na maturação?
— Ele sempre foi um exemplo desde cedo pela determinação, querer e nunca desistir. Teria sido o mais normal para o seu trajeto. Mas ele sempre acreditou, ouviu os nossos pais em relação ao que era necessário para fazer carreira. Foi importante para mim jogar com ele cedo, porque já se havia consolidado no Palace. Foi uma grande ajuda, tinha a noção do que eu devia fazer para ajudar a equipa. Tive uma integração muito mais fácil.
E então mereceram que essa experiência tivesse o apoio da avó?
—A nossa avó materna quis estar connosco em Inglaterra. Recebíamos as visitas dos pais e namoradas. Durante um período, eu e o meu irmão vivemos com a nossa avó, que queria cuidar um pouco da nossa vida com uns cozinhados. Para mim e o José foi o reviver da infância, partilhando a vida familiar e o futebol. A minha avó também me acompanhou uns meses quando fui jogar para o Espanhol.
O Rui e o José podem um dia estar juntos numa equipa técnica?
— Impossível não é, porque ele também tem essa vontade de ser treinador. Está numa dúvida igual à minha, se deve seguir por um período de reflexão. Sempre falamos de questões técnicas e outras mais superficiais.