Em 2003, aos 18 anos, Cristiano Ronaldo levantou em Toulon a sua primeira taça pela Seleção. Dois anos depois, também com 18, foi num Mundial sub-20 que Messi venceu o seu primeiro grande troféu individual, ao ser eleito melhor jogador do torneio (e sagrando-se igualmente melhor marcador). Buletsa, Kang In Lee e Douglas Luiz distinguiram-se nas edições deste ano das duas provas.
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523 futebolistas com idades compreendidas entre os 16 e os 22 anos disputaram recentemente o Mundial de sub-20 e o Torneio de Toulon de 2019. Entre eles, os grandes talentos emergentes do futebol mundial. Comum a todos, o facto de estarem na sempre delicada fase de transição entre a idade júnior e a sénior. É aqui que a triagem é feita. Os melhores sobrevivem e passam ao nível seguinte; os mais fracos (ou azarados ou injustiçados) ficam pelo caminho.
O sul-coreano Kang In Lee, o brasileiro Douglas Luiz ou o ucraniano Buletsa podem vir a ser criativos de classe mundial. Se chegarão ao patamar dos melhores do mundo, só o tempo o dirá
O facto de se destacarem nestas provas não significa que cheguem a ir longe no futebol mundial, mas a verdade é que nomes como Messi, Pogba ou Maradona estiveram entre os destaques oficiais do Mundial de sub-20, enquanto em Toulon brilharam Cristiano Ronaldo (pontificou na última vitória de Portugal, em 2003), Thierry Henry ou James Rodríguez.
Se a lógica se impuser este ano, entre os dois torneios estarão os Messis e os Ronaldos de amanhã. Não obrigatoriamente entre os principais premiados, até porque se Messi foi o melhor do Mundial de sub-20 em 2005, Ronaldo não deu assim tanto nas vistas em 2003, perdendo para Javier Mascherano a distinção de melhor jogador.
Se a lógica se impuser este ano, entre os dois torneios estarão os Messis e os Ronaldos de amanhã
Kang In Lee é por estes dias o (jovem) homem de quem se fala. Finalista derrotado pela Coreia do Sul frente à Ucrânia, venceu o principal prémio individual, o que à partida dá um mínimo de garantias em relação ao seu potencial. "É um jogador criativo, fora da caixa e bom no um contra um. Assume o jogo e é um facilitador de jogo para a sua equipa", disse a O JOGO o analista Rui Malheiro, que acompanhou a fundo a competição.
A nível semelhante esteve o ucraniano Buletsa, que venceu a Bola de Prata e saiu da final (a Ucrânia venceu 3-1) a sorrir. "Se tivesse de apostar num jovem deste torneio para ir longe no futebol mundial, escolhia o Buletsa. Para além da habilidade, mostrou também ser muito sólido mentalmente. É forte nas bolas paradas e criativo. Deriva das alas para o meio e depois sabe muito bem decidir se deve enquadrar-se para o remate ou se deve ir em direção à baliza", opina Alexandre Albuquerque, narrador da RTP para esta competição.
Já em Toulon, a figura maior foi Douglas Luiz, brasileiro formado no Vasco da Gama que agora joga no Girona, por empréstimo do Manchester City. "Tem qualidade técnica, talento, dinâmica de jogo e chegada na área. Tem classe mundial e em breve vai estar na seleção principal", afiança o jornalista brasileiro Flávio Dias, que segue de perto o dia a dia do emblema vascaíno. Terão Buletsa, Lee ou Douglas Luiz capacidade para integrar a elite do futebol mundial? A seleção natural vai ditar as suas leis.
Futuro inclina-se para o Oriente
Outro ponto em comum entre as duas provas foi o facto de terem ido às finais duas seleções do Extremo Oriente: a Coreia do Sul nos sub-20 e o Japão em Toulon. Foi só coincidência ou estaremos em presença de uma tendência geográfica que deve ser levada a sério? Na opinião do analista Rui Malheiro, há (geralmente) uma característica presente em muitos talentos daquelas bandas. "São jogadores de evoluída qualidade técnica e sobretudo são bons a tomar decisões em alta velocidade. Esse é, na minha opinião, o grande fator diferenciador."
Um onze-tipo entre o Mundial de sub-20 e o Torneio de Toulon de 2019
Lunin (Ucrânia)
"Completíssimo. Muito alto, com reflexos, agilidade e noção de controlo espacial. Bom a sair da baliza e no jogo de pés. Não lhe vejo um único defeito." Rui Malheiro - Analista
Konoplya (Ucrânia)
"Foi quem mais me impressionou neste Mundial. Dá largura e profundidade ao ataque, é bom a cruzar e a procurar o espaço interior. Tem grande futuro." Rui Malheiro - Analista
Popov (Ucrânia)
"Central de grande rigor, merece o meu destaque não só por essa faceta, mas também pelo poderio ofensivo: marcou três golos no Mundial sub-20." Rui Malheiro - Analista
Diogo Queirós (Portugal)
"Tem um potencial imenso. É "patrão", forte pelo ar, lê bem o jogo e tem poder de antecipação. Maturidade. Em breve pode ser titular no FC Porto." Gonçalo Ventura - Jornalista da RTP
*Nuno Tavares (Portugal)
"Alta capacidade para dar projeção ofensiva, também flete bem para dentro. Se pudesse escolher um jogador para o Guingamp, seria ele." Jean-Marc Bertoche - Olheiro do Guingamp
*Vítor Ferreira (Portugal)
"É consistente e não engana. Não faz a diferença, mas é um jogador de equipa e trabalha muito. Ganhou o prémio revelação em Toulon." Jean-Marc Bertoche - Olheiro do Guingamp
*Douglas Luiz (Brasil)
"Tanto joga a 6 como a 8. Tem muita qualidade técnica, talento, dinâmica de jogo e chegada na área. Tem classe mundial e em breve vai estar na seleção principal do Brasil." Flávio Dias - Jornalista brasileiro
Plata (Equador)
"É um futebolista que mexe com o jogo, nomeadamente quando deriva da ala direita para o meio. Com bons argumentos técnicos, é um jogador com imenso talento." Alexandre Albuquerque - Jornalista da RTP
Kang-in Lee (Coreia do Sul)
"De longe melhor do que todos os outros coreanos. É um todo o terreno, muito rápido, com boa visão de jogo e igualmente competente com os dois pés. Tremenda qualidade." Gonçalo Ventura - Jornalista da RTP
Buletsa (Ucrânia)
"Se escolhesse um jovem que pode ir longe, seria ele. Tem habilidade e é forte mentalmente, é criativo e forte nas bolas paradas. Sabe decidir quando rematar ou ir em direção à baliza." Alexandre Albuquerque - Jornalista da RTP
Pinamonti (Itália)
"Excelente como segundo avançado num esquema de 3-5-2. Entrosava-se muito bem com Scamacco, mais encorpado. Evoluído tecnicamente, pode melhorar ainda a definição." Alexandre Albuquerque - Jornalista da RTP
*no Torneio de Toulon
LUÍS CAMPOS NÃO FALHA UM TORNEIO DE TOULON
Luís Campos é um dos portugueses que todos os anos marcam presença em Toulon. "Sou um habitué, e já há muitos anos", conta a O JOGO o diretor do Lille, recusando-se depois a nomear jogadores de que tenha gostado. "Se o fizesse, duplicava-lhes logo o preço", conta, bem-disposto, elegendo depois o brasileiro Rodrigo Caio como um dos melhores que descobriu no torneio. Assim como o francês Lemar. ""Anda comigo ver o Lemar a Toulon", disse eu ao Leonardo Jardim quando estávamos no Mónaco. Depois, no jogo, ao fim de cinco minutos já o Jardim me estava a dizer: "Nem hesites. Temos de o levar para o Mónaco"", contou, mudando depois a agulha: "É um torneio que nos dá muita informação sobre jovens valores de outros países. A nível de brasileiros e argentinos, por exemplo, passam sempre por cá os melhores."
MATHEUS PÕE CUNHA ENTRE GOLEADORES
Para além do italiano Pinamonti, outros goleadores se destacaram nas duas provas. Como o brasileiro Matheus Cunha, que foi o melhor marcador em Toulon, com quatro golos. "É muito trabalhador, desgastando muito as defesas. E tem faro de golo", comenta um olheiro inglês que pediu anonimato a O JOGO e que, na frente, destacou também o francês Bilal Benkhedim, "jogador inteligente que segura bem a bola". No Mundial, o ucraniano Supriaga (três golos na final) ou o argentino Gaich, que marcou a Portugal, foram destacados pelos analistas ouvidos por O JOGO.
CURTAS
Dos tiros na favela até à pacífica Côte d"Azur
Eleito melhor jogador em Toulon (Côte d"Azur), o brasileiro Douglas Luiz passou a adolescência em Nova Holanda, uma favela do Rio de Janeiro. "Quando havia tiroteios ou operações policiais, ele tinha de faltar aos treinos porque era arriscado sair de casa", conta o pai do atleta.
Três grandes à pesca da truta
Com a presença de pelo menos um elemento dos respetivos departamentos de scouting, Sporting, FC Porto e Benfica estiveram atentos a tudo o que mexe neste Torneio de Toulon, sabe O JOGO. Todos eles regressaram a Portugal com dossiês bem completos sobre os principais craques.
Com a presença de pelo menos um elemento dos respetivos departamentos de scouting, Sporting, FC Porto e Benfica estiveram atentos a tudo o que mexe neste Torneio de Toulon, sabe O JOGO
Pechincha senegalesa mostrou qualidade
No recente Mundial de sub-20, houve alguns jogadores que apesar de serem perfeitos desconhecidos, revelaram potencial para corresponderem pela positiva a um eventual investimento. Foi o caso do senegalês Dion Lopy, de 17 anos, que joga ainda numa academia do seu país.
Um português no onze ideal de Toulon
O Torneio de Toulon elegeu oficialmente o onze ideal, integrando um português na equipa. Os escolhidos foram: Chen Wei (China); Emerson (Brasil), Lyanco (Brasil), Shiihashi (Japão) e Soma (Japão); Douglas Luiz (Brasil) e Tanaka (Japão); Antony (Brasil), Vítor Ferreira (Portugal) e Paulinho (Brasil); Matheus Cunha (Brasil).
Zubizarreta foi espiar para Villas-Boas
O Marselha foi um dos muitos clubes que foram a Toulon observar as pérolas do futuro. Ao serviço do emblema agora treinado por André Villas-Boas esteve o espanhol Andoni Zubizarreta, antigo guarda-redes e depois diretor para o futebol do Barcelona, que agora ocupa o mesmo cargo no Marselha. Pelo PSG esteve João Luís Afonso, que foi diretor de scouting do FC Porto.