Ligas europeias querem mais quota solidária: "Beneficiaria os clubes portugueses"
As ligas profissionais estão preocupadas com o desequilíbrio financeiro que as "eurotaças" estão a provocar. Querem e propõem medidas para diminuir o fosso entre grandes e todos os outros.
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O aumento substancial da quota de solidariedade gerado pelas receitas das competições europeias de clubes, dos atuais 7,3 para 20 por cento, faz parte de uma arrojada proposta da European Leagues para a revisão do modelo de distribuição financeira da UEFA durante o ciclo 2021/24, já em discussão no organismo que tutela o futebol continental.
A proposta da European Leagues, que foi unanimemente aprovada em assembleia geral, em outubro, por todas as ligas que representa (portuguesa incluída), nomeadamente as cinco mais poderosas, pressupõe o aumento das verbas de solidariedade da UEFA, o que poderá significar um aumento duas vezes e meia superior aos cerca de 150 mil euros anuais que recebe cada emblema português que não participa nas "eurotaças" (valor correspondente ao ciclo que terminou na época passada e similar ao atual triénio).
O aumento, em rigor, dependerá das reais receitas globais, estimadas em cerca de 3,3 mil milhões de euros, assim como de outros cálculos ainda em fase de negociação, e que serão decididos durante a primavera de 2019, antes do arranque da temporada 2019-20.
As ligas profissionais europeias pretendem, com esta proposta, apresentada oficialmente à UEFA a 14 de novembro, garantir o equilíbrio competitivo e financeiro dos campeonatos nacionais, razão pela qual propõe ainda a diminuição dos rácios entre as futuras três competições, assim como em cada uma delas, de forma a diminuir o fosso financeiro entre emblemas.
Proposta em discussão na UEFA prevê verbas maiores para equipas que não competem internacionalmente
Novo modelo de receitas na Liga dos Campeões
"A decisão sobre o modelo de distribuição financeira vai ser a chave para a sustentabilidade do futebol europeu num futuro muito próximo", disse o secretário geral adjunto da European Leagues, Alberto Colombo, a O JOGO, sublinhando que "é fundamental reabrir a discussão sobre como a distribuição financeira é organizada, incluindo um novo modelo de distribuição das receitas para a Liga dos Campeões".
Está previsto que as competições da UEFA distribuam, até 2021, um total anual de receitas a rondar 3250 mil milhões de euros, dos quais 7,3 por cento (241 milhões) estão destinados aos vários mecanismos de solidariedade. Uma percentagem inferior à de 8,5 que esteve vigente até ao fim do ciclo anterior, que terminou em junho.
Segundo as mesmas previsões, os clubes portugueses irão receber, nesse período, um valor próximo dos 4,254 M€ correspondentes à última época do ciclo 2015/18, e que rendeu cerca de 150 mil euros a cada emblema, conforme anunciado no início de novembro.
"O aumento total anual das receitas da UEFA é, infelizmente, compensado negativamente pela diminuição em percentagem do valor de solidariedade, que a partir da época atual irá diminuir de 8,5 por cento para 7,3%" sublinhou Alberto Colombo.
A European Leagues pretende, a partir de 2021/22, que do valor a distribuir (previstos 3,3 mil milhões anuais) seja reservado 20 por cento para os mecanismos de solidariedade, ou seja, subindo dos atuais 241 M€ para pouco mais de 600 M€.
A mesma proposta pretende dividir essa verba da seguinte forma: 10 por cento para as equipas não participantes, 3,5 por cento para os clubes que se apuram para as rondas de qualificação, e 6,5 por cento para a criação dum novo fundo destinado ao Desenvolvimento do Futebol Profissional, "de modo a auxiliar as ligas a combater a pirataria e o match-fixing (jogos combinados), a promover campanhas de integridade e a apostar nas academias e formação", referiu Alberto Colombo.
"É uma proposta revolucionária, mas entendemos que é vital alterar o curso e as políticas de redistribuição financeira de modo a travar o enorme fosso cavado, nos últimos anos, entre os clubes e as ligas mais ricas e o restante futebol", disse o responsável das ligas profissionais europeias.
Até à primavera, a UEFA terá de definir e submeter a aprovação os critérios do modelo de distribuição financeira das competições de clubes com vista ao triénio 21/24. Até lá, há um cenário de negociações e propostas em grupo de trabalho específico no seio da UEFA, instituição da qual a European Leagues é membro efetivo e tem assento no seu Comité Executivo.
"Beneficiaria os clubes portugueses"
A preocupação em reduzir o fosso económico-financeiro entre as várias ligas e as equipas de um mesmo país está também refletida na proposta apresentada à UEFA, nomeadamente na revisão dos rácios em cada competição e entre elas.
A criação da Liga Europa 2, por exemplo, que arrancará em 2021, "implica um modelo que garanta mais equilíbrio do que o que está em vigor no atual ciclo", refere Alberto Colombo.
A proposta da European Leagues prevê que, no ciclo 21/24, o rácio correspondente aos valores distribuídos na Liga dos Campeões não seja superior a 3,5 vezes mais do que os valores distribuídos na Liga Europa 1 (3.5:1) e que entre esta prova e a Liga Europa 2 não sejam superiores a 2,5 vezes mais (2.5:1).
Este modelo terá por base as três competições a partir de 2021, com número igual de clubes (32) na fase de grupos de cada uma delas.
O projeto de acabar com coeficiente histórico
A esta pretensão, as ligas continentais juntam o fim do coeficiente histórico no modelo de distribuição dos prémios monetários nas três provas, que se encontra em vigor no atual ciclo 2018/21 para as atuais duas competições. Assim, conforme se vê no quadro ao lado, as equipas da Liga dos Campeões deixam de ter direito a 30% das receitas a distribuir conforme o coeficiente histórico, tal como as da Liga Europa perderiam os 15% previstos.
Esses montantes seriam realocados e ajustado no item "market pool", conforme acontecia no ciclo 15/18, isto é, prémios que são distribuídos conforme o valor de mercado, variável por país, gerado pelos direitos televisivos dos emblemas que se apuram para cada uma das competições.
"Esta proposta traz, obviamente, mais benefícios para a grande maioria dos clubes portugueses e para o equilíbrio competitivo da Liga Portugal", concluiu Alberto Colombo.
A palavra às ligas
Declarações recentes sobre o atual modelo de distribuição financeira da UEFA e sobre a proposta da European Leagues pelos responsáveis das ligas profissionais da Holanda, Dinamarca, Suíça e Polónia.
"Na liga holandesa (Eredivisie), levamos a questão do equilíbrio competitivo muito a sério. Recentemente, aprovámos um novo regulamento nos Países Baixos para partilhar entre todos os clubes uma percentagem das receitas provenientes das competições da UEFA. Seria lógico que a UEFA seguisse este bom exemplo, implementando um modelo de distribuição de receitas mais justo, onde a solidariedade poderia realmente ter impacto como verdadeiro mecanismo para compensar o crescente fosso financeiro entre alguns dos principais clubes e todos os outros, tanto internacionalmente como nas competições domésticas." - Jacco Swart (CEO da Eredivise)
"Na Dinamarca, estamos a ter um diálogo aberto com a nossa federação, uma vez que é do interesse comum ter uma liga competitiva e convincente a nível nacional e, ao mesmo tempo, ter clubes dinamarqueses com um bom desempenho nas competições internacionais. Ambos pedimos à UEFA para reconsiderar a maneira pela qual os recursos financeiros são redistribuídos para atingir esses objetivos. Acreditamos que é fundamental rever todo o sistema de distribuição, desde a Liga dos Campeões até à Liga Europa, contando com a nova competição, de modo a gerar um impacto positivo para todos os clubes profissionais." - Claus Thomsem (CEO da liga holandesa)
"A decisão sobre a distribuição da receita ainda está por ser tomada e pedimos à UEFA que aumente o nível de solidariedade de forma substancial para compensar a enorme diferença financeira entre os clubes suíços que participam regularmente nas competições da UEFA e os restantes, que jogam exclusivamente a nível nacional. Torna-se imperativo proteger mais o equilíbrio competitivo das ligas nacionais para garantir a sustentabilidade a longo prazo do futebol europeu." - Claudius Schafer (CEO da liga suíça)
"Agora é hora de rever o modelo financeiro. Os clubes da Liga dos Campeões estão a receber muito dinheiro. Precisamos haja mais dinheiro a partilhar entre todos os clubes, especialmente aqueles que não participam nas competições internacionais. Na Ekstraklasa [liga polaca] trabalhamos para providenciar à maioria de nossos clubes a possibilidade de competir e vencer o campeonato enquanto sonha em jogar na Europa. A UEFA tem a enorme responsabilidade de manter vivo este sonho em todos os nossos clubes." - Marcin Animucki (presidente da Liga polaca)