Jordão Cardoso: "Racismo? Sentimos impotência porque não podemos fazer nada"
Português que joga na Bulgária conta que só sofreu episódios racistas no futebol português
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Jordão Cardoso chegou este ano ao futebol búlgaro, proveniente do Benfica de Castelo Branco. Filho de angolanos, tem atualmente 23 anos e joga no Cherno More, sexto classificado na I Liga daquele país. Em declarações a O JOGO feitas a propósito dos recentes episódios racistas no Bulgária-Inglaterra, o futebolista fala da sua experiência particular nesse âmbito.
Do que já conhece da Bulgária e do futebol local, ficou surpreendido com os recentes episódios racistas e nazis no jogo de selecções contra a Inglaterra, disputado em Sófia?
Surpreendeu-me muito, muito, porque desde que estou cá nunca vi racismo nenhum. No Cherno More há um brasileiro e um cabo-verdiano [Rodrigo Henrique e Patrick Andrade] que jogam cá há mais tempo e depois do que aconteceu nós falámos sobre o assunto e eles disseram-me que nunca tinham presenciado nada do género neste país. Por isso ficámos surpreendidos com aquilo. Nem eu nem eles os dois, por termos um tom de pele diferente, presenciámos algo do género na Bulgária.
E ao longo da carreira, já alguma vez sofreu na pele atitudes racistas?
Sim, por várias vezes. E infelizmente no meu próprio país, porque eu sou português, nasci em Portugal e só depois é que tenho também a nacionalidade angolana, por via dos meus pais. Não quero referir episódios em concreto, porque não gosto de estar a lembrar-me deles, mas o meu pai até chegou a fazer uma participação na polícia por causa disso. Mas sim, já sofri com isso e senti-me muito humilhado, na altura.
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Mas que episódio foi esse?
Foram insultos que tinham a ver com o meu tom de pele e com o continente onde os meus pais e a família deles nasceram. Mas não vou pormenorizar.
O que sente uma pessoa quando é vítima desse tipo de insulto? Revolta? Raiva?
É um pouco de tudo. Quando os insultos vêm da bancada uma pessoa sente-se impotente. Se for um colega de profissão, o árbitro pode expulsá-lo e uma pessoa fica mais descansada. Mas quando é da bancada, o árbitro não tem controlo e não pode fazer nada. Depois o clube pode ser multado, mas a humilhação fica-nos marcada a nós. Uma pessoa sente-se impotente porque não pode fazer nada. Isso terá sido o que sentiram os jogadores da Inglaterra. Mas aqui, na Bulgária, não tenho qualquer razão de queixa.
E na sociedade em geral, fora do futebol, tem sentido a existência de racismo?
Não, nada. Em Portugal sempre fui bem tratado fora de campo. Nem sequer me lembro de um episódio racista que tenha sofrido fora de campo. Mas dentro de campo, sim, muitas vezes os adeptos de uma equipa estão descontentes, ou porque a equipa está a perder ou porque uma pessoa joga bem e é isso que as leva a fazer esse tipo de insultos. Fora do campo não tenho nada a apontar ao comportamento das pessoas.
E na Bulgária, fora do campo, sente que há racismo nas pessoas ou não?
Até à data nunca senti nada.
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