Treinador e ex-defesa esquerdo da Seleção Nacional e do Sporting e do FC Porto conta por que razão o Campeonato do Mundo do México "deu na barraca que deu"
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"O Mundial de 1986 tem várias peripécias. Uma delas é a desorganização com que foi planeado e deu na barraca que deu. Dirigentes muito amadores, que pensavam que era um evento só de passeio. Fomos para lá com 52 dias de antecedência e não tivemos condições nenhumas. Tínhamos um campo de apoio que estava completamente inclinado, pelo comprimento e pela largura, e como treinávamos dessa forma e havia alguns buracos na relva, pedimos à organização para arranjar o relvado porque podíamos sofrer lesões. No dia seguinte, quando chegámos lá, surpresa das surpresas, aquilo estava tapado com cimento! No jogo-treino antes do primeiro jogo do Mundial, com a Inglaterra, quando começámos a ver os jogadores do adversário, percebemos que conhecíamos aquelas caras. Eram os cozinheiros e os empregados de mesa que nos serviam no hotel! O primeiro jogo foi bom, ganhámos à Inglaterra, mas nos outros dois, com a Polónia e com Marrocos, as coisas não bateram certo, e assim fomos eliminados do Mundial, que era o sonho de todos nós. Esse momento foi o 25 de abril do futebol porque os dirigentes começaram a perceber que estávamos num evento em que éramos vistos em todo o mundo e era necessário uma organização mais profissional.
A Federação queria açambarcar
o dinheiro todo e não queria
dar nada aos jogadores
A conferência a anunciar a greve [os jogadores não iam comparecer no particular com os Tigres] tem a ver com a publicidade que fazíamos nos equipamentos. A Federação queria açambarcar o dinheiro todo e não queria dar nada aos jogadores. O presidente da FPF [Silva Resende, falecido em fevereiro deste ano] nunca nos apareceu à frente e tomámos uma posição. Foi muito má para o país porque também não ficámos bem na fotografia, mas a Federação foi um elo muito nefasto em relação aos anseios, à ambição e à expectativa de Portugal estar num Mundial 20 anos depois de ter estado no primeiro com os Magriços. Mas a partir daí a Federação organizou-se, ficou mais profissional e agora os jogadores têm outras condições para trabalhar, só pensam em treinar e jogar. A única coisa positiva daquele Mundial foi a vitória com a Inglaterra e grandes jogadores, como por exemplo o Futre, quando começa a aparecer, o bibota, Fernando Gomes, ou o Carlos Manuel."