"Cristiano Ronaldo ajudava a sermos primeiros", afirma Daniel Alonso, de La Liga
ENTREVISTA - Daniel Alonso, representante de La Liga em Portugal, lamentou a saída do craque luso do Real Madrid e admite que a prova espanhola teve de arranjar estratégias para não perder protagonismo em Portugal e no mundo. A O JOGO revelou ainda a oposição da liga espanhola a uma superliga europeia.
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Daniel Alonso tem 35 anos, mora em Lisboa há ano e meio e é representante da liga espanhola em Portugal. Quer ajudar a manter a trajetória ascendente da prova no mundo. A função do espanhol - adepto do Celta, dizendo-se, por isso, imparcial para falar de Cristiano Ronaldo - é perceber o que os portugueses querem consumir no que toca a futebol, agora que o capitão de Portugal já não atua em Espanha. Sem questionar a valia dos campeonatos locais, diz a O JOGO que a meta é ultrapassar Inglaterra no duelo particular.
- Representa La Liga em Portugal. Como é fazê-lo após a saída de Cristiano Ronaldo do Real Madrid?
- Não está o Cristiano, mas a competição é sempre interessante e está acima de clubes e jogadores. Ainda para mais, a classificação encontra-se um pouco apertada.
- Acredita que essa estratégia de valorização da prova girava em torno do avançado português?
- Cristiano é uma referência mundial. Se falarmos só da importância dele no mercado português, é óbvio que a mudança para a Juventus não ajudou. É um herói nacional, afetaria sempre, mas a vida segue sem ele.
- Qual foi a vossa reação quando tiveram conhecimento que o Cristiano sairia?
- Talvez tenha levado as mãos à cabeça quando se confirmou. Não gostei, claro. Tivemos de repensar algumas estratégias. Não mudámos muito, já que levamos anos a fioa fazer isso. Valorizamos a competição.
- E qual é a meta de La Liga em Portugal?
- Não queremos competir com a liga local. Será sempre a mais forte, a mais vista. É normal... os adeptos têm o seu clube. Até temos um memorando de entendimento com a liga portuguesa para crescer e aprender também. O nosso maior competidor é a Premier League. Queremos ser a segunda mais vista em todos os países e a internacional de referência.
"André Silva está fortíssimo, é uma referência no Sevilha. Há 13 portugueses a jogar em La Liga. Isso não acontece em lado algum"
- A Premier League tem mais impacto do que La Liga?
- Se perguntarmos a um português qual é a de referência, dirá uma das duas. Estamos a par em Portugal. Claro que queremos ser primeiros e Cristiano ajudava. [A liga de] Itália cresceu muito em Portugal nos últimos meses, certamente devido à influência de Cristiano e Cancelo, mas Inglaterra e Espanha estão acima.
- E os portugueses, o que querem então?
- Gostam de entrevistas e conteúdos exclusivos. Há um fator importante: 13 portugueses a jogar em Espanha. Chegaram Gelson [Atlético Madrid] e William [Bétis]. Já lá estava o [Gonçalo] Guedes [Valência]. André Silva está fortíssimo e é uma referência no Sevilha, quase a estrela. Há motivos para assistir. Além de ser a melhor competição do mundo em nosso entender [risos]. Em 20 equipas, há dez que têm jogadores portugueses no plantel. Em cada jogo da La Liga, é provável que haja um português em campo. Isso não acontece em lado algum.
"Cairo pára no "clássico", até sem Messi e Ronaldo"
O futebol é um fenómeno à escala global e o clássico espanhol, entre Barcelona e Real Madrid, não fica indiferente a ninguém. Este último, em outubro [5-1 para o Barça], foi o primeiro dos últimos anos sem Ronaldo ou Messi. Daniel Alonso diz que não influenciou: "O Cairo [Egito] pára no clássico espanhol, até sem Messi ou Ronaldo. Ficam colados ao ecrã. A competição está acima de um ou outro jogador. É verdade que são os melhores jogadores da última década, falta um bocadinho de magia, mas mantém-se a expectativa de ver o jogo", comenta o representante espanhol.
El Clásico chega a 500 milhões de pessoas e é o evento desportivo de um dia com maior atenção mediática mundial. Há 44 pessoas no mundo com as mesmas funções de Daniel Alonso.
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"Totalmente contra Superliga Europeia"
A Superliga Europeia recebeu, esta semana, várias críticas do presidente da FIFA, Gianni Infantino, que quer punir os jogadores que participem numa competição pensada pelos maiores clubes europeus e também à margem da UEFA. O representante de La Liga, de 35 anos, corrobora o veto de Javier Tebas, presidente da prova espanhola.
- Qual é a opinião de La Liga acerca de uma possível Superliga Europeia?
- Estamos totalmente contra este projeto. Achamos que vai acabar com as ligas locais. A nossa intenção é dar competitividade às provas nacionais espanholas, repartir de forma mais justa as receitas. Não podemos estar de acordo com uma competição na qual são os clubes grandes a decidir quem entra.
- Em caso de vencerem a competição, não seria uma forma de a liga espanhola ter ainda mais visibilidade?
- A curto prazo era bom termos um Juventus-PSG, mas quando já estivesse resolvida a classificação as audiências baixariam. O Real é tricampeão europeu. Na última década, Espanha venceu 13 vezes as maiores competições [sete Ligas dos Campeões e seis Ligas Europa]. Isso fala por nós. Não é preciso mais. Além disso, dessas equipas todas só uma ganharia. Muitas ficariam frustradas e não é aceitável que, para ganhar mais dinheiro na Liga dos Campeões, existam clubes grandes a lançar esta ideia.
Portugal e Espanha estão alinhados na rejeição da Superliga Europeia e emitiram comunicados que reforçaram a parceria depois dos Encontros Ibéricos de agosto
- Teme que se desvalorizasse o campeonato?
- Preocupa-nos a massa adepta dos clubes. Não podemos esquecer que o mercado tende a ser local. Não só para os clubes espanhóis que não participam, nem nunca teriam hipótese, como outros países, como Portugal, que iria ter sempre muitas dificuldades para poder competir. No modelo atual de campeonato, cada equipa luta pelos objetivos e pode sonhar em ir à Europa no início de cada ano. Com a Superliga Europeia, as provas locais seriam mais desvalorizadas e existiria o risco de os grandes rodarem o plantel. E isso prejudica.
Eleven traquiliza La Liga
A Eleven Sports, grupo multinacional de canais televisivos britânico, entrou em 2018 no mercado português, comprando os direitos de La Liga e da Liga dos Campeões. Tem uma cada vez mais vasta carteira de países (Bélgica, Estados Unidos, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Polónia, Portugal, Reino Unido, Singapura e Taiwan) e a parceria com a prova espanhola já decorria antes desta temporada desportiva. Em Portugal, há a esperança de que sejam superadas as falhas de cobertura e atrasos nas transmissões.
"A introdução está a ter problemas com operadores para chegar ao grande público. Podemos dizer que a Eleven Sports ainda não está no ponto certo. Sabemos que leva tempo, não existia este hábito de usar a internet para ver futebol. Mas é a tendência mundial. Sabemos que demora, mas resulta", garante Daniel Alonso, comparando a experiência com a revolução que também chegou às séries e filmes: "A Netflix está há três anos em Portugal e cresce exponencialmente todos os anos. Todo o mercado demora a adaptar-se às tecnologias, mas é o caminho certo. La Liga está tranquila e não temos razões para duvidar."
Operadora ainda não satisfaz todas as ambições, mas Alonso crê na plataforma de futuro
A confiança está bem vincada e deriva também das experiências que a plataforma tecnológica tem cultivado com a organização espanhola noutros mercados. "É nosso parceiro na Bélgica, Polónia, Luxemburgo, Inglaterra e Irlanda", afirma o representante de La Liga, rejeitando comparações com o anterior titular dos direitos da prova em Portugal: "O o projeto leva ano e meio, é recente, além de que a Sport TV tinha os direitos há muitos anos. Não podemos comparar Eleven e Sport TV porque são estes que têm os dados para avaliar. A Eleven está a trabalhar bem, é um processo de transição. Aliás, antes a liga espanhola ficava fora do processo, mas agora somos 45 a avaliar o que o consumidor pretende da competição favorita. É positivo."