Gunnar Nielsen calçará as luvas para travar o apetite de golos de Ronaldo e antes soltou a língua para comprovar o sentido de humor dos faroeses, que estão à frente na classificação
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Perguntaram ao guarda-redes Gunnar Nielsen se teve pesadelos com Cristiano Ronaldo nos últimos dias. "Pesadelos, eu? Não, isto não é uma guerra. Entendo que o foco esteja em Ronaldo, mas é só futebol e tudo pode acontecer. Estamos apenas entusiasmados", retorquiu, na maior das calmas, para contra-atacar depois de uma segunda investida, novamente em forma de pergunta e feita em moldes idênticos: "Este é o jogo das vossas vidas?" Nielsen carregou na boa disposição. "Não, não é. E como estamos à frente na classificação, talvez seja o jogo da vida de Portugal." É mesmo: o campeão da Europa joga mais do que um mero ponto de honra; joga pontos, no plural, porque o grupo que era visto como um Euromilhões do futebol tem saído uma bela surpresa de resultados, sobretudo à conta do adversário desta noite. Direto só passa um; para repescagens via play-off, adivinha-se uma luta interessante.
Se quiséssemos traçar um retrato das Ilhas Faroé, e não apenas futebolístico, a resposta de Nielsen podia muito bem ser um belo resumo: há por aqui um povo tranquilo, prestável, com um assinalável sentido de humor e aberto ao contacto. Do nada, e quando O JOGO procurava ontem o melhor caminho para o estádio, porque tudo é perto em Tórshvan, houve logo um convite. "Venha caminhar connosco", sugeriram, embora fossem na direção oposta. "Ah, o estádio, por causa do jogo com Portugal? Siga em frente, em menos de dez minutos está lá." Ao domingo não há autocarros, mas os faroeses não se importam, porque adoram caminhar e há, no arquipélago, trilhos mundialmente famosos. Outra coisa que escandalizaria alguns portugueses: o SMS, único centro comercial da capital, também fecha. É sagradinho. Está por lá um grande cartaz a anunciar o jogo desta noite, mas, por estes lados, ninguém passa o dia de descanso a ver montras, mesmo que o tempo (sem chuva) obrigue já a uns casacos mais generosos.
A vitória na Letónia elevou a dose de entusiasmo no que toca ao futebol, que O JOGO testemunhou ser parte integrante das manhãs de domingo dos faroeses. Ao lado do Tórsvollur, que hoje recebe as duas seleções, não faltava quem andasse aos pontapés na bola. E até com banda sonora. "Thunderstruck", a mítica música dos AC/DC, bem audível, como se exige, embalou um dos aquecimentos. A presença de Cristiano Ronaldo é também assunto inevitável sempre que a conversa se desvia para o futebol. Aliás, a primeira coisa que perguntou uma das hospedeiras do avião que trouxe no sábado a reportagem de O JOGO até ao arquipélago foi se Ronaldo tinha mesmo viajado. E não convencida, assim que abriu a porta, perguntou logo ao funcionário do aeroporto que colocava a escadaria para que os passageiros descessem se o CR7 tinha pisado solo faroês. Sim, acabara de chegar no voo privado da Seleção. O episódio espelha um pouco de um entusiasmo generalizado e, mesmo com os pés assentes em terra firme, a verdade é que desta vez há nos faroeses uma pontinha de esperança fundamentada de que pode haver uma surpresa esta noite.
