Borja Iglesias, da paixão pelo Celta ao regresso à seleção: "É muito frontal e nunca se fica"
Borja Iglesias, fora de série nos golos e nas causas, grita as suas convicções sem medo. Encanta em Vigo e volta à seleção de Espanha sem abdicar dos seus apelos. Avançado do Celta tem sido voz ativa na causa palestiniana e na luta contra a homofobia e racismo. "Aos que vivem na pré-história, passo-vos muito ânimo", declarou a propósito.
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Autor de seis golos nos últimos dez jogos, brilhando e sorrindo, pejado de encanto ao serviço do Celta, regressando a Vigo por apelo do coração, despedindo-se do Bétis e certificando a sua qualidade de matador, Borja Iglesias conseguiu aos 32 anos retornar à seleção de Espanha, premiado pelo seu pujante arranque no clube galego.
Um avançado peculiar, homem de convicções, que se entretém a marcar golos enquanto distribui um olhar gracioso e se associa a causas, indiferente a ruídos ou reprovações. Chamou a si também uma alcunha que o define maravilhosamente, granjeando a simpatia de todos com um sonoro "El Panda", tratamento que ostenta desde 2016/17, quando apontou 34 golos em 39 jogos pelo Celta B, num momento divino da sua carreira que iluminou convites e desafiou tentações, mas já longe do seu coração em Balaídos. Deixou marca goleadora no Saragoça, Espanhol, Bétis e conseguiu mesmo atingir o Bayer Leverkusen, onde foi campeão alemão em 2023/24.
Com Luis Enrique estreou-se na seleção, voltou a jogar com Luis de la Fuente e também renunciou pouco depois, insurgindo-se contra os comportamentos indignos de assédio do presidente da federação, Luis Rubiales, perante Jenni Hermoso. Revoltava-se, então, por sinais de impunidade. Com a federação reformulada e uma condenação para Rubiales, Borja, filho de Compostela, sempre apaixonado pelo Celta, aceitou regressar a La Roja, pela qual jogou este sábado diante da Geórgia (2-0), ao entrar em campo aos 65 minutos.
Comprometido com movimentos minoritários e causas sociais, defensor de igualdades e liberdades, Borja não se esconde no silêncio, não se fica por lugares-comuns e até arrisca pensamentos atrevidos e fraturantes. Com a Espanha a discutir severamente os bloqueios na Volta a Espanha dos movimentos pró-Palestina, o avançado atirou e convocou reflexão. "Não entendo porque se discute quem trava uma corrida e não se faz mais por não parar um genocídio." Sentença poderosa, replicando outra parecida, agora, até desconfortável para os adeptos mais ruidosos da seleção. "Oxalá, se estou pronto a marcar um golo, atirem uma bandeira da Palestina para a baliza; ficarei feliz se o golo for anulado", declarou Borja Iglesias nos últimos dias.
Além destes posicionamentos, Borja tem um histórico intocável em nome das liberdades, mesmo enfrentando a ira nas redes sociais. A partir do momento que assistiu a um casamento com uma bolsa de mão, foi chamado de homossexual, reprimindo prontamente os comentários homofóbicos. "Aos que vivem na pré-história, passo-vos muito ânimo." Aqui e acolá, Borja detona agitações maldosas nas redes, tomando voz contra o racismo e homofobia com frequência, e também envolvendo a sua cara em campanhas. "Sendo futebolista, não significa que não possas opinar. Eu sou consciente da minha responsabilidade pelo alcance social que posso ter", exprimiu em tempos.
"É frontal e ajuda pessoas"
As convicções não se moldam por qualquer proveito próprio, estão assumidas e são reconhecidas dentro de qualquer balneário onde tenha estado o galego. Falámos com João Camacho, português que atua hoje no Karagumruk, da Turquia. Foi colega de Borja em 2016/17 na época produtiva do Celta B.
"Tivemos uma relação excelente. Desde uma boa ligação no campo até ao facto de me ter ajudado muito fora dele, quando cheguei. A sua dimensão estava à vista. Ia ser um enorme jogador e disparou completamente. Fico muito feliz por ele, pelo que está a fazer agora e por ter voltado à seleção. Tem uma personalidade espetacular, sendo humilde e trabalhador", conta o antigo extremo do Nacional e Moreirense, também conhecedor dessa cabeça "rara", tão refrescante no futebol.
"Ele tem as suas próprias ideias e convicções, é muito frontal e nunca se fica. É uma pessoa que tenta, sobretudo, ajudar os amigos e qualquer outra pessoa. Essa é a sua natureza, é muito bondoso", sustenta Camacho, entendendo uma sintonia a roçar o esplendor entre Borja e o Celta. "Para ele, o clube é tudo. Não percebi como, depois dessa temporada, não se afirmou logo na equipa principal. Mas o que vale e o que joga está à vista de todos. Tem um amor enorme ao Celta e está feliz a ajudar o clube", revela, curvando-se ao estilo afável do antigo companheiro.
"Ele interage com todo o mundo numa simplicidade que nem é fácil acreditar o jogador que é. Tudo é natural no Borja", junta. Sobre o regresso ao universo da poderosa armada espanhola, poucas dúvidas... "Cabe perfeitamente nas escolhas e merece. É um nove puro, mas também versátil, que se adapta bem", opina, lembrando o delicioso título de El Panda. "Vem de uma música que ouvíamos no balneário nessa altura, por sugestão dele, do rapper Desiigner. Também ficámos como Panda Team".