Bino Maçães: "Queria que criassem laços entre eles, sem telemóveis na mesa"
ENTREVISTA, PARTE I - Mais do que o troféu conquistado na Albânia, o selecionador nacional de sub-17 destaca o crescimento dos jogadores, mostrando-se convicto que muitos deles estão preparados para dar o salto.
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Bino Maçães conduziu a Seleção Nacional sub-17 ao título de Campeão da Europa, e ontem, dia de aniversário da esposa, Sónia Oliveira, concedeu uma entrevista exclusiva a O JOGO, contando os episódios da grande campanha na Albânia.
Com o cancelamento do voo de regresso a Portugal, foram quase 40 horas a festejar com os jogadores. Como viveram esses momentos?
—Na primeira noite festejámos, era a noite dos nossos jogadores, até pela campanha que fizemos, mas no dia seguinte tínhamos viagens, com duas escalas para chegar a Lisboa e correu mal logo na primeira, porque houve uma avaria no avião e tivemos que regressar a Viena. Foram duas noites perdidas.
O que sente por ser campeão da Europa?
—Sinceramente, não sei muito bem. Percebo que seja algo fenomenal, porque senão éramos muito mais vezes campeões da Europa e só fomos três vezes. Até a seleção que ganhou mais vezes o troféu tem quatro títulos. Mas não é o troféu que me realiza, é mais o crescimento dos jogadores, potenciar estes miúdos, porque um dos grandes objetivos que temos na formação é que estes jogadores cheguem à Seleção A. Os jogadores cresceram e chegámos a esta altura com uma equipa com uma maturidade que eu não esperava. Sabia que eles têm muita qualidade, mas, depois, o compromisso que eles tiveram é de gente grande.
Foram campeões da Europa com adversários poderosos, isso valoriza mais esta conquista?
—Sim, muito mais. O nosso processo foi perfeito na nossa imperfeição, porque chegámos onde devíamos com tudo muito alinhado. Mas passámos por situações diversas de crescimento, minhas e do próprio grupo. Estamos com eles há duas épocas, o ano dos sub-16 é de descoberta para eles, começando a emancipar-se; começam a namorar, começam a ganhar dinheiro e a fazer contratos. Esse processo foi difícil em muitos momentos, o foco, muitas vezes, não era aquilo que pretendíamos, mas eles foram percebendo. Por isso é que digo que na nossa imperfeição chegámos muito bem a esta fase final.
Quando é que começou a acreditar que era possível ser campeão?
—Fui pensando jogo a jogo, sempre foi esta a mensagem que tentei passar, porque o grande objetivo era sermos qualificados para o Campeonato da Europa, porque isso dava-nos a possibilidade de irmos ao Mundial, ao qual já não vamos há muito tempo. No Europeu, o primeiro grande objetivo era passar a fase de grupos, e passámos com distinção. Empatámos com a França, mas fizemos uma segunda parte excelente e ficámos em segundo lugar no grupo, o que foi bom, porque nunca saímos do mesmo hotel e jogámos sempre no Estádio Nacional, que é o melhor da Albânia, com uma relva excecional.
Dá muita importância ao espírito de grupo. É por isso que não quer que jogadores do mesmo clube estejam juntos nas refeições e nos quartos?
—Sim, porque queremos fomentar o espírito de grupo. Vamos arranjando formas de colocá-los a conviver uns com os outros e a conhecerem-se melhor. É normal um jogador não saber que o outro não tem pai ou não tem mãe, que não tem um irmão, se tem namorada. Queria que criassem laços entre eles. E não há telemóveis na mesa. Esse espírito de grupo notava-se nos jogadores que entravam e na forma como festejávamos os golos.
Acredita que daqui a dez anos estes jogadores podem ser a base da Seleção A?
—Não sei se serão, porque temos gerações ano após ano que podem fornecer grandes jogadores. Acredito é que temos aqui jogadores com muito potencial, que podem ser aproveitados, primeiro pelos clubes e depois pela Seleção A, porque deixando de jogar nos clubes vão ser esquecidos. Depois de ganharmos o Euro e de percebermos a qualidade da equipa, é legítimo estes jogadores pensarem que podem dar um salto, não digo passarem já para a equipa A, mas para as equipas B ou para os sub-23. Queimar etapas vai ajudá-los a crescer mais rápido.