Avançado do Manchester United escreveu texto no "The Players Tribune". "A bola salvou-me", afirma
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O avançado Antony, que está prestes a estrear-se num Mundial pelo Brasil, abriu o coração e recordou a sua infância, num texto publicado no "The Players Tribune".
Antony, agora no Manchester United, cresceu no bairro "Inferninho", numa favela da zona norte de São Paulo. "A bola salvou-me. Driblar sempre foi algo dentro de mim. Um instinto natural. E eu não me intimidava. Eu driblava os traficantes. Dava elástico nos bandidos, chapéu nos motoristas de autocarro, 'canetava' os ladrões. Uma vez, na minha caminhada para a escola, quando eu tinha uns 8 ou 9 anos, encontrei um homem deitado no beco. Só que ele não estava se mexendo. Quando me aproximei, percebi que ele estava morto. Não havia outro caminho a seguir, e eu tinha que ir para a escola. Então, eu só fechei meus olhos e pulei o cadáver", recorda.
O internacional brasileiro viveu no Inferninho até se mudar para a Europa. Dividia a cama com o pai (os pais separaram-se quando tinha 11 anos). Começou a jogar na praça do bairro e foi descoberto por um olheiro do Grêmio Barueri, que o levou para a equipa de futsal. Aos 14 anos mudou-se para o São Paulo, de onde deu o salto para a Europa.
"Todos os dias depois da escola, eu ia para o clube com o estômago vazio. Às vezes, se fosse num dia bom, eu e meus companheiros de equipe fazíamos uma vaquinha para comprar uma bolacha para a viagem de autocarro de volta para casa. Eu não tinha que fingir estar com fome de motivação. A fome era real. Eu era tão magro, mas sempre jogava com 'sangue nos olhos'. Se você fala com os média, eles sempre perguntam sobre os seus sonhos. A Champions League? A Copa do Mundo? A Bola de Ouro? Mas esses não são sonhos. São objetivos. O meu único sonho era tirar os meus pais da favela. Não tinha plano B. Eu ia conseguir ou morrer a tentar", prossegue.
A ascensão até ao Ajax é recordada com orgulho: "Ainda em 2019 quando fiz o golo contra o Corinthians, na final do Campeonato Paulista em Itaquera, depois do jogo eu já estava de volta na favela onde eu nasci... Um ano depois, eu estava no Ajax, jogando a Champions League. Foi assim que as coisas mudaram rápido. Eu não só tinha a minha própria cama, mas a Range Rover Evoque vermelha estava na garagem da minha mãe. Eu disse-lhe: 'Estás a ver, mãe? Disse que iria conquistar. E conquistei.' Quando eu lhe disse isso com 10 anos, ela riu-se. Agora, quando eu lembro essa história, ela chora."
Nas chuteiras tem escrita a palavra favela, pois nunca se esquece de onde veio: "Eu sempre digo que aonde quer que eu vá na vida, não importa o que aconteça comigo, eu represento o lugar que me ensinou tudo. Sem a minha casa e o meu povo, nada disso importa."
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