"A vinda do Cristiano Ronaldo foi boa. Os sauditas percebem que não chega ter dinheiro"
Gouveia, treinador português de 50 anos, conduziu o Al Hazem à I Liga da Arábia Saudita e pode sagrar-se vice-campeão da II liga, numa época marcada por vários problemas.
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Filipe Gouveia festejou a subida à I Liga saudita no comando do Al Hazem, que pode sagrar-se vice-campeão segunda-feira, na última jornada. Uma prenda para o treinador que comemorou os 50 anos no passado dia 12. Em entrevista a O JOGO, o antigo médio contou os episódios de uma época que foi uma verdadeira montanha russa.
A subida estava nos planos ou correram por fora?
-O objetivo sempre foi a subida. Na época passada desceram duas equipas que já todos davam como garantidos nos lugares da subida, Al Ahli, uma equipa fortíssima e que, em 2015/16 foi campeã da I liga, e o Al Faisaly. Depois estava a nossa equipa, que também tinha descido e que queria voltar à I liga. Subimos num contexto muito difícil, com muitos problemas ao longo da época.
Quais problemas?
-Tivemos salários em atraso, mas felizmente o grupo foi forte e deu a volta à situação. A partir de dezembro o nosso presidente ajudou muito, porque contratámos quatro jogadores. Na primeira volta fomos a única equipa que teve apenas dois jogadores estrangeiros, o Ola John e o Luka Stojanovic. Com a chegada dos reforços melhorámos a qualidade, mas essencialmente o espírito de grupo. Os jogadores sauditas têm muita dificuldade em serem profissionais, em descansar e com tudo aquilo que está relacionado com um atleta de alto rendimento. Desse ponto de vista, os jogadores estrangeiros são muito importantes. A vinda do Cristiano Ronaldo foi boa, pelo jogador e pelo profissional que é. Os sauditas percebem que é preciso mais profissionalismo, não chega só ter dinheiro.
A ideia que existe é que não há problemas financeiros na Arábia Saudita...
-Os problemas financeiros não aconteceram apenas no Al Hazem, mas em praticamente todos os clubes. Tem a ver com o Governo. Podem atrasar o pagamento durante dois ou três meses, mas acabam por pagar. Este ano foi demais e tivemos vários meses em atraso. Quando acontecem esses atrasos, o jogador saudita complica um bocadinho...
O Al Hazem é um clube de I ou II liga?
-Tem historial de I liga, mas não é de ficar mais do que dois anos no mesmo escalão. Quando o presidente me convidou foi para subirmos e sustentarmos o clube na I liga. Na Arábia Saudita isso é quase impossível (risos).
Impossível porquê?
- Vou dar um exemplo. Estive dois anos seguidos no Al-Jabalain e, nos dois anos seguintes, eles tiveram 12 treinadores. Para terem uma ideia, esta época, na II liga, só quatro treinadores aguentaram até ao fim, três deles portugueses: eu, o Jorge Mendonça (Al-Akhdoud) e o Quim Machado (Al-Orobah). Todos os outros clubes tiveram, em média, três a quatro treinadores. Na Arábia Saudita podemos ser despedidos a qualquer momento. Eu, felizmente, nestes três anos que estive cá, dois no Al-Jabalain e um no Al Hazem, nunca fui despedido. As pessoas sempre acreditaram nos momentos bons e nos momentos maus. Os projetos na Arábia Saudita não existem, interessa é os resultados, como em todo o lado, mas aqui ainda mais. Aqui até temos treinadores despedidos na pré-época. No Al-Faisaly, um clube fortíssimo e que agora já não consegue subir, o presidente despediu o treinador que ia em primeiro lugar. Acontecem coisas surreais.
Vai renovar?
-Vamos ver. O presidente do clube já manifestou interesse na minha continuidade. Tenho ainda algumas situações fora da Arábia Saudita.
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