"A Geórgia precisava disto. Faz sentir que as coisas podem mudar para melhor"
Avto, atacante georgiano com uma carreira escrita em grande parte em Portugal, última época feita no Leixões, expressa todos os sentimentos pelo momento histórico que testemunhou já em solo nacional, no dia em que regressara de Tbilisi
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Aos 32 anos, Avto tem uma história desportiva feita em Portugal... entrando pela porta algarvia, através do Esperança de Lagos com 17 anos. Sucederam-se vários clubes, também passagens por Roménia e Chipre, uma última época feita no Leixões na Liga 2, tendo ainda marcado o seu lugar na Liga em 54 jogos, quando era um dos atacantes do Gil Vicente e mais tarde pelo Chaves. Hoje com dupla nacionalidade, é, porém, um filho da Geórgia, nascido em Tbilisi, que rejubilou com o maior sucesso da nação independente desde o início dos noventas.
Portugal foi o carrasco num jogo que desencadeou folia sem precedentes na capital georgiana, amplificando o que se vira na concretização do apuramento para o Europeu. "Foi arrepiante, vieram-me muitas lágrimas, foi muita alegria. A passagem ao Europeu já tinha sido algo fantástico, histórico. Agora mais incrível foi, foram imensas chamadas para amigos e familiares, a cidade não parou. Era uma alegria imensa, afinal é um povo que precisava disto, que precisa cada vez mais destas celebrações. É algo que faz sentir que as coisas podem mudar para melhor", adianta Avto, desencontrado da inaudita barulheira e sabor a título que irrompeu por Tbilisi nos minutos que se seguiram ao apito final. "Sabendo, de antemão, deste jogo, adorava ter visto o jogo na Geórgia. E, de facto, estive lá mas tinha viagem de regresso marcada para 26. Cheguei a Portugal pela uma da tarde com a minha mãe e acabei por ver o jogo em Portugal, de coração dividido por ter mulher portuguesa e filha nascida cá, mas sabendo que Portugal não precisava do jogo e a Geórgia tinha mesmo de ganhar", explica o extremo que completou a última época no Leixões mas que está de saída do clube de Matosinhos.
"Era um fuso horário complicado, mas ainda falei com muitos amigos. Entretanto fui dormir e disseram-me depois que foi sempre a festejar até às seis da manha, uma cidade cheia de gente, uma felicidade tremenda. Acho que foi equivalente à festa de qualquer campeão europeu, duplicou ou triplicou a alegria que veio com o jogo frente à Grécia", partilha o extremo, radiante, mesmo à distância do epicentro do júbilo. "Ainda para mais, além do orgulho como georgiano, tenho carinho por muitos dos jogadores, de quem fui colega na seleção. Foi épico e especial vê-los neste estado de graça. Afinal qual era a probabilidade de algo assim acontecer? A Geórgia tinha de ganhar e tinha de vencer Portugal, só uma das melhores seleções da Europa", sublinha.
"Nada temos a perder, vamos à luta!"
O encontro disputado em Gelsenkirchen começou cedo a sorrir aos caucasianos, embalados por golo madrugador de Kvaratskhelia.
"O que aconteceu logo aos dois minutos foi absolutamente fabuloso, foi uma sensação arrebatadora para nós. Ficamos a perceber que era possível! Depois era uma questão de aguentar, mesmo não sendo fácil suportar uma reação de uma equipa como Portugal. Mas com raça, entrega e atitude, as caraterísticas que melhor representam a Geórgia no Europeu, conseguimos!", valoriza Avto, ainda com amigos como Loria, Kashia, Dvali e Kverkelia na seleção.
"Conheço a qualidade da seleção portuguesa, para mim segue como favorita e preferida para ganhar o Europeu. Este resultado veio mais da superação da Geórgia mas também reconheço de alguma tranquilidade portuguesa de não precisar de qualquer ponto. Jogando com Ronaldo de início, tanto faz se precisam ou não precisam, é sempre sinónimo de golos e vitórias", destaca, tributando as armas encontradas por Willy Sagnol. "Mas aí prevaleceu uma Geórgia coesa e compacta, que raramente deixou que furassem as suas linhas e soube aproveitar os contra-ataques. Com o passar dos minutos, a equipa mostrou garra, mostrou o que é a Geórgia e o que é a sua história! A superação não foi só neste jogo, foi também nos anteriores, pois fizemos jogos incríveis e bonitos contra a Turquia e Chéquia", assinala, esperando que o conto de fadas georgiano reserve mais um espanto ibérico. "Contra a Espanha só podemos esperar as mesmas dificuldades de Portugal, mas a esperança está aí, é o Europeu, estamos entre os 16 melhores. É um jogo muito difícil, mas tudo é possível. Nada temos a perder, vamos à luta e todos são heróis, não só o Kvicha", argumenta. "Eu apoio a Geórgia mas também Portugal e acredito que vai longe, chegará à final e ganhará. Pela equipa que tem, pela capacidade que revela, acho que podem fazer grandes jogos", sustenta Avto.