O Mundial vai marcando a atualidade catari, mas nem por isso as pistas de camelos caem no esquecimento. A curta distância da Seleção, os "craques" peludos despertam agitação.
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Os termómetros marcam 32 graus centígrados e o sol vai alto no deserto catari. Na cidadela que serve de quartel-general à seleção portuguesa durante o Mundial"2022, a habitual tranquilidade é interrompida quando a reportagem de O JOGO se aproxima de um dos mais icónicos locais do país anfitrião: a pista de corridas de camelos de Al-Shahaniya, situada a cerca de cinco quilómetros do centro de treinos de Portugal.
O JOGO deu um salto à célebre pista de Al-Shahaniya e encontrou uma verdadeira romaria: centenas de animais e outros tantos aficionados. O futebol passa, então, para segundo plano.
Aqui, não há dúvidas: ao sábado, o desporto rei não é o futebol, nem em tempo de campeonato do Mundo. Se nos estádios brilham Messi, Cristiano Ronaldo e companhia, as estrelas sobre a areia têm quatro patas e grunhem sob um calor abrasador.
Mas, antes das corridas propriamente ditas, que decorrem de outubro a março num sistema de campeonato, há todo um processo de preparação que Omar, um dos muitos tratadores presentes no local, detalha ao nosso jornal.
"A partir das cinco da manhã, caminhamos duas ou três horas com os camelos"
"Dois meses antes de começarem as corridas, começamos a preparar os camelos. A partir das cinco da manhã, caminhamos com eles durante cerca de três horas. Depois, são 10 ou 20 minutos a correr", explica, ele que é natural do Sudão. A hora madrugadora está relacionada com o menor calor que se faz sentir, contudo, na hora de correr a sério, não há tréguas. "Futebol? Não... Aqui, em Al-Shahaniya, este é o desporto mais importante", vinca Omar.
Quando damos conta, são centenas os animais que estão à espera de entrar na pista. A cada tiro de partida, cerca de 20 saem em corrida desenfreada, ao longo de quase seis quilómetros, atingindo velocidades superiores a 40 km/h. A acompanhar, surge um outro tipo de "cáfila": numa estrada paralela, seguem dezenas de viaturas, onde seguem operadores de câmara, aficionados e os donos dos camelos que estão a competir. As emoções ficam ao rubro e há até quem se ponha do lado de fora da janela do carro, a incentivar o animal da família. Sim, porque também as crianças vibram...
"Futebol? Não... Aqui, em Al-Shahaniya, este é o desporto mais importante"
E como é que os camelos sabem para onde ir e a que velocidade? Em cima de cada espécime é colocado um jóquei robótico, que obedece a controlo remoto e, além de emitir sons através de uma aparelhagem, está munido de um instrumento semelhante a um pequeno chicote. Estratégias aprimoradas ao longo de décadas, na modalidade que o emir do Catar, Tamim Al-Thani, adora acompanhar. Quem conhece o meio garante que as corridas movimentam milhões de reais e um camelo pode mesmo custar centenas de milhares de dólares. Com os estádios do Mundial à distância, quem tem bossa é rei.
Com direito a canal e até relato
Impacto mediático das corridas tem muito que se lhe diga. Há um canal dedicado ao ofício e um ecrã gigante junto à pista.
Se dúvidas houvesse sobre o impacto que estas corridas têm em termos mediáticos, ficaram esclarecidas a partir do momento em que demos de caras com um ecrã gigante, localizado junto à grelha de partida, onde os camelhos se posicionam antes do arranque da prova. Lá, através de um canal próprio, a corrida é transmitida na sua totalidade, até à meta, quase ao jeito das provas de velocidade dos Jogos Olímpicos. E há mais: quem acompanha o desenrolar dos acontecimentos nos carros sintoniza o rádio numa estação em que é reproduzido, em direto, o relato da corrida. Este também passa numa instalação sonora destinada para o efeito, com colunas e transmissores estrategicamente localizadas ao longo do percurso. Caso para dizer que mais a sério era impossível.
Negócio paralelo a florescer
A realização do Mundial no Catar levou a que o interesse dos turistas nas corridas de camelos subisse exponencialmente e, com isso, começasse a surgir um negócio paralelo. Omar, tratador que falou a O JOGO, ofereceu uma volta de camelo - que foi recusada - a troco de uma quantia negociável. Pouco depois, pediu algum dinheiro em troca dos esclarecimentos prestados, mas admitiu: "Podia ter dito antes..." E aprendeu a lição. Quando outros curiosos o abordaram, já não falou sem algo em troca, exigindo pagamento.
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