De Pinto da Costa a outros presidentes: portas fechadas deixam clubes de boca aberta
Primeiro-ministro confirmou na quinta-feira que público continuará proibido nos eventos desportivos e as reações não tardaram.
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O primeiro-ministro, António Costa, oficializou na quinta-feira o que Graça Freitas, da Direção-Geral de Saúde (DGS), defendera na véspera: a nova época de futebol, que começou com o primeiro jogo da II Liga, prosseguirá sem público nas bancadas dos estádios, numa proibição que se estende a outras modalidades praticadas em recinto fechado, e ainda sem data para ser alterada.
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É um golpe duro nas aspirações dos clubes e, no caso específico do futebol, também da Liga, que aguardava luz verde para o regresso gradual dos adeptos, com planos estratégicos que previam lotações reduzidas.
Ao explicar a decisão tomada em Conselho de Ministros, no âmbito das medidas de um novo período de contingência a que o país estará sujeito a partir de terça-feira, António Costa rebateu a ideia de que o futebol está a ser discriminado em relação a outras atividades. "Todos os que já foram a recintos desportivos sabem que o comportamento num cinema ou num teatro é muito diferente de assistir a um evento desportivo", argumentou. É esta diferença de comportamentos que legitima, segundo o primeiro-ministro, a adoção de critérios diferentes, avaliação que o futebol tem rejeitado. Pinto da Costa, por exemplo, já comentara com ironia as autorizações dadas a alguns espetáculos e na quinta-feira, quando lhe foi pedida uma reação à decisão do Governo, voltou a disparar. "Não costumo comentar coisas absurdas", frisou a O JOGO, um não comentário que nas entrelinhas volta a sublinhar a discordância com a diferença de avaliação.
Pinto da Costa considerou "uma coisa absurda", o presidente do Rio Ave está "estupefacto" e o do Marítimo "incrédulo". A medida não afeta só o futebol, mas Liga insiste na "discriminação"
O presidente do FC Porto não foi o único a reagir nesse sentido. Também António Silva Campos, líder do europeu Rio Ave, se mostrou desagradavelmente surpreendido. "É com estupefação que ouvimos as declarações do primeiro-ministro, pois entendemos que o futebol continua a ser discriminado. À nossa volta vemos vários eventos com milhares de pessoas a decorrer sem qualquer problema. O Governo não pode continuar a olhar para o futebol com preconceito, até porque todos os clubes souberam dar o exemplo e envidaram esforços para um regresso seguro à competição", lembrou. Paulo Meneses, do Paços de Ferreira, disse lamentar que não se tente encontrar "soluções intermédias", ao contrário do que sucedeu com outras atividades. "Não entendo", vincou o presidente pacense, mais um num coro de vozes que fizeram chegar a O JOGO as respetivas reações.
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"O Braga respeita a decisão do Governo e da DGS, mas tem sérias dificuldades em entender as diferenças de tratamento", sublinharam os minhotos, que, como é sabido, apresentaram há dias um detalhado plano estratégico para ter público nas bancadas, e que pretendiam ensaiar no jogo de preparação com o Valladolid, uma solicitação que foi negada pela DGS. "Estamos totalmente preparados para o regresso do público", insistem, cumprindo "critérios de segurança". "É fundamental para o espetáculo e para o jogo", vincam ainda os bracarenses, ter bancadas com adeptos. "Trata-se da primária necessidade de devolver a alma aos estádios", rematam. "Só com público o futebol faz sentido", acrescentou o Boavista. Carlos Pereira, do Marítimo, à Lusa, confessou-se "incrédulo". "Se é possível fazer um plano para uma tourada, um plano para um espetáculo musical, fazer planos para tudo e mais alguma coisa, é também possível fazer um espetáculo de futebol", frisou, antes de um remate crítico: "É inadmissível ser alguém que não percebe nada do fenómeno desportivo e que não sabe o que é uma bola de futebol, a tomar esta decisão."
"DISCRIMINAÇÃO NÃO FAZ SENTIDO"
Helena Pires, diretora executiva da Liga, não escondeu a O JOGO a deceção com a norma do Governo que continua a barrar aos eventos desportivos, entre eles o futebol, a hipótese de terem público. "Não faz sentido a, permitam-me o termo, discriminação que existe em relação a outras atividades", frisou, lembrando o esforço coletivo que foi feito para arquitetar planos estratégicos que respondessem às exigências impostas pelas autoridades de saúde. "Propusemos que fossem feitos alguns jogos-teste, de forma a que o regresso do público fosse gradual", planos esses que foram sempre chumbados pela DGS, isto apesar da abertura mostrada em relação a outros eventos. Esse é, de resto, o principal argumento que sustenta a contestação.
Diretora-executiva alega que as infraestruturas garantem um regresso em segurança do público, mas, face à intransigência revelada pela DGS, é incapaz de prever quando as portas voltarão a abrir
O "bom desempenho" mostrado na conclusão da última temporada, frisou ainda a diretora executiva, "deveria ter sido levado em conta para viabilizar uma decisão favorável ao futebol". "Creio que temos todas as condições e infraestruturas para garantir o regresso em segurança". Mais: a diretora executiva lembra que, apesar de o futebol ser considerado atividade de "risco médio", e por isso isenta da obrigatoriedade de testagem intensiva, vai continuar a fazê-lo, num sinal de compromisso com as cautelas que a covid-19 exige.
A diretora executiva não consegue fazer uma estimativa sobre quanto tempo levará ainda para os recintos abrirem as portas. "Gostaria que fosse já na primeira jornada", diz, ciente de que tal não sucederá. O rombo financeiro nos clubes, esse, será significativo e é uma das preocupações atuais da Liga.