Rui Licínio despede-se da arbitragem: "Após um jogo menos conseguido, somos sempre ameaçados..."
Assistente Rui Licínio despediu-se do "irmão" Artur Soares Dias no Famalicão-Sporting, mas ainda pode fazer um último jogo em dezembro. O final da carreira do internacional só deve acontecer no final do ano, mas já está decidido; o juiz que não dormia "dois ou três dias" depois de um mau jogo vai pendurar a bandeirola.
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O Famalicão-Sporting de anteontem ficou marcado pela despedida de dois irmãos. Rui Licínio decidiu que aquele seria o último jogo que seria auxiliar de Artur Soares Dias.
"Foram 16 anos a formar equipa com ele. É como se fosse um irmão mais novo, será sempre alguém da minha família", conta o árbitro-assistente de 48 anos. "Com o Artur tenho quase 600 jogos, se dividirmos pelas horas que passámos juntos são milhares de horas. E em alguns torneios de 30 dias, por exemplo, tínhamos, naturalmente, que nos dar bem e compreender", acrescenta o árbitro que começou a carreira aos 25 anos e que em Famalicão não foi homenageado pela FPF por uma razão "muito simples". "Queria terminar com o Artur em dezembro, porque ele vai ter de parar dois meses, por ter de fazer uma intervenção cirúrgica. Depois da publicação dele nas redes sociais [anunciou "o último jogo de um elemento único"], decidi que seria o último jogo da nossa equipa ao fim de 16 anos", contou, a O JOGO, Rui Licínio que só ontem, após o jogo no Minho, conversou com José Fontelas Gomes.
"Falei com o presidente do Conselho de Arbitragem e disse-lhe que, mesmo que possa, eventualmente, fazer o jogo da próxima jornada, em dezembro, não vou continuar mais", revelou o assistente que tem José Cardinal "como principal referência. "Não falámos antes com ninguém do Conselho de Arbitragem porque não era suposto ser o meu último jogo.", explicou.
Na primeira categoria desde 2007/08, Rui Licínio contou que soube sempre contornar as críticas e ameaças, por exemplo, nas redes sociais. "A seguir a algum jogo menos conseguido, ou que as pessoas entendem que é menos bem conseguido, somos sempre ameaçados por alguém que diz que faz isto ou aquilo e que se nos apanhar na rua nos dá uma coça", adiantou o assistente internacional que, "felizmente", nunca foi "agredido". "Os insultos e as ameaças fazem parte e vamos criando algumas defesas para lidar com essas situações. Temos psicólogos, caso assim o queiramos, mas normalmente é mais na nossa família que nos refugiamos", avançou.
O árbitro da AF Porto confidenciou também que quando comete erros, "especialmente com influência, não se dorme bem durante dois ou três dias". Da arbitragem, realçou, leva "as amizades" que ganhou. "Há pessoas que são meus amigos para toda a vida", congratulou-se.
Da Champions ao "choque" na Índia
A nível internacional, Rui Licínio não se esquece do primeiro jogo na Champions. "O Marselha-Arsenal, com o Olegário Benquerença", recorda. Com Artur Soares Dias, "o mais marcante" foi o Real Madrid-PSG. Com o árbitro da AF Porto, Licínio esteve, em 2021, no Europeu de 2020 e nos Jogos Olímpicos de Tóquio, em 2015 no Mundial de sub-20, na Nova Zelândia, em 2017 no de sub-17, na Índia. "É um país que guardo para a vida. Estivemos lá 30 dias. Temos a noção que é pobre, mas é um choque cultural e social muito marcante", sublinha.