A densidade do plantel, a adaptação e inadaptação do processo aos jogadores nos jogos com o Krasnodar ou a "criação de inimigos externos" foram abordados por Jorge Costa, Freitas Lobo e Francisco José Viegas.
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A entrada em falso do FC Porto na nova época, confirmada pela derrota na primeira jornada da I Liga e pela (inesperada) eliminação da Liga dos Campeões, suscitou as mais diversas opiniões sobre as razões que a motivaram.
Não é para menos. Afinal, há 48 anos que os dragões não perdiam dois dos três primeiros jogos oficiais da temporada, ainda por cima com as consequências desportivas e financeiras que se conhecem.
Por isso, O JOGO tentou encontrar respostas para o momento, dividindo a análise em três vertentes: a ação dos portistas no mercado de transferências até ao momento; a parte estratégica (os aspetos positivos e os que devem ser corrigidos no modelo de jogo); e ainda a questão da comunicação, introduzida por Sérgio Conceição na conferência de Imprensa que se seguiu à derrota com o Krasnodar, quando lamentou a existência de um "clima de intoxicação nunca visto" em torno do clube. Para isso foi ao encontro de três conhecedores das respetivas áreas, seja porque conhecem por dentro como se constrói um plantel (Jorge Costa), seja porque conhecem o jogo (Luís Freitas Lobo), seja porque estão familiarizados com a envolvência dos clubes com a comunicação social (Francisco José Viegas).
OPINIÃO
JORGE COSTA, EX-JOGADOR
"Para jogar em 4x3x3 falta um goleador ao estilo de Bas Dost"
Nunca é fácil para um treinador trabalhar com um plantel com excedentários. O ideal seria um grupo com 21 ou 22 jogadores, mais os guarda-redes, e neste momento o FC Porto tem um plantel com muitos jogadores, entre os quais seis centrais: Pepe, Marcano, Mbemba, Osório, Diogo Queirós e Diogo Leite. Por razões de valorização, gostava de ver estes dois jovens jogarem mais; se não for no FC Porto, noutro sítio qualquer. Na direita, Saravia é interessante ofensivamente, mas a defender ainda está longe das rotinas do futebol europeu. É um dos casos em que é necessário um período de adaptação. O estilo do Manafá é semelhante, no sentido em que corre e faz bem algumas coisas, mas precisa de treinar outras, nomeadamente os cruzamentos. Mas não me parece que exista uma malapata no lado direito. Só agora foi possível ver Uribe, mas parece-me que o meio-campo fica bem servido com ele. E também tenho expectativas em relação ao Loum. No ataque, se a ideia for jogar com dois avançados, os que existem são suficientes; se for para jogar em 4x3x3, falta um goleador ao estilo de Bas Dost. Quando não se ganha, é natural existirem críticas, mas devem ser entendidas como necessidade de reflexão.
LUÍS FREITAS LOBO, COMENTADOR
"Falhar golos faz parte do jogo, falhar defensivamente faz parte do modelo"
Não penso que o problema do FC Porto seja tático, até porque a ideia-base se mantém em relação às duas épocas anteriores. A questão principal tem que ver com a mudança de alguns elementos fundamentais no aspeto da transição e da organização defensiva. Penso que, nesta altura, o momento do jogo mais delicado para o FC Porto é o momento da perda da bola. Falhar golos faz parte do jogo; falhar defensivamente faz parte do modelo. E quem interpreta o modelo são os jogadores. Quando se tem jogadores com rotina e com valor para o interpretar de forma exigente, é natural que esse processo corra bem. Quando não se tem esses jogadores para o fazerem, é natural que o processo corra mal. Ou seja, o FC Porto na Rússia foi seguro, porque o processo era adaptado aos jogadores que tinha. Já no Estádio do Dragão, frente ao mesmo adversário (Krasnodar), com um processo inadaptado aos jogadores que tinha em campo, acabou por ser inseguro. No fundo, a equipa azul e branca mantém as qualidades e os problemas ofensivos (saudades de Brahimi, que resolvia o jogo num remate) das últimas épocas e acrescentou problemas defensivos no processo coletivo (para além do relacionado com as questões individuais).
FRANCISCO JOSÉ VIEGAS, ESCRITOR E JORNALISTA
"Há máquina de propaganda antiportista, mas também erros futebolísticos graves"
Acho que seria bom o presidente do clube marcar uma posição muito séria em relação a esses episódios de intoxicação, mas é preciso não ter ilusões sobre a imparcialidade da Imprensa. A mensagem só passará quando chegarem os êxitos desportivos incontestáveis. Não gosto da ideia de "criar inimigos externos" que justifiquem erros próprios. Mesmo que esses inimigos externos existam, e existem, nomeadamente uma tendência benfiquista na generalidade dos comentadores. O FC Porto ficou fragilizado depois do arranque dos inquéritos judiciais, e isso nota-se na reação da Imprensa e em certa desmoralização dos adeptos. Não se compreende que o Benfica tenha sido poupado nos vários processos, mas trata-se de um longo caminho a percorrer e que irá recorrer a instâncias europeias. Há, de facto, uma máquina de propaganda antiportista. Muito real é esta conivência entre a máquina de propaganda benfiquista e parte substancial da Imprensa e da televisão, e até de instituições públicas do futebol e que chegam ao próprio Governo. E de forma descarada. Exagero é culpar essa benfiquização do país por erros futebolísticos graves e que merecem reflexão profunda. Silêncio, caldos de galinha e - finalmente - resposta taco a taco seria a postura nesta fase. Sei que não é fácil, porque qualquer declaração do clube é sempre sujeita a distorções, mas vale a pena tentar.
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