O percurso de Kokçu: saiu da sombra do irmão, recusou a Turquia e noites sem dormir
Fazendo dos seus pais e irmão um apoio importante, o novo camisola 10 chegou a admitir após a estreia no Feyenoord que o seu estilo de jogo encaixa-se melhor em Espanha do que na Premier League.
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As ruas de Haarlem, nos Países Baixos, foram o primeiro campo de Kokçu. O médio contratado pelo Benfica tem raízes turcas, mas cresceu em solo neerlandês e foi por lá que se desenvolveu como jogador até conquistar o prémio de melhor da Eredivisie.
Os nove anos ao serviço do Feyenoord terminaram com a transferência para a Luz, mas, numa família de futebolistas, o seu futuro nem sempre foi aquele em que depositaram mais fichas.
Orkun e o irmão Ozan partilham parecenças físicas, acentuadas pela diferença de apenas dois anos entre ambos, e a paixão pelo futebol. Os dois irmãos Kokçu cresceram com a bola nos pés, motivados pelo pai, também ele jogador, que acabou a carreira de guarda-redes devido a uma lesão no ombro, e pelo tio. "Investi muito neles, treinei-os, levei-os a competições. Dediquei-lhes muito tempo. Eu também queria ser jogador profissional, mas os meus pais preferiam que eu fosse à escola", contou Eryalç em entrevista à publicação neerlandesa "NOS". Mas, nesses primeiros passos, era o irmão Ozan quem dava mais nas vistas, e na rua, nos torneios entre amigos, era a estrela sempre escolhida primeiro. Era também assim nas várias captações a que foram. "Sempre que havia oportunidades, nós íamos, mas sem grande sorte. Até que um dia alguém do Groningen apareceu. A família viajava rumo ao norte todas as quintas-feiras. Nessa altura, o Ozan treinava, mas eu não. Pegava na bola e ia dar toques e rematar sozinho no outro lado do campo. Um dia, perguntaram-me se queria treinar na equipa B dos mais novos, já que estava lá sempre. Foi a oportunidade de que estava à espera há muito tempo. Pude mostrar-me e consegui ficar", contou o novo 10 da Luz à ELFVOETBAL.
Mais uma vez, a família foi essencial. Orkun Kokçu destacou-se e, dois anos mais tarde, foi chamado para treinar no Feyenoord, o que fez com que a família, que se tinha mudado para o norte do país para os irmãos jogarem, se separasse. O pai ficou com o Ozan em Groningen e Orkun voltou com a mãe para Haarlem, perto de Roterdão. Começou a partir daí a história com o Feyenoord, para terminar apenas há uns dias com a transferência para o Benfica. Pelo meio, Kokçu teve propostas de outros clubes, nomeadamente da Turquia, mas o médio, aconselhado pelo irmão, que fez esse mesmo percurso, decidiu sempre ficar nos Países Baixos. A ideia - admitiu o jogador quanto tinha 17 anos logo após a estreia, e a marcar, na equipa principal do Feyenoord - seria sempre dar os passos com cautela: "Quero crescer aqui [nos Países Baixos] e depois ir para um país estrangeiro. Diria Espanha e depois Inglaterra, onde o futebol é mais físico. Acho que na liga espanhola encaixo-me melhor."
A ansiedade e a saída do estágio em lágrimas
Foi novamente junto dos seus que Kokçu encontrou apoio numa altura em que lutou contra a ansiedade e insónias. Quando cumpria o Ramadão, em abril do ano passado, o jogador bebeu uma bebida energética para poder jogar, e, em entrevista ao De Volkskrant, conta que nessa noite não dormiu "com o coração muito acelerado". Pensou que não iria conseguir ultrapassar essa situação e criou um "pequeno trauma" que se arrastou durante meses. Quando estiveram na Áustria, já na pré-época de 2022/23, Kokçu acabou mesmo por abandonar o estágio depois de ter um ataque de choro em frente ao treinador. Fez a viagem de volta a casa de carrinha, durante oito horas, com o pai à espera dele. "Dormimos no sofá para estarmos ao lado dele", contou Halis Kokçu. "Quando és novo tens de lidar com muita coisas: críticas, pessoas que em quem não podes confiar e acumulas tudo na tua cabeça também devido à falta de sono", explicou o pai. O jovem acabou por procurar um terapeuta comportamental e por fazer terapia, num processo que terminou em novembro do ano passado.