O JOGO falou com ex-selecionadora do Brasil: Benfica tem jogadora com potencial para ser a melhor do mundo
O JOGO falou com Emily Lima, treinadora do Santos que descobriu Ana Vitória, média-ofensiva, recém-contratada pelo Benfica. Para a ex-selecionadora do Brasil, bastou um toque na bola para perceber o talento da camisola 10 encarnada. Emily abordou ainda as metas traçadas para as Sereias da Vila, bem como a evolução do futebol feminino no Brasil e a passagem pela seleção portuguesa
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Última contratação do Benfica para esta época, Ana Vitória é a primeira dona da emblemática camisola 10 e a jovem brasileira de apenas 18 anos já deixou um pouco do perfume do seu futebol. Na estreia, marcou ao Sporting B e esta quarta-feira foi titular no triunfo sobre o Marítimo por 5-1. Tecnicista, recai uma grande expetativa sobre Ana Vitória não só nas águias, mas também no Brasil dado o potencial da jogadora. O JOGO falou com Emily Lima, a treinadora que "descobriu" Ana Vitória e viu nela caraterísticas ímpares no primeiro treino.
"A Ana Vitória foi uma menina que convoquei quando eu estava na seleção de sub-17. Fui fazer uma avaliação, uma seleção de jogadoras em Cuiabá e ela estava entre centenas de meninas. Ao primeiro toque na bola, olhei para o meu assistente e disse 'pode anotar o nome dessa menina, porque é diferente'. E dali para a frente caminhou com os seus próprios passos. Faltava uma oportunidade e ela teve e soube aproveitá-la. É uma menina diferente e vai ser uma grande jogadora. Torço para que ela fique na Europa", afirma Emily Lima, atual treinadora do Santos.
Entre elogios, a ex-selecionadora do Brasil alerta para as fases de evolução da jogadora, mas na calha pode estar alguém do patamar de Marta, a melhor de todos os tempos. "Pele é Pelé e Marta é Marta. Gostaria muito de ouvir a Ana Vitória dizer que não quer parecer-se com a Marta, mas sonha chegar onde ela chegou, ser a melhor jogadora do mundo. Isso tem de ser com a personalidade e características dela. No Brasil, tivemos a nossa Sissi e apareceu a Marta com outras caraterísticas, mas uma grande jogadora. Não gosto de comparações e a Ana Vitória tem as suas caraterísticas e vai ser uma grande jogadora. Não sei se será a melhor do mundo, mas acredito que será uma grande jogadora", completa.
"Ana Vitória estava entre centenas de meninas. Ao primeiro toque na bola, olhei para o meu assistente e disse 'pode anotar o nome dessa menina, porque é diferente'"
Inteligência e técnica de Tayla destacadas
Recém-chegada à Luz, Emily Lima analisou também as caraterísticas de Tayla, que treinou no Brasil. "É uma defesa totalmente técnica, inteligente, alta, magra e forte e acreditou que vai ter muito sucesso em Portugal. O Benfica é uma porta que deve abrir-se para ela em termos europeus", diz, olhando igualmente para a guarda-redes Dani Neuhaus. "Trabalhei pouco com ela, porque já tinha um pré-contrato assinado com o Benfica, mas é uma guarda-redes muito boa, comprometida e que convocámos duas vezes para a seleção. Mas em termos de jogo e de dia a dia, tenho pouco para dizer."
A vinda de muitas jogadoras canarinhas não passa despercebida à treinadora que aprova a decisão. "Jogar no Benfica é sempre uma boa opção. Digo-o como treinadora. Treinar o Benfica, Sporting, o próprio Braga é sempre uma opção boa. Há oportunidade de trabalhar no mercado europeu e a possibilidade de jogar a Champions League, que é a maior vitrine de futebol feminino europeu e é uma boa opção. Só não sei se o Benfica vai ter uma equipa de Portugal, ou uma equipa brasileira [risos]. É o que estou a perceber, porque já tem bastantes brasileiras", refere Emily, a primeira mulher a orientar a seleção brasileira.
"Só não sei se o Benfica vai ter uma equipa de Portugal, ou uma equipa brasileira [risos]. É o que estou a perceber, porque já tem bastantes brasileiras"
Cumprir sonho do pai na seleção portuguesa
Filha de pai português, antes de enveredar pela carreira técnica, Emily foi jogadora e representou as cores da Seleção Nacional. A treinadora de 38 anos, que teve 12 internacionalizações por Portugal, a primeira em outubro de 2007, lembra todo o processo. "Eu jogava em Espanha e encontrei a Ana Caetano no Facebook. Vi que era coordenadora do futebol feminino da Seleção Nacional portuguesa e naturalizei-me. Pedi-lhe uma oportunidade, conhecemo-nos e assim foi, numa altura em que a treinadora era a Mónica Jorge, hoje diretora da federação. Ela aceitou e fiquei durante algum tempo, uns três anos, penso eu, a defender as cores de Portugal com muito prazer e orgulho, porque o meu pai era português. Era um sonho dele que vestisse a camisola de Portugal", recorda Emily, que desde que rumou a casa, poucas vezes tem vindo a Portugal. Mesmo assim, vai mantendo contacto com algumas jogadoras, Ana Caetano e Mónica Jorge.
Em busca de títulos no Santos
Sem saudades dos tempos em que liderou a seleção, Emily foca-se totalmente no Santos, onde se diz "muito feliz". "Faço o trabalho com o mesmo prazer, vontade, profissionalismo e compromisso. Defendo o branco e o preto do Santos e vou brigar por esta camisola. O que aconteceu na seleção foi muito bom para a minha carreira e evolução das meninas dentro da seleção e isso foi importante para mim, mas passou. Tenho de olhar para a frente", diz. Após um ano de 2018 "positivo", o primeiro nas Sereias da Vila, em que implementou nova metodologia de trabalho, Emily traça como metas a final do campeonato paulista e brasileiro, sendo que o "objetivo maior" é ser campeã brasileira, para que o Santos esteja mais uma vez na Libertadores. "Queremos dar continuidade ao nosso trabalho, mas infelizmente tivemos bastantes perdas no plantel, entre empréstimos, trocas e vendas. Com as Sereias da Vila não foi diferente. Há que trabalhar como profissionais e vimos que no Santos o melhor era reduzir o plantel e as contratações teriam de ser de jogadores que viessem lutar por um lugar", atira.
Evolução "muito lenta" no Brasil
No entender de Emily Lima, a evolução do futebol feminino no Brasil está a ser efetuada de forma "muito lenta". "Numa análise fria e calculista, o que vem acontecendo é por conta da obrigatoriedade, devido à licença de clubes que a CONMEBOL e CBF obriga. Não vejo que isso seja uma evolução. Seria se todos clubes fizessem o que o Santos faz, ou seja se não alugassem nenhum clube. Há muito clube alugando equipas formadas e não sei até que ponto isso é importante. Mas torcemos para que dê frutos no Brasil. Infelizmente, as coisas acontecem desta forma aqui, sendo diferente de Portugal que vem melhorando a sua liga principal e a segunda divisão, com clubes que não alugam equipas, chegando-se à frente e sendo mesmo o próprio clube, como o Sporting, Benfica, Braga, entre outros. Precisamos entender essa evolução no futebol feminino no Brasil", explica.