O fim do pesadelo no Pinhalnovense: "Eu levava comida para que jogadores não passassem fome"
Ex-treinador vive agora uma "sensação de libertação", depois de meses a fio sem receber um cêntimo e a fazer de psicólogo e gestor. "O que mais custou foi lidar com a parte humana", conta o técnico que vai agora dirigir o Coruchense e que ia ao supermercado buscar comida para que um grupo de cinco jovens "não passasse fome"
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O pesadelo chegou ao fim. Ricardo Estrelado respira agora de alívio, depois de ter rescindido com o Pinhalnovense e assinado pelo Coruchense, igualmente a disputar o Campeonato de Portugal, Série E. "É uma sensação de libertação, face aos inúmeros problemas que vivemos durante tanto tempo. A sensação não é em relação ao grupo, nem ao clube, mas à própria situação em si", vinca o treinador, aludindo ao que é do conhecimento público: a SAD desistiu do projeto ainda antes do campeonato começar e não pagou um cêntimo a quem quer que fosse.
"Fui treinador, psicólogo e gestor", prossegue Ricardo Estrelado. "Foi desgastante e ajudei de todas as maneiras, não só para a equipa continuar a competir como também para mostrar a eventuais investidores a qualidade humana do Pinhalnovense". Mas foi em vão, apesar do bom registo, traduzido em cinco vitórias, quatro empates e uma só derrota. O balão rebentou depois da paragem do Natal e do Ano Novo e no último domingo a equipa não se apresentou em campo, ante o U. Montemor, inclusive porque a maioria dos jogadores tinha já "fugido" para outros emblemas.
"O que mais custou foi lidar com a parte humana, sobretudo com a situação de cinco jovens jogadores, que viviam numa casa onde chegou a faltar água e luz e ninguém pagava a renda. Eu, mais duas ou três pessoas amigas, levámos carrinhos de supermercado para eles não passarem fome", conta Ricardo. Acresce que dois destes miúdos faziam de roupeiros, e, "mesmo sem ninguém lhes ter pedido, levavam os equipamentos para serem lavados".
A equipa técnica foi gerindo as expectativas, na medida do possível, com o foco nos jogos, "mantendo a ilusão e à espera de um salvador", e, apesar do bom rendimento em campo, "nem assim arranjámos um investidor", lamenta Ricardo Estrelado. "Íamos para os jogos num autocarro a cair de velho e as despesas continuavam a ser pagas por nós, senão ninguém almoçava. Cuidados médicos? Não havia dinheiro para exames".
Estreia no campo do Sintrense
Ricardo Estrelado e os adjuntos Paulo Monteiro, André Sequeira e Filipe António rescindiram com o Pinhalnovense na passada segunda feira, como tinham anunciado, e, volvido pouco tempo, receberam o convite do Coruchense. "Gostei do que vi e das pessoas. Temos um campo municipal e quase nem fiz exigências", explica o treinador, que amanhã já se deve estrear no banco, no jogo com o Sintrense.