Outrora patinho feio das competições profissionais, a Taça da Liga surge no horizonte da próxima época como solução para alimentar a competição, quando, independentemente da qualificação de Portugal, o campeonato for interrompido para dar lugar a esse estranho Mundial de outono que será o Catar"2022.
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Um estádio desmontável envolvido por uma gigantesca tenda a homenagear as populações nómadas do deserto espera, a 21 de novembro, o pontapé de saída da fase final do Mundial do Catar, cujo vencedor será conhecido a 18 de dezembro.
Para se cumprir essa caminhada desde o Al Bayt até ao Lusail Stadium foi preciso impor profundas alterações nos calendários competitivos, a fim de deslocar para o outono uma discussão que nos habituámos a desfrutar com temperaturas de verão, uma vez encerradas todas as outras, a nível nacional e continental - em 2023, será a Liga dos Campeões a estender-se para 10 de junho.
Arranjar espaço para 28 dias de competição foi apenas mais uma entre tantas outras polémicas que envolveram o torneio: desde os subornos na votação do país anfitrião, que abalaram a FIFA e a UEFA, até às denúncias das condições de trabalho desumanas que custaram a vida aos operários na construção das infraestruturas que suportam o torneio, passaram-se vários anos de consternação - nada que se possa comparar ao sabor agridoce que a questão do calendário deixou aos protagonistas, com os jogadores a serem libertados apenas uma semana antes da prova, com outra de recuperação até voltarem aos respetivos campeonatos.
Taça da Liga para entreter
Portugal, que disputará ainda o play off de acesso à fase final, não deverá ser exceção neste capítulo, embora a proposta de calendário das competições profissionais ainda não seja conhecida. Do que está a ser preparado pelos grupos de trabalho no organismo presidido por Pedro Proença sabe-se que esse mês e meio sem campeonato poderá ser aproveitado para concentrar a Taça da Liga, com a decisão do "campeão de inverno" a manter-se no final de janeiro, sem roubar espaço ao campeonato, como já sucede. "É uma possibilidade que está em cima da mesa", admitiu, por altura da recente final four que o Sporting viria a conquistar, o diretor executivo Tiago Madureira, em entrevista à Rádio Renascença.
Este cenário, que por agora não passa disso, uma possibilidade - embora bastante atraente para todos os envolvidos - permitiria resolver o grande problema que será para as equipas o anunciado vazio competitivo que se abre com o Mundial. Se, para os selecionadores, este torneio entranhado no outono tem a vantagem de garantir jogadores num bom momento de forma, com as dores de cabeça provocadas pelo desgaste acumulado transferidas, desta vez, para os treinadores dos emblemas que estiverem na discussão dos troféus europeus, para quem fica nos clubes a ausência de jogos é uma aberração. É aí que a Taça da Liga surge como solução, num formato transitório, sem as eliminatórias que costumam abrir a temporada, com todos os participantes distribuídos por grupos. Por exemplo, se se mantiver o número atual de equipas B, que não disputam esta prova, os 34 emblemas seriam distribuídos por quatro grupos de seis e dois de cinco, para decidir a presença na final four. O facto de os jogos do Mundial se disputarem cedo - 10h00, 13h00, 15h00 e 19h00 - torna esta via apelativa também para os detentores dos direitos de transmissão televisiva e para quem cultiva o hábito de ir aos estádios. Acresce ainda outro detalhe: o número de jogadores a atuar em Portugal que estará no Mundial não é significativo, pelo que as vantagens serão comuns.
Fadiga e outros demónios
Uma vez definido, o esboço da temporada do futebol profissional será levado à Federação Portugal de Futebol, forçosamente ouvida na elaboração do calendário, uma vez que é necessário incluir as datas da Taça de Portugal. A Liga tem por hábito consultar também os treinadores e, quando existir uma versão final, será apresentada aos clubes - normalmente, isso é feito em abril -, para posterior aprovação, antes da ratificação em sede federativa.
Resolvido o vazio do Mundial, o desafio será encaixar 34 jornadas desde meados de agosto a maio - nada que soe a novidade para os clubes que, com a pandemia de covid-19, viram as temporadas de 2019/20 e 2020/21 exigir das equipas um esforço para, em determinados períodos, realizarem dois jogos por semana. O desafio será maior no topo, onde progredir nas competições da UEFA significa já contar com a fadiga na lista dos adversários. O tema tem sido, de resto, uma das bandeiras da FIFPro, associação de classe dos futebolistas a nível internacional e promete continuar para lá deste torneio atípico.
A saga do Mundial do Catar começou em 2010, quando o Comité Executivo da FIFA - já com dois elementos suspensos por suspeitas de corrupção, que haveriam de multiplicar-se nos anos seguintes - escolheu para 2022 o pequeno país que se propôs colocar o Sudoeste Asiático no mapa das fases finais. As elevadas temperaturas no território foram, desde logo, vistas como um obstáculo, mas nada que o dinheiro e a tecnologia não pudessem contornar, assegurou a organização, que se declarou capaz de assegurar temperaturas suaves dentro dos recintos - o que é uma realidade, de resto, embora insuficiente para convencer a FIFA de ser suficiente para garantir a segurança e conforto dos adeptos esperados no território onde os termómetros atingem máximas de 45 graus. Em 2015, a entidade que superintende o futebol a nível mundial decidiu transferir a prova para a época mais fresca e, nos últimos meses, as demais estruturas têm tratado de se organizar em conformidade.
Alemanha pára até 20 de janeiro
O calendário internacional da próxima época prevê um só período de jogos internacionais, em 2022, de 19 a 27 de setembro; em 2023, haverá duas paragens, de 20 a 28 de março e de 12 a 20 de junho. A UEFA optou por estender as provas de clubes, com a final da Champions League atirada para 10 de junho; a da presente edição está marcada para 28 de maio.
Algumas das principais ligas europeias já divulgaram datas para a época que se cruza com o Mundial do Catar, mas há muito ainda em aberto. É certo que todas páram a 13 de novembro, porque a partir daí os futebolistas estão ao serviço das seleções nacionais. De resto, as datas variam: Inglaterra aponta a Premier League para começar a 6 de agosto, parar em novembro e recomeçar no Boxing Day, a tradicional jornada de 26 de dezembro.
Na Alemanha, a Bundesliga fixou os mesmos limites, embora junte ao Mundial a pausa de inverno, com o campeonato a recomeçar apenas a 20 de janeiro. A França prevê eliminar os play off de descida e encaixar a Ligue 1 entre o primeiro fim de semana de agosto e 4 de junho. De Espanha e Itália há notícias que apontam para um início mais tardio, no segundo fim de semana de agosto, com a Serie A a terminar também no início de junho - no entanto, são apenas balizas e ainda muita coisa pode mudar, porque, tal como Mundial do Catar, também esta é uma discussão fora de época.