
Miguel Brás da Cunha (Créditos: Pedro Granadeiro / Global Imagens)
ENTREVISTA, PARTE II - Brás da Cunha confia que os incidentes de 13 de novembro não vão repetir-se no dia das eleições
A seu ver, o que esteve na origem dos problemas da AG de 13 de novembro?
-Confesso que não consigo saber e até me interessa pouco. Interessa-me saber que há coisas que não podem acontecer. Todos os órgãos do clube devem retirar ilações daquele dia. As AG do FC Porto têm de ser organizadas de modo irrepreensível e aquela não foi preparada a pensar na dimensão de portistas que iriam, expectavelmente, participar. A mobilização dos sócios foi, aliás, o único aspeto positivo daquele dia. Segunda lição: em AG deve discutir-se com total liberdade os temas. Uma conclusão que deve ser retirada por todos os sócios do FC Porto. A democracia funciona assim. Temos o direito de votar numa AG, mas também temos deveres, que são, desde logo, ouvir, aceitar, discordar e, no final, aceitar de forma democrática todas as votações, seja a nosso favor ou contra.
Atendendo a essas ilações e às garantias que já terão sido dadas por Lourenço Pinto, acha que será difícil haver episódios semelhantes em 27 de abril?
-Enquanto membros das candidaturas, temos tido a oportunidade de participar em reuniões operacionais, nas quais nos tem sido dada a conhecer a organização do evento. O clube está absolutamente empenhado em que as eleições sejam irrepreensíveis, desde a campanha até ao momento de apuramento e comunicação dos vencedores. Parece-nos que estão criadas as condições para que o dia 27 seja um dia de vitória do FC Porto, ganhe quem ganhar.
Concorda com a obrigatoriedade de apresentação de documento de identificação juntamente com o cartão de sócio no momento do voto?
-A questão foi colocada às várias listas. A nossa posição imediata foi de concordar com o mecanismo. Gerou-se alguma troca de impressões sobre esta matéria e, no final, todas as listas foram a favor desta exigência. Achamos muito bem.
O desenrolar da Operação Pretoriano surpreendeu-o?
-Estaria a mentir se dissesse que estava à espera que fosse acontecer. O Ministério Público [MP] fez aquilo que lhe compete quando tem notícia de algum comportamento que se possa constituir criminoso e atuou. Nenhum reparo a fazer relativamente à atuação dos vários órgãos competentes, cada um com competências específicas. Agora, não estava à espera que tivesse esta dimensão, claramente que não. Mas é perfeitamente normal que, numa democracia, os órgãos de polícia criminal, de investigação e o MP tenham atuações sempre que entendem que há um comportamento menos lícito. Depois, será normal que a decisão final venha a ser tomada pelos tribunais. É a democracia e o Estado de Direito a funcionar. Só temos de encarar isto com normalidade e não ver fantasmas.
“Vozes do FC Porto devem levantar-se”
Enviaram uma exposição à UEFA com base nas arbitragens nos jogos do FC Porto. Já obtiveram resposta?
-O que nos motivou a recorrer diretamente à UEFA foi um conjunto de situações que se foram acumulando e que não tiveram reação adequada por parte dos órgãos nacionais. Não pode ser indiferente aos órgãos de disciplina uma condenação por corrupção ativa de alguém efetivamente ligado ao mundo do futebol. Utilizamos isto como exemplo de que a nossa organização disciplinar interna não consegue dar resposta adequada a algo tão grave como um caso de corrupção ativa. Em relação a decisões de arbitragem, viu-se a comunicação do Conselho de Arbitragem. E quais as consequências que detetamos na aplicação errada da lei? Pode acontecer uma vez e não são intenções que estão em causa. Em causa está a repetição contínua do desrespeito pelas leis do jogo. E face a isso... nada. Entrevistas nos jornais, a dizer que achamos mal. E depois? Os agentes continuam a ser os mesmos e os factos repetem-se. Foi este contexto que nos levou a pedir que intervenham. A queixa é recente, não esperávamos resposta com brevidade, porque o assunto merece ponderação.
O FC Porto podia estar a lutar pelo título se não fossem as arbitragens?
-Se não fossem os erros de arbitragem, o FC Porto teria condições para estar num lugar muito diferente do atual. Basta olhar para as últimas três jornadas. Houve decisões erradas que tiveram, potencialmente, influência no resultado. Não consigo dizer que estaríamos a par do Sporting, mas digo que a pontuação poderia ser bem mais elevada. Isto tem reflexo no modo como a equipa se apresenta. Se entro em campo com a consciência de que o meu trabalho vai ser desconsiderado, naturalmente que o desempenho não é igual. Depois dependeria de nós, mas é isso que deve acontecer. Os resultados devem depender dos jogadores. Pode falhar-se ou marcar um penálti, mas se este não é marcado, fica a eterna dúvida...
O clube e a SAD deveriam expressar-se de forma mais veemente?
-A gestão do dia a dia do futebol deve competir exclusivamente aos órgãos de Direção e, especificamente, a quem tem responsabilidade na área. Quando tínhamos todos os sócios, elementos da Direção e da Assembleia Geral a decidir sobre o futebol, não ganhámos nada. A partir do momento em que mudámos o modelo de gestão, foi diferente. Agora, sentimos a necessidade de maior insubmissão nesta matéria. Parece-nos óbvio que todas as vozes do clube devem levantar-se. Entendemos que era importante que houvesse a exigência de intervenção de alguém com capacidade de pôr ordem nisto. Não podemos perder de vista a insubmissão do clube. Estivemos sempre na primeira linha da luta para abanar as estruturas erradas no futebol português. E esta marca de insubmissão não se pode perder, mais do que andar a discutir se o árbitro falhou com o Famalicão ou o Vitória.

